Postado em
Bizâncio
sob a face escura da Via Láctea
a cidade cesárea se fez conter
estática
no centro de um polígono
seco: levantando pó
o vento morno sopra agora na Piazza del Popolo
onde Boscone o viajor urina
no primeiro poste iluminado
depois andeja a trote lento rente às mesas
postadas em fileiras nas calçadas
a colher as saudações de praxe:
Salve Boscone! Boscone nostro!
e o cão roliço de ignota estirpe assente em resposta
meneando a cauda na direção das vozes:
vira-lata de quatro costados
Boscone era o cachorro comunitário
mascote do burgo etrusco que fora de Roma e Bizâncio
de Gala Placídia e Teodorico
de ostrogodos e longobardos
de francos e venezianos
para ser finalmente a matriz dos mosaicos bizantinos
no Ocidente: ladrilhados com todas as radiações
no espectro das cores ao recobrir catedrais
basílicas palácios e mausoléus:
no livro terceiro dos epigramas publicados no ano 87 d.C.
o poeta Marco Valério Marcial confirmava a secura extrema.
da urbe então romana: “Melhor um poço que uma vinha. cidade onde a água é mais cara que o vinho.”
caras me são também a lembrança da Piazza nas noites esteladas
o sopro do Adriático o murmúrio das marés inflando ondas
o marechal Boscone e a cidade em que vaguei desatento:
de novo súbito a revisito in pectoris – Ravena! Ravena!
O Relator
com Henry James
o fio de sangue
em natural instinto
apressa
o amor pela caça
a largos gestos:
punhal vertebrado
no alto cerco da morte
– o que relata abismado
é também relator? –
e as próprias vidas no espelho
bastam-se caladas
no apagar dos rastros:
súbito queimar de aparas
para o triunfo da Civilização.