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Sobram dentistas, mas faltam dentes

Pesquisas indicam que há 30 milhões de desdentados, longe da assistência odontológica

MIGUEL NÍTOLO


Atendimento na USP: casos desafiadores
Foto: Divulgação

Talvez seja apenas mais uma das tantas chagas que marcam de forma cruel os países que ainda não conseguiram ascender à condição de nação desenvolvida. Onde o poder aquisitivo é baixo, a informação não chega a todos e o acesso aos serviços assistenciais é dificultado, ora pelo desequilíbrio entre a oferta e a procura, ora pela má distribuição geográfica desse atendimento. O fato é que boa parte da população brasileira perdeu a capacidade de mastigar os alimentos e de sorrir com naturalidade. A décima economia mundial tem um inacreditável número de desdentados. São 30 milhões de indivíduos com a saúde bucal fragilizada, um quadro que até pode combinar com a situação de penúria vivenciada por parcela ponderável dos brasileiros, mas que não condiz com os seguidos saltos do país no campo econômico.

Esse total, que envergonha e assusta, consta das conclusões de uma pesquisa feita pelo governo federal ainda em 2003, realizada por meio de entrevistas e exames relativos às principais patologias orais em diferentes grupos etários, incluindo a população urbana e rural de 250 municípios. Conduzido pela Coordenação Nacional de Saúde Bucal do Ministério da Saúde, com a participação de várias instituições, entidades odontológicas e universidades, e em parceria com as secretarias estaduais e municipais de saúde, o Projeto SB Brasil – Levantamento das Condições de Saúde Bucal da População Brasileira pesquisou a arcada dentária de 108 mil pessoas de praticamente todas as idades.

"A população brasileira tem carências que se arrastam há décadas, no campo da saúde bucal", disse a Problemas Brasileiros Gilberto Pucca, do Ministério da Saúde. Coordenador Nacional de Saúde Bucal, ele observa que o longo período durante o qual a saúde dos dentes não foi considerada prioridade pelo Estado impactou de maneira negativa as condições da arcada dentária de milhões de pessoas em todo o país. "A perda precoce de dentes é grave e a necessidade de prótese é identificada já entre os adolescentes." Pucca destaca que mais de 28% dos adultos perderam todos os dentes funcionais em pelo menos uma arcada e cerca de 15% necessita de uma prótese total. Além disso, em torno de 13% da população de 15 a 19 anos nunca foi ao dentista. "Quase 3% dos adultos e aproximadamente 6% dos idosos jamais colocaram os pés em um consultório dentário", informa Pucca. Nessas duas faixas etárias, o pior índice de acesso aos serviços odontológicos fica com a região nordeste, cabendo à região sul as melhores taxas.

Dados da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) relativos à mesma época mostram cenário idêntico. Parte integrante da Pesquisa Mundial de Saúde, da Organização Mundial da Saúde (OMS), o levantamento teve como pano de fundo "as desigualdades socioeconômicas na situação de saúde da população brasileira". Célia Landmann Szwarcwald e Francisco Viacava, coordenadores da pesquisa, constataram, por exemplo, que o problema se concentra nas camadas mais carentes da sociedade. A pesquisa descobriu que 17,5% das pessoas com até três bens declarados já haviam perdido todos os dentes naturais, assim como 15,4% dos entrevistados proprietários de quatro a sete bens e 5,9% dos donos de oito bens para mais. Ou seja, a situação da saúde bucal do brasileiro reflete na prática a desigualdade que já se transformou numa das piores mazelas do país no plano social. A pesquisa da Fiocruz ouviu 5 mil pessoas de 18 anos ou mais de 250 diferentes setores censitários – cada um representado por 20 domicílios. Em cada casa apenas uma pessoa, escolhida aleatoriamente entre os moradores, foi entrevistada. Constatou-se assim que, nos 12 meses anteriores à pesquisa, dos 33,1% das pessoas mais pobres consultadas (com até três bens) que tiveram problemas bucais, apenas 17,7% fizeram o tratamento. Já entre os mais ricos, dos 35,6% que disseram ter enfrentado situações semelhantes, somente 4,6% não procuraram a ajuda do dentista.

Mutilação

Algo muito mais significativo, porém, se oculta por trás dos dados apresentados nos levantamentos do Ministério da Saúde e da Fiocruz. "Independentemente da situação financeira, é a falta de cultura que, com freqüência, conduz o indivíduo a uma rotina de hábitos alimentares pouco saudáveis e a uma higiene oral de má qualidade, acarretando os problemas gengivais e periodontais que motivam a reabsorção óssea e a conseqüente perda dos dentes", afirma Luciano Artioli Moreira, presidente da Associação Brasileira de Cirurgiões-Dentistas (ABCD). Ele argumenta que um desdentado é uma pessoa mutilada. "Ela sorri menos e tem menores oportunidades no mercado de trabalho", diz. João Henrique Nogueira Pinto, dentista do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo, o Centrinho, em Bauru, no interior de São Paulo, salienta que "o desdentado perde o suporte da face, o nariz cai (a ponta e a asa) e o lábio superior fica pronunciado, bem evidente". Ele explica que o osso alveolar, que dá suporte ao dente e só existe para isso, perde em volume. "Então, o terço inferior e médio da boca simplesmente murcha, a musculatura envolvida perde o parâmetro fisiológico e a ponta do nariz se aproxima do queixo", complementa.

Norberto Francisco Lubiana, presidente da Associação Brasileira de Odontologia (ABO), aponta outros transtornos que são próprios de arcadas dentárias doentes: deficiências da fala, problemas de ordem psicológica motivados pela falta dos dentes na parte frontal da boca, diminuição da auto-estima, mau hálito e, por extensão, dificuldades no relacionamento social. Ele acrescenta que a saúde bucal requer cuidados permanentes. "A prevenção é o melhor caminho para quem quer manter uma dentição saudável, o que se consegue mediante o uso correto do fio dental e da escova. Isso sem esquecer, é claro, que uma visita periódica ao cirurgião-dentista também é importante, pois ele pode detectar problemas ainda no início, evitando danos e gastos maiores."

Poucas pessoas sabem, mas o Brasil concentra 10% de todos os odontólogos em atividade no mundo. "O grande problema é que eles preferem trabalhar nos grandes centros urbanos, principalmente nas regiões sul e sudeste", observa Pucca. Ele afirma que o estado de São Paulo, por exemplo, abriga mais de 50 mil cirurgiões-dentistas, basicamente um quarto do total, enquanto em Alagoas e no Amazonas, juntos, eles não passam de 5 mil.

Dentistas em excesso

A OMS recomenda a relação de um dentista para cada grupo de 1,3 a 1,5 mil habitantes. Se lançarmos um olhar frio para os números exibidos pelo Brasil, parecem faltar razões para lamúrias. Aqui, afinal, a proporção é de um dentista para cada 880 pessoas, e pelo menos nesse aspecto deixamos algumas nações do Primeiro Mundo para trás. No entanto, essa é uma falsa superioridade. Temos, na realidade, profissionais em excesso, mas a assistência está em falta.

Isso talvez sirva de explicação para o fato de que, muitas vezes, os brasileiros só batem à porta dos consultórios dentários quando estão com dor de dente, costume que vai passando de pai para filho, ajudando a encorpar a estatística dos desdentados. Poucos dão ouvidos ao bordão "visite o dentista regularmente" e também não conferem importância à higiene da boca. Pesquisas mostram que dezenas de milhões de indivíduos não utilizam a escova de dentes, dentre outros motivos, por não poder comprá-la. "O baixo poder aquisitivo do brasileiro é um fato, mas, torno a insistir, a falta de conhecimento também leva parte apreciável da população a gastar mal sua parca economia", assevera Moreira, da ABCD. "É normal que as pessoas menos providas de recursos coloquem a culpa na falta de dinheiro. No entanto, tenho visto, elas compram maços de cigarros e produtos menos essenciais, desembolsando valores superiores aos cobrados por uma escova", lastima-se.

O acesso a esse importante utensílio, no entanto, não representa necessariamente a solução do problema. É preciso aprender a usá-lo e assim combater as duas causas que corriqueiramente levam à queda dos dentes: a cárie e a periodontite (inflamação e infecção de tecidos que rodeiam o dente). "Quando a cárie destrói excessivamente o dente, atingindo também a raiz, pode acontecer de não haver mais meios de salvá-lo", explica Lubiana. "Já a doença periodontal leva à destruição do aparelho de suporte do dente, que fica bambo e sujeito à extração, quando não há nada mais que se possa fazer." O presidente da ABO lembra, por fim, a possibilidade de perda de dentes devido a acidentes.

Alguns especialistas são taxativos em afirmar que o quadro só vai começar a mudar quando essas informações passarem a ser difundidas à exaustão e, por conseguinte, chegarem a todos os lares. Presente em, basicamente, todas as casas, a televisão poderia – quem sabe – assumir parte dessa responsabilidade, a exemplo de algumas campanhas que marcaram forte e acabaram ficando na cabeça das pessoas, como a do câncer de mama. Algo tem de ser feito, já que a deterioração da saúde bucal caminha célere, à medida que a população cresce.

Uma experiência alentadora aconteceu recentemente, fruto de uma parceria do Conselho Federal de Odontologia (CFO) com a Rede Globo. "Desde que eles eram pequenos me acostumei a levá-los ao dentista para prevenir cáries e cuidar da saúde bucal", disse Dinorá, da novela "Paraíso Tropical", a sua mãe, Iracema (Daisy Lucidi), referindo-se aos filhos. Representada por Isabela Garcia, Dinorá retornava do dentista e aproveitava para explicar a Iracema (quer dizer, aos milhões de telespectadores que sintonizam todas as noites a Globo) que jamais cultivou o hábito ainda tão arraigado no Brasil de esperar os filhos reclamarem de dor para, só depois, levá-los ao consultório dentário. Esse capítulo foi transmitido em maio último e, em julho, a "deixa" em favor da saúde bucal deu novamente o ar da graça. Desta vez, Dinorá acudiu o filho, que reclamava de dor de dente e admitia que não vinha seguindo as orientações relativas às escovações diárias e ao uso de fio dental pela manhã, ao se levantar, após as alimentações e ao deitar. "Que é isso?!", exclamou Dinorá. "Ainda mais se você comeu uma coisinha doce!" A personagem encarnada por Isabela Garcia, então, aproveitou o momento para explicar que "o resto de comidinha fica no cantinho dos dentes e é isso o que forma a cárie, produz o mau hálito, a dor de dente e muitas outras coisas que você nem imagina". De acordo com o CFO, os diálogos em defesa da saúde bucal ocuparam mais de 14 minutos da novela global escrita por Gilberto Braga e Ricardo Linhares, no ar desde 5 de março passado. É um bom começo.

"Infelizmente, a anatomia da gengiva e da arcada dentária guarda detalhes que não facilitam a higienização", explica o dentista Nogueira Pinto. O cirurgião do Centrinho explica que "escovar os dentes é difícil, mas mais difícil ainda é limpá-los". Ele afirma que fazer a retirada do resto de comida infiltrado no sulco gengival não é um processo simples. E que o risco, ali, é de o resíduo alimentar dar origem ao tártaro, que "tanto a escova de dentes quanto o fio dental não conseguem remover". Por isso, ele recomenda, a ida ao dentista é necessária para evitar o surgimento da periodontite, doença que infelizmente é bem conhecida da população brasileira.

A irradiação desse processo para o restante do corpo através da corrente sanguínea, não raro, pode dar origem a uma série de contaminações, caso, dentre tantas outras, da endocardite bacteriana (infecção do revestimento interno do coração e das válvulas cardíacas). "Certas infecções cujas causas não são prontamente diagnosticadas podem ter origem na boca", afirma Nogueira Pinto. "Esses processos infecciosos são extremamente agressivos", acrescenta. O dentista da USP em Bauru vai mais longe. Normalmente, explica, o desdentado não apresenta boa digestão. Como faltam dentes, os alimentos não são devidamente triturados e ele acaba refém de problemas de ordem gástrica e intestinal, isso sem falar de deficiências no tocante à absorção nutricional.

Um aspecto às vezes negligenciado diz respeito aos implantes dentários, pois nesse caso devem ser observados os mesmos cuidados recomendados à boa conservação dos dentes naturais. "Também aqui a higienização é a palavra-chave", observa Nogueira Pinto. Ele esclarece que a falta da limpeza, nesse caso, pode fazer com que as doenças que levaram à perda dos dentes retornem, colocando em risco a integridade dos implantes.

O trabalho do Sesc

"Quem cuida dos dentes sente melhor o gosto da comida", diz o dentista Jair de Souza Moreira Júnior, assessor dos Programas de Saúde e Odontologia do Serviço Social do Comércio de São Paulo (Sesc-SP). "Quando se mastiga corretamente, o organismo aproveita melhor os alimentos", completa o também dentista Luiz Manoel Moura Magalhães Gomes, parceiro de Moreira Júnior no mesmo projeto. Eles contam que o Sesc atua no atendimento odontológico aos trabalhadores do comércio e serviços e a seus dependentes basicamente desde sua fundação, em 1946. Só que esse trabalho, que no estado de São Paulo é realizado por 220 cirurgiões-dentistas distribuídos em 22 unidades, vai além da proposta de odontologia curativa (que no caso inclui até o aviamento de próteses, com exceção de implantes). "Também priorizamos o processo educativo com vistas a transferir informações aos pacientes sobre o tratamento e, por extensão, a saúde bucal", esclarece Gomes. "A intenção é levá-los a modificar certos hábitos através do conhecimento de novos conceitos, alertando-os a respeito das doenças que atacam a arcada dentária e danificam ou colocam em risco a sobrevida dos dentes." Segundo Moreira Júnior, busca-se assim levar o cliente a entender que a saúde bucal está inserida num contexto maior, que é a saúde geral do organismo. Ele explica que isso é feito pelo próprio dentista e por meio da distribuição de folhetos, palestras, oficinas e atividades lúdicas. "Quando o cliente retorna, depois de algum tempo, a mudança é notória: passa a encarar com outros olhos os problemas advindos da cárie e da inflamação da gengiva, dando mais atenção à saúde dos dentes." Moreira Júnior conta que em 2006 foram feitos 480 mil atendimentos, número que poderá chegar a 500 mil neste ano.

A exemplo do Sesc, só que talvez não com a mesma magnitude, uma série de outras instituições prima pela prestação de serviços na área. É assim com o Envelhecer Sorrindo, do Departamento de Prótese Dentária da Faculdade de Odontologia da USP, projeto nascido em 1999, o Ano Internacional do Idoso, e que tem o intuito de cuidar da saúde bucal de pessoas que, além da falta de dentes (segundo o Ministério da Saúde, três em cada quatro idosos perderam todos os dentes funcionais), enfrentam uma série de problemas que surgem à medida que a idade avança. Maria Luiza Arantes Frigério, coordenadora do projeto, conta que o atendimento, às terças-feiras pela manhã, começa na sala de espera. "Uma arte-terapeuta propõe atividades que visam reduzir a ansiedade dos idosos por meio da escultura, da pintura e do relaxamento, e no ambulatório uma fonoaudióloga ajuda a fazer a adaptação das próteses, propondo exercícios para os pacientes praticarem em casa." Ela esclarece que o atendimento odontológico é realizado por cirurgiões-dentistas, que procuram trabalhar respeitando as limitações de saúde dos pacientes (diabéticos, hipertensos, afásicos, etc.). Maria Luiza conta que às quartas-feiras, pela manhã, "estudamos os casos mais desafiadores, que exigem um novo olhar. A idéia é que o paciente saia satisfeito. Os alunos auxiliam dando suporte para os dentistas, cuidando da agenda e escutando as histórias contadas pelos idosos".

A disponibilização de próteses completas removíveis (dentaduras), próteses parciais removíveis e sobredentaduras (são mantidas as raízes dos dentes em pacientes que foram submetidos a tratamento por radiação e não podem mais sofrer intervenções cirúrgicas) integra o programa. "Eventualmente, damos atendimento ortodôntico para adequar a mordida, melhorar a estética e proporcionar melhor qualidade de vida ao cliente. Alguns implantes, quando indicados, também acabam sendo realizados", diz a coordenadora do projeto. Ela explica que os custos com os laboratórios de prótese são repassados aos pacientes e que os trabalhos executados na própria faculdade podem ser negociados.

O drama dos desdentados acendeu a luz vermelha em Brasília e fez o governo andar mais rápido. Como o próprio Ministério da Saúde reconhece, "na última década, o Brasil avançou muito na prevenção e no controle da cárie em crianças. Contudo, a situação de adolescentes, adultos e idosos está entre as piores do mundo. E mesmo entre as crianças ainda persistem os problemas gengivais e as dificuldades para conseguir atendimento odontológico". Foi pensando em mudar esse quadro que a União criou, em março de 2004, a Política Nacional de Saúde Bucal Brasil Sorridente, que reúne uma série de ações direcionadas a cidadãos de todas as idades. Até o lançamento desse programa – embasado, do ponto de vista epidemiológico, na pesquisa que em 2003 apontou a existência de 30 milhões de desdentados no país –, a atuação do Estado nessa área se resumia ao repasse de recursos para cada equipe de profissionais montada pelos municípios. "A Brasil Sorridente tem permitido a ampliação e a qualificação do acesso da população às ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação em saúde bucal, iniciativas de fundamental importância para a saúde geral e para a qualidade de vida das pessoas", diz Gilberto Pucca. "Ela está articulada a outras políticas de saúde e demais políticas públicas, de acordo com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS)."

Pucca ressalta que em maio já somavam mais de 76 milhões as pessoas cobertas pelas equipes de saúde bucal. "Haviam sido implantados, até aquele mês, 535 Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs) e 228 Laboratórios Regionais de Próteses Dentárias (LRPDs). E outros 245 CEOs já foram credenciados para a antecipação do recebimento de recursos para implantação." O coordenador nacional de Saúde Bucal informa também que de 2005 a maio de 2007, mediante ação conjunta com a Fundação Nacional de Saúde e convênios com as secretarias estaduais de Saúde, foram instalados 583 novos sistemas de fluoretação, abrangendo 434 municípios de 11 estados, medida que beneficiou 5,8 milhões de pessoas. "A meta para 2007 é fechar o ano com 17 mil equipes de saúde bucal, 550 CEOs e 500 novos sistemas de fluoretação das águas de abastecimento público", revela Pucca. Para tanto, esclarece ele, a Política Nacional de Saúde Bucal conta com uma previsão orçamentária de R$ 640 milhões.

"É um excelente começo e ampliá-lo é uma necessidade", afirma Lubiana, da ABO, sobre a Brasil Sorridente. Ele observa que é imperioso que os próximos inquilinos do Palácio do Planalto garantam a continuidade e, por extensão, o futuro dessa política. "É preciso que a odontologia esteja presente de forma consistente e permanente na estrutura do Ministério da Saúde, e que sejam afiançadas maior autonomia e verbas específicas para a saúde bucal", sugere.


Vantagens do flúor

O Ministério da Saúde assevera que a adição de flúor à água é uma das mais importantes medidas de saúde pública direcionadas ao controle da cárie dentária. Essa prática – que começou a ganhar adeptos mundo afora a partir de 1945 – ainda hoje merece a confiança de um número elevado de nações. Segundo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), a fluoretação evita a perda de minerais do esmalte dos dentes, deixando-os mais resistentes à ação de agentes nocivos. É o que também afirma o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, dos Estados Unidos, de acordo com o qual "o poder preventivo da água fluoretada é de 40% a 70% em crianças, dependendo do índice de prevalência de cárie, com redução de perda de dentes em adultos entre 40% e 60%".

Foi em 1974 que o Brasil aderiu de vez à fluoretação, através da lei federal nº 6.050. Regulamentada no ano seguinte, ela tornou obrigatória a aplicação do flúor à água e estabeleceu que as estações de tratamento deveriam incluir planos relativos à fluoretação. "É o método de controle de cárie dentária mais efetivo, especialmente se considerada sua abrangência coletiva", explica documento do Ministério da Saúde.

Não faltam, porém, vozes discordantes que atiram contra a fluoretação e pregam seu fim. Tentativas infrutíferas de abolir essa prática já brotaram tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados, e o argumento é quase sempre o mesmo: a ação profilática do flúor deriva, sobretudo, de sua aplicação tópica, não tendo, pois, cabimento obrigar a população a ingerir água misturada a um elemento tóxico. "São projetos de lei que pecam pela falta de respaldo científico", relata a Associação Brasileira de Odontologia (ABO). "Não tem fundamento dizer que a água fluoretada é prejudicial à saúde", sustenta a professora de bioquímica da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP) Marília Afonso Rabelo Buzalaf. Segundo ela, estudos recentes mostraram que, após ingerida, a água com flúor tem a propriedade de beneficiar os dentes posteriores, de superfície quase sempre rugosa e com placas bacterianas, sobre a qual o contato tópico tem pouca eficácia. Marília explica que o único porém é a possibilidade de fluorose dentária, distúrbio que penaliza em torno de 10% da população que bebe água otimamente fluoretada. "São manchas esbranquiçadas imperceptíveis nos dentes, mas que não fazem mal à saúde. É pouco, ante os benefícios proporcionados pela fluoretação", assinala.

 

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