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A transformação sistêmica da Rússia
Lenina Pomeranz / Foto: Gabriel Cabral
De Gorbachev a Putin, uma nova revolução
A professora de economia e administração Lenina Pomeranz esteve presente na reunião do Conselho de Economia, Sociologia e Política da Federação do Comércio do Estado de São Paulo no dia 14 de agosto de 2003, quando realizou uma palestra sobre as mudanças da Rússia desde a perestroika até a atualidade. Publicamos abaixo o texto de sua exposição. O debate que se seguiu pode ser lido na edição impressa da revista.
LENINA POMERANZ – Para entender os problemas da Rússia de hoje, é importante saber o que significa passar por um processo de transformação sistêmica, de sistema. Não se trata, como pode parecer à primeira vista, de discutir questões de economia ou de política interna ou externa, como faria se o tema fosse o Brasil ou os Estados Unidos, economias já consolidadas no sistema capitalista. Refiro-me a um país que nos últimos 15 anos passou de uma sociedade organizada em moldes distintos para o regime capitalista.
Em que consiste essa transformação? No plano econômico, a gestão e alocação de recursos, baseadas em planejamento central, passam a ser feitas através do mercado. Trata-se, portanto, do desmonte do regime anterior e da construção de um novo. No plano político, isso representa a dissolução do sistema de partido único, dominante em todas as esferas da vida econômica, política e social no país, e sua substituição pela democracia representativa. O fim das restrições à liberdade impostas pela dominância do partido único e em seu lugar novas regras de cunho democrático. A compreensão do que seja essa transformação é importante para avaliar o que ocorre no país atualmente.
Para traçar rapidamente como ocorreu esse processo, vamos dividi-lo em três etapas distintas. A primeira começou em meados dos anos 1980, com a ascensão de Mikhail Gorbachev, que pretendia, através do que ficou conhecido como a perestroika, modificar o sistema, reformá-lo em profundidade. Com a perestroika, que em tradução literal significa reconstrução do sistema, Gorbachev, ainda dentro dos marcos do regime socialista, tentou conduzir a Rússia para um socialismo democrático, ou, como ele chamou, um socialismo de face humana. O que se queria era flexibilizar o funcionamento do sistema econômico, proporcionando autonomia às empresas, liberando-as da tutela dos ministérios e criando mecanismos de mercado, inclusive a monetização da economia.
Aqui convém fazer um parêntese, porque a noção que temos da economia soviética ainda é muito precária. Ela funcionava no setor estatal praticamente sem moeda. As transações entre as empresas do Estado eram feitas usando moeda de conta. A que circulava destinava-se a bens de consumo e era disponibilizada às companhias pelo banco do Estado para pagamento de salários, permitindo assim o turnover do consumo. Por outro lado, as empresas eram submetidas a um processo de planejamento, vinculadas a ministérios setoriais que existiam em grande número. Recebiam a indicação para quem vender, de quem comprar, e tinham de cumprir o plano. Não era simplesmente um planejamento de cima para baixo, mas um processo de negociação de cima para baixo e de baixo para cima, que acabava redundando nesse plano técnico-financeiro e econômico de cada uma das empresas. Dar autonomia a elas significa que, nos moldes em que foi conduzida a perestroika, teriam de adquirir liberdade de gestão e responsabilidade por seus fundos de investimento e por sua lucratividade, tornando-se assim autônomas em relação ao Estado. Para que isso funcionasse, era preciso construir as bases de uma economia de mercado, criar instituições e de certa forma monetizar a economia.
Outra coisa feita durante a perestroika foi a reforma do sistema político. Foi a substituição de um Parlamento não profissional, que se reunia duas vezes ao ano para aprovar o plano, por um Congresso com deputados eleitos. E não seriam, como antigamente, indicações exclusivas do Partido Comunista.
Para que isso pudesse acontecer era absolutamente indispensável introduzir normas democráticas, a chamada glasnost, que em russo significa transparência. O que se obteve foi a liberalização do debate e da possibilidade de reunião, o que chamo de abertura democrática, praticamente sem limites. Uma abertura que hoje, por exemplo, não existe na Rússia, pois há mais restrições do que no tempo de Gorbachev. A glasnost foi necessária para dar apoio político às reformas que estavam sendo feitas e também, segundo os assessores de Gorbachev, para despertar a iniciativa das massas, indispensável para a promoção das mudanças econômicas.
E durante a perestroika (aliás, de certa forma foi algo que a precedeu) aconteceu ainda uma mudança radical na política externa. As transformações na Rússia foram reveladas ao Ocidente num livro que Gorbachev chamou de Uma Nova Política para o Mundo e para meu País, em que ele se dispõe a acabar com a guerra fria, a retirar unilateralmente as tropas dos países do Leste Europeu e da Alemanha. E a negociar a redução de armas atômicas e controlar o armamento nuclear, área em que ocorreu uma falha das mais graves durante seu governo, um período complicado de lutas políticas.
Um dos assuntos que não se pode deixar de comentar é a subestimação da questão nacional. Ela foi sempre um problema na Rússia ou, nesse momento, na ainda União Soviética, por conta da multiplicidade de etnias. Subestimá-la foi, de certa forma, o erro mais grave que levou, em última instância, ao desmonte da União Soviética. Foi o excesso de água que fez o copo derramar.
A segunda etapa começou com Boris Ieltsin, após o fim da União Soviética. Esta fase é demorada, vai de 1992 até o final de 1999, quando Ieltsin renunciou e Vladimir Putin assumiu a presidência. É um período que se tornou mais conhecido no Ocidente por conta das manchetes dos jornais a respeito de escândalos, corrupção e da máfia. Foi uma época de turbulências econômicas e políticas que marcaram o que chamo de guerra pelo butim que representou a propriedade estatal dos meios de produção e pelo controle do poder político. Durante essa etapa é que se rompeu o sistema anterior e se criaram as bases de um novo. Ainda que na era Gorbachev se tivessem ensaiado certas idéias a propósito da privatização de alguns setores e de áreas da economia russa, foi no governo Ieltsin que se promoveu a chamada privatização de massa. Todo mundo sabe, mas convém lembrar que, na Rússia, como na União Soviética, o Estado era proprietário universal de todos os meios de produção. Com Ieltsin eles são privatizados. Não se trata de passar para a iniciativa privada algumas estatais, mas centenas de milhares delas, entre as quais alguns monstros, como a grande fabricante de níquel, a segunda maior do mundo, as produtoras de petróleo, as metalúrgicas, enfim, uma privatização da propriedade estatal. Na medida em que ela ideologicamente pertencia a todo o povo, era preciso fazer isso com cuidado suficiente para não se colocar contra os interesses da maioria da população.
A privatização foi feita, então, em duas fases. Na primeira houve uma privatização de massa, que incluiu empresas médias e grandes, além das pequenas, naturalmente. Para a segunda ficaram os monstros, as companhias imensas, ou o que se poderia chamar de as blue-chips da economia russa. Essa privatização foi feita de forma a garantir apoio político, sendo as empresas entregues a seus coletivos, trabalhadores que, por força da organização anterior, eram controlados por seus diretores. Esses diretores, por sua vez, eram membros da chamada nomenclatura. Ninguém era indicado para dirigir uma estatal ou um órgão qualquer sem o beneplácito e a concordância do Partido Comunista. O critério era mais de lealdade que de competência, e seria ótimo se se conseguissem juntar as duas coisas.
Na verdade, esse movimento acabou por privatizar a nomenclatura, que tomou posse das empresas. Embora a coisa não seja assim tão simples, pode-se dizer que houve uma transferência de propriedade.
A segunda fase da privatização, conhecida como a dos escândalos, alcançou as grandes empresas dos setores de ponta, exportadores e tecnológicos. Foi feita através de um arranjo entre o governo e pessoas ligadas a ele – o presidente Ieltsin e alguns empresários já em posição economicamente avançada, que se tornaram depois oligarcas financeiros. Esses empresários, alguns donos de bancos que se criaram nesse processo, ofereceram ao governo um empréstimo de alguns bilhões de rublos em troca de caução das ações dessas companhias. Um deles foi encarregado de fazer o leilão, em que as empresas ofereciam o valor que iam emprestar ao governo. O empréstimo e garantia de ações subentendiam o direito de administrar essas empresas durante um ano.
Após esse prazo, se o governo não pagasse as ações, as empresas ficariam com os credores, e foi, naturalmente, o que aconteceu. Foi um escândalo e, a propósito, para quem tiver curiosidade sobre esse processo que alguns chamam de acumulação primitiva e os russos entendem como roubo ou pilhagem, uma jornalista de origem ucraniana, que morou muitos anos na Rússia como correspondente do "Financial Times", publicou um livro notável, em que descreve esses eventos como um romance policial. Ela se chama Cynthia Freeland e mora no Canadá, e o livro, The Sale of the Century (a barganha do século), descreve como se fez a apropriação das estatais russas nesse período.
As mudanças não ocorreram apenas na economia. Na esfera política foi criada uma nova Constituição, com regime presidencialista, e que atribuía poderes extraordinários ao presidente. Houve muita disputa nesse período entre o Parlamento e o governo central, o que levou Ieltsin a dissolvê-lo em 1993. Mais do que isso, os parlamentares, resistindo à dissolução, fizeram o que nosso Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) está fazendo, ocuparam o espaço. Pela primeira vez o governo usou de tropas para expulsar e prender deputados. A nova Carta acabou sendo elaborada por um congresso de notáveis, foi submetida a referendo e está em vigor até hoje. O sistema é composto por uma Câmara de Deputados e um Conselho da Federação, que seria nosso Senado, o qual representa as várias regiões da Rússia.
Esse período também foi marcado por muita turbulência política em função da própria personalidade do presidente e da maneira como conduziu o país. Houve confronto permanente com o Congresso e instabilidade. No governo Ieltsin sucederam-se quatro primeiros-ministros. Um foi Viktor Tchernomyrdin, oriundo do Ministério do Gás, que controlava a Gaspron, que pode ser comparada com a Petrobras. É um monopólio gigantesco. Tchernomyrdin era um tecnocrata, granjeou algum prestígio, e quando começou a sondar a possibilidade de ser presidente Ieltsin o destituiu. Tomou posse Serguei Kirienko, um jovem tecnocrata, a quem o Congresso só aprovou em terceira votação, por conta de sua inexperiência. Kirienko teve de enfrentar a crise financeira de agosto de 1998, quando a Rússia declarou a moratória das dívidas interna e externa e ocorreu uma grande desvalorização do rublo. Kirienko deu lugar a Yevgueni Primakov, da alta burocracia soviética, muito respeitado ainda hoje entre a população, círculos diplomáticos e autoridades. Foi ministro das Relações Exteriores e chefe do Serviço de Informação Internacional. Era vinculado de alguma forma ao passado, a grupos da antiga Constituição. Granjeou muito prestígio e com isso pôde garantir alguma estabilidade. Em aliança com o prefeito de Moscou, chegou a pleitear a presidência, o que era intolerável para Ieltsin, que o demitiu, substituindo-o por outro político desconhecido e inexperiente chamado Serguei Stepashin, que não ficou mais do que dois ou três meses no cargo (Primakov ficou oito). Foi substituído por um homem absolutamente desconhecido tanto na Rússia quanto no Ocidente, que é Putin.
A terceira etapa começou quando Putin assumiu a posição de primeiro-ministro e, depois da renúncia de Ieltsin, a presidência da República. Nessa época, houve muitas indagações na imprensa e nas revistas especializadas. Eu mesma, no boletim que editava no Instituto de Estudos Avançados da USP, escrevi um artigo tentando decifrar a esfinge: quem é Putin, de onde apareceu, quais são as perspectivas? O próprio Putin, aliás, sabendo disso, publicou o livro Quem Sou Eu, baseado numa entrevista concedida a três ou quatro jornalistas.
O primeiro decreto de Putin foi anistiar o presidente que se foi e toda a sua família, livrando-o de possíveis acusações que seriam absolutamente naturais diante dos escândalos que todos conheciam. Sua primeira ação foi decretar a guerra contra a Tchetchênia, como resposta a atos terroristas cometidos em Moscou e Volgodonsk, onde atentados a bomba em dois prédios de apartamentos causaram centenas de mortes. A pronta reação de Putin e sua figura de jovem enérgico e decidido granjearam-lhe grande apoio popular. Ele representava algo de novo em relação à decrepitude dos velhos dirigentes comunistas e do próprio Ieltsin, com suas bebedeiras e os constantes sumiços por razões de doença.
Putin trouxe para o povo russo o restabelecimento do orgulho perdido com a retirada unilateral de tropas da Alemanha, com o fim da União Soviética. De certa forma, a recuperação desse sentimento significou um ativo muito importante para o dirigente, que o fez eleger-se presidente da República logo depois.
Ele começou um périplo internacional, visitando os países mais desenvolvidos, e passou a atuar com disposição para consolidar o poder de Estado. Instituiu sete distritos regionais para controlar os governadores, que agiam como barões feudais em suas áreas de influência. Exigiu o cumprimento das leis federais e fiscalizou a utilização dos recursos transferidos para essas regiões. Criou um Conselho de Estado, que serviu de certa forma para fazer uma limpeza nas relações entre os magnatas econômicos e o poder político. Através desse órgão, o governo se dispõe a ouvir os dois lados, e elimina as relações conspícuas entre os oligarcas e o Estado. Estabeleceu um novo relacionamento com o Parlamento, após um processo de negociações.
Como caracterizar o novo sistema vigente na Rússia? Em termos políticos há quem diga que estamos diante de uma democracia controlada ou de um sistema autocrático de poder. Vou explicar mais adiante, com exemplos, essa qualificação do regime russo.
A proposta desta palestra era mostrar a diferença entre o sistema anterior e o novo, dizer o que mudou e como estamos atualmente. No plano econômico, as perguntas são: o que é hoje a economia russa, como está organizada, qual o balanço das privatizações, quanto existe de propriedade privada e de estatal? Quanto à privatização, as informações são dispersas. Mas tenho alguns elementos que permitem visualizar a estrutura da propriedade hoje na Rússia.
Em número de empresas, a participação do setor privado alcançou 62,5% do total – algumas centenas de milhares – em 1995. Em 1999 essa porcentagem subiu para 74% e em 2002 para 75,8%. A quantidade de empresas, porém, não diz nada, pois uma manicure e o produtor de níquel são incluídos da mesma forma. São necessários outros dados para avaliar melhor a participação desse setor. Na indústria, no ano de 2001, o número de empresas privadas alcançava 85,6%. E elas eram responsáveis por 43,2% da produção nacional. Ou seja, o setor privado respondia por quase a metade da produção industrial do país.
Aprovou-se um decreto que transferiu para as pessoas as casas em que residiam. Em 1º de janeiro de 2002 as residências privatizadas somavam 18 bilhões de unidades, um total de 903 milhões de metros quadrados, equivalentes a 50% do patrimônio residencial do país.
O ativo fixo das empresas no item propriedade indica que a participação do setor estatal decresceu de 90% em 1985, quando começaram as transformações, para 42% em 2002. As empresas privadas também são responsáveis por grande parcela dos investimentos, que passaram, na participação sobre o total, de 12,1% em 1993 para 24,4% em 1999 e 37,7% em 2001. Não é muito, mas é significativo na medida em que uma parte considerável do investimento depende do setor privado.
A essas porcentagens convém acrescentar as relativas às empresas mistas estatais, que eram responsáveis por mais 22% do investimento. Então as privadas somadas às mistas representavam em torno de quase 60%. A propriedade estrangeira em 2001 detinha 2% do total, quase o dobro do que existia em 1995, passando de US$ 2,2 bilhões para US$ 3,98 bilhões. Eles se direcionaram basicamente para a indústria (40%).
Em termos de pessoal ocupado, em 1990 o setor privado empregava 12,5% do total de mão-de-obra. Passou a 34,4% em 1995 e 47,6% em 2001. As empresas mistas russas empregavam 4% em 1990, passaram a 22,2% em 1995 e 11,6% em 2001. As de capital estrangeiro e mistas empregavam muito pouco, 0,1% em 1990 e 2,6% em 2001. Na indústria, o setor privado empregava 46,1% do pessoal ocupado em 2001.
Não tenho, infelizmente, informações sobre o grau de concentração dessa propriedade, mas pode-se deduzir, de maneira indireta, que ela é altamente concentrada. Por exemplo, 38,6% da exploração do petróleo era feita por apenas três empresas, 33% do setor de siderurgia e ferrosos estava também em mãos de três empresas, e o mesmo acontecia no de não-ferrosos (31,6%).
Além da grande concentração, sabe-se da existência de grupos econômico-financeiros gigantescos que se constituíram a partir da chamada barganha da privatização. No ano de 2000, esses grupos, em número de nove, respondiam por um total de vendas de 1,5 trilhão de rublos, empregavam em média 1,2 milhão de trabalhadores e exportaram US$ 27 bilhões do total de US$ 105 bilhões que a Rússia vendeu para o exterior. Esses grupos são muito significativos na economia russa e se discute muito o papel que poderão ter em termos de uma diversificação das atividades.
Outro elemento importante sobre a Rússia de hoje tem a ver com a estrutura anterior disforme ou viciada, que concentrava todos os recursos na fabricação de bens de produção, em detrimento dos de consumo. É importante examinar em que medida essa estrutura produtiva mudou, o que faço com base nos dados do PIB.
Em 1991, quando começou a transformação, a estrutura produtiva representava 36,5% do PIB. Passou a 49,2% em dez anos, uma mudança considerável. O consumo ascendeu de 62,5% para 65,1% no mesmo período.
Mas convém falar também sobre o processo de concentração territorial da economia, que privilegia a região central do país, onde fica Moscou. Essa cidade é um exemplo desse processo de concentração, porque sua participação passou de 10,25% do total do PIB russo em 1995 para 21,4% em 2000. Quem quiser conhecer a realidade russa deve sair de Moscou pelo menos 100 quilômetros.
Depois da crise financeira de 1998, a economia tem demonstrado um bom desempenho, com taxas muito elevadas de crescimento: 6,4% em 1999, 10% no ano 2000, 5% em 2001, 4,3% no ano seguinte, e há uma previsão de 6,9% ou 7,3% para 2003. Há crescentes saldos nas transações correntes, mais de US$ 30 bilhões anuais em média no último triênio. As reservas, entre divisas e ouro, eram da ordem de US$ 60 bilhões em abril de 2003, equivalentes em importância ao volume das importações de 2002. A inflação foi reduzida de 36,5% em 1999 para 13,6% em maio de 2003. Mas esse crescimento econômico ainda é muito dependente da exportação de petróleo e do preço dos energéticos de maneira geral no mercado internacional. Esse é um motivo de preocupação.
As questões centrais no plano da economia são, portanto, em primeiro lugar, sua diversificação, com a eliminação da dependência do petróleo, e, em segundo, o ajuste das instituições à nova estrutura de uma economia de mercado. Há necessidade de reformas, e as que se discutem são a previdenciária, a tributária, que já foi feita uma vez mas está sendo reavaliada, a bancária. Os bancos ainda são muito frágeis em relação às condições de funcionamento da economia. São instituições privadas controladas pelo Banco Central, que também cuida da política monetária e do mercado financeiro.
E uma reforma muito discutida hoje na Rússia é a dos chamados serviços comunais de habitação. Eles equivalem aos nossos condomínios, mas são feitos pela municipalidade. Não é o dono do apartamento que paga a limpeza do pátio, do prédio, a iluminação da área comum, etc. Mais: o serviço comunal providencia a reforma dos apartamentos depois de cada inverno, cobre rachaduras, pinta, arruma a calefação, etc. Fala-se agora em transferir essas responsabilidades para os proprietários dos imóveis. O problema é que a população é muito pobre e, se tiver de arcar com tais despesas, não poderá comer nem morar. Estamos em véspera de ano eleitoral, e a discussão é muito grande, pois a rejeição a essa reforma é bastante forte.
Quanto à estrutura social, em meados dos anos 90 ela foi objeto de alguns estudos esparsos sobre a nova elite, os novos empresários, com a preocupação de decifrar o que eram os novos-ricos. O trabalho em que me louvo, pioneiro, é da socióloga Tatiana Zaslavskaia, ex-assessora de Gorbachev, que de certa forma anunciou a perestroika ao mundo quando concedeu entrevista à "Business Week". Tatiana analisa como se recompôs a estrutura social na Rússia de 1993 a 1995. Ela é presidente de um instituto que desde 1992 monitora, através de pesquisa em todas as regiões da Rússia, a opinião pública sobre as reformas. Há um conjunto de respondentes bastante elevado nessa pesquisa, que é feita mensalmente. Ela identifica quatro camadas sociais na Rússia em meados dos anos 90: uma superior, que corresponde a mais ou menos 1% da população; a média, a 24%; a básica, a 68%; e uma inferior, a 7%. Ela adverte que na primeira e na última os números podem estar subestimados, pois naquela não se incluiu a alta burocracia estatal e o generalato, e nesta não foi considerado o lumpesinato, os miseráveis das ruas. Na camada superior ela colocou empresários médios e grandes. Na média, pequenos proprietários, gerentes da esfera produtiva e não-produtiva, especialistas, elite trabalhadora e oficiais militares. Na básica, pôs a massa da intelligentsia – vejam como a intelligentsia está mal na Rússia, em terceiro plano – e a semi-intelligentsia, que são os auxiliares, servidores técnicos, trabalhadores de comércio e serviços, pessoal de média qualificação e camponeses. E na classe inferior, os trabalhadores não-qualificados. O material está publicado na revista do Instituto de Estudos Avançados da USP (setembro/dezembro de 1996).
Outra pesquisa, mais recente, foi feita por Tatiana Maleva, economista especializada em mercado de trabalho. Com o apoio da Fundação Ford ela conseguiu fazer um estudo que abrange 5 mil residências em 12 regiões da Rússia, para identificar a classe média. Ao contrário da tentativa de estratificação feita por Zaslavskaia, Maleva usou três critérios para agrupar as famílias em diferentes extratos ou camadas sociais: o econômico envolvia as variáveis renda per capita e disponibilidade de riqueza, entendida como posse de automóvel, imóvel e poupança; o social estava vinculado a educação, emprego de colarinho branco e o trabalho intelectual; e há o critério que ela chama de auto-identificação, que é muito importante porque tem a ver com como a pessoa se sente e em que classe se considera integrada. Os resultados devem ser publicados pela Fundação Ford ou pela Corning Endowment, de Washington. Ela identificou uma fatia de classe média de mais ou menos 20% da população e um grupo de 10% de miseráveis e muito pobres. Perguntei-lhe sobre os 70% restantes e respondeu que é uma massa de gente cuja situação não está definida, sem emprego fixo, com dificuldade de se inserir no mercado de trabalho. A perspectiva seria de incluir 33% desses 70%, quase a metade, na classe média, mas isso depende da capacidade da economia de absorvê-los. Para os demais, 37%, a perspectiva era de se juntarem à população mais pobre.
Aparentemente, não há incompatibilidade entre as duas pesquisas. O que se vê é uma parcela de gente muito rica na de Tatiana Zaslavskaia. A de Maleva não chegou a identificar esse grupo muito rico, mas a camada média e uma porção muito grande de pobres.
Neste processo de dez anos, seja por conta da privatização, seja pela transformação que reduziu o PIB da Rússia em mais de 50%, a estrutura social criada revelou-se desigual e concentrada. Segundo dados disponíveis, viviam abaixo do mínimo de subsistência na Rússia entre 24,7% e 29,1% da população, respectivamente em 1995 e 2000, especialmente entre os aposentados. Nesse mesmo período, o coeficiente entre a renda média dos 10% da população mais rica e os 10% da mais pobre foi de 14 vezes. Embora a renda mensal tenha melhorado muito no período 1999-2001, a distribuição de renda por quintis – divisão da população em cinco parcelas de 20% – indica perda de renda para os três primeiros quintis, ou seja, 60% da população de renda mais baixa ficou mais pobre entre 1990 e 2001. Ela antes detinha 43,5% da renda total e passou a dispor de somente 31,3%. A renda do grupo que seria a classe média, que fica no quarto quintil, teria se mantido em torno de 22% do total, e a do quintil mais bem aquinhoado passou de 32,7% em 1990 para 47% do total em 2001. É um processo de concentração em que as camadas mais pobres transferiram renda para o núcleo mais rico.
Essa situação de grande empobrecimento resulta, segundo os analistas, da maneira pela qual foi implementada a política de ajustamento no começo do governo Ieltsin. Isso se refletiu no plano político, com o Partido Comunista detendo ainda uma posição de primeira grandeza na Rússia, e no plano ideológico, porque há um sentimento de injustiça social, de desordem, de melancolia em relação ao passado. Isso é visível especialmente entre a população menos privilegiada.
Quanto à política interna, vejo dois problemas centrais. O primeiro diz respeito à eleição para a Câmara de Deputados em dezembro e para a presidência da República na primavera de 2004. Não há dúvida de que Putin será reeleito, e por grande maioria de votos, talvez no primeiro turno. A questão se coloca, porém, exatamente na eleição dos deputados. Embora o Parlamento não tenha essa força toda, a eleição de dezembro é importante porque Putin teria a intenção de permanecer no poder. Como não pode eleger-se para o terceiro mandato, em 2009, acredita-se que tentaria mudar a Constituição, dando maior força ao gabinete e assumindo o cargo de primeiro-ministro. Essa intenção pode ser sentida na mensagem que mandou ao Congresso em maio de 2003, afirmando a necessidade de reforçar o Parlamento e insinuando a perspectiva de se chegar a um regime parlamentarista, com um conselho de ministros com mais força e restrição aos poderes do presidente.
Nessa campanha eleitoral de deputados é que se estão jogando todas as fichas, e não é de agora. De uns tempos para cá, vêm sendo tomadas medidas para sujeitar gradativamente a mídia. Hoje ela é totalmente controlada pelo governo, segundo as opiniões que ouvi na Rússia. Mais: o Estado usa de instrumentos, chamados de recursos administrativos, para usar um termo leve, para impedir candidaturas. Quando um candidato é forte em determinada região, a Procuradoria da Receita Federal faz uma devassa, assim como a comissão eleitoral, e o impede de participar da eleição porque deve impostos ou porque deixou de cumprir uma norma qualquer. É um esforço deliberado para controlar as candidaturas.
O sistema eleitoral russo é de dupla entrada. Há votação proporcional por partido, o que leva os mais fracos a se organizarem em blocos para poder competir e garantir algumas cadeiras que lhes dêem chance nas votações, e existem as circunscrições unitárias nos distritos, onde as pessoas se candidatam nominalmente e vale o voto majoritário. Esse sistema já foi utilizado nas eleições regionais para controlar indiretamente o Parlamento, na medida em que os governadores das regiões indicam os representantes para a Câmara Alta, equivalente ao Senado. Diria que é menos para fins eleitorais e muito mais para assegurar ao poder central o controle do país. De qualquer forma, a perspectiva eleitoral leva a ações mais audazes, como está acontecendo atualmente.
O jornal "Financial Times" divulga esses fatos. O governo, através da Procuradoria da Receita Federal, resolveu investir contra um magnata. Falei em nove magnatas, cabeças de grandes grupos econômico-financeiros. Dois deles foram expulsos no começo do governo Putin, por serem donos de empresas de mídia. Um é Boris Berezovsky, que está na Inglaterra lutando contra a extradição pedida pelo governo russo por conta de falcatruas cometidas. O outro é Vladimir Guzinsky, que era diretor de teatro e se tornou também um magnata da mídia. Está exilado com a família na Espanha. Era presidente da Federação Israelita da Rússia, com grande atuação entre a comunidade judaica. E agora Putin persegue um terceiro judeu, chamado Mikhail Khodorkovsky.
Um parêntese: dos nove magnatas, pelo menos sete são judeus. Não se trata de uma perseguição racial. É que, entre os magnatas, Khodorkovsky é o que tem uma atuação empresarial mais progressista. É aquele que de certa forma procura utilizar parte de seus recursos para formação de mão-de-obra mais especializada. Ele comanda bancos e organizações de vários tipos, e é presidente da Yukos, uma grande exploradora de petróleo, que tentou se juntar com a Sibneft, uma empresa menor, para formar um grupo que seria o quarto produtor mundial de petróleo. Esse cidadão financiou dois partidos de oposição, um chamado Iabloko, cuja tradução seria maçã, mas não tem nada a ver com a fruta, são as iniciais dos nomes de quem constituiu o partido. Ele é de centro, parecido um pouco com nosso PSDB, e junta uma parte considerável da intelligentsia progressista. Khodorkovsky financiou mais um partido, constituído por uma elite mais intelectualizada, a União das Forças de Direita. Já encontrei também a informação de que ele ajudou até comunistas, está pronto a apoiar quem for contra o governo. Ele já sinalizou também que vai se retirar da direção das empresas e revelou algum interesse por política, indicando a intenção de ser candidato à presidência mais adiante.
Na disputa entre Putin e Khodorkovsky, membros encapuzados enviados pela Procuradoria da Receita Federal invadiram uma empresa dele para prender seu tesoureiro, Platon Lebedev. Khodorkovsky recorreu aos norte-americanos, com quem tem muito boas relações, por meio da embaixada, o que deixou Putin mais enfurecido, embora afirme que não tem nada a ver com isso e não pode se meter porque se trata de assunto da Justiça. Houve tentativa de acordo em torno de alguns bilhões de dólares para libertar Lebedev, mas Khodorkovsky recusou a barganha.
Putin tem a origem no Serviço Federal de Informações, que substitui a KGB. Trouxe para a administração da presidência, que seria nossa Casa Civil com poderes ampliados, um grupo de correligionários do serviço de segurança. É preciso dizer que a administração da presidência na Rússia tem uma posição quase tão importante quanto a do próprio presidente. Mas trouxe também jovens economistas, tecnocratas que trabalharam com ele depois que deixou o serviço de informações e se tornou vice-prefeito de São Petersburgo. Esse pessoal estaria à frente do ataque a Khodorkovsky, porque teria sido suplantado no processo de privatização nos anos 90. Querem rever esse programa, o que está provocando muita confusão. Fala-se que Khodorkovsky será o primeiro e logo virão os outros magnatas, e que se revisará todo o processo, o que significa um retrocesso, e não agrada nem aos russos nem aos círculos econômicos ocidentais.
Outra questão importante é a da Tchetchênia, a guerra que parece não ter fim. Muito se escreveu sobre isso e vou apenas falar das dificuldades para chegar a algum compromisso de paz. Em primeiro lugar, há o sentimento de que é preciso garantir a unidade da federação, caso contrário a Rússia acabará sofrendo o mesmo destino da União Soviética. A Tchetchênia fica no Cáucaso, uma região convulsionada, plena de nacionalidades distintas. Se for atendida a reivindicação de uma das repúblicas, há um risco de desmoronamento da federação. Esse é o argumento oficial. Há contudo coisas mais importantes por trás dessa história. A Tchetchênia está situada numa importante região de exploração petrolífera, e é uma área de passagem do oleoduto que vai do Azerbaijão para o Ocidente. Os norte-americanos estão interessados em isolar a Rússia, tentando desviá-lo pela Turquia, até um porto no Mediterrâneo. Então há questões econômicas em jogo, mais ainda quando se introduz o petróleo do mar Cáspio, que está sendo objeto de disputa. Discute-se a que república pertencem aquelas águas e, conseqüentemente, o petróleo.
As dificuldades para chegar a um acordo têm a ver primeiro com a intransigência russa em fazer concessões e negociar com os rebeldes. Estes por sua vez não cedem em relação à independência. Há quem diga na Rússia que não há com quem negociar. Os revoltosos são conduzidos por líderes radicais. O menos radical, que foi presidente da Tchetchênia durante uma fase relativamente estável, chama-se Mashakov, está exilado e aparentemente associado aos rebeldes. Putin, intransigente, diz que não negocia com bandidos. Os esforços do governo russo, sem negociação, consistiram em fazer aprovar, por referendo, uma nova Constituição, cuja votação entretanto foi muito suspeita, pois deu 95% de respostas favoráveis à nova Carta. Além disso programou eleições, nomeou uma administração tchetchena, mas há uma resistência muito grande à normalização. Essa resistência consiste na sucessão de atentados terroristas, como se pode acompanhar pelos jornais.
A situação está mais complicada ainda porque Putin aproveitou os atentados de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos para promover uma guinada em sua política em relação ao Ocidente. Transformou o conflito na Tchetchênia em questão internacional, associando-o à guerra mundial contra o terrorismo. Isso cria para a Rússia uma série de dilemas importantes. Em primeiro lugar, a internacionalização do conflito significará problemas para agir com soberania contra os terroristas tchetchenos. Já houve referências no "Financial Times" a propostas de formação de um batalhão de paz para a Tchetchênia, bem como de um pacote financeiro para ajudar a reconstruir a capital, Grozny, completamente arrasada durante a guerra.
Por outro lado, ao se associar aos Estados Unidos no conflito contra o Afeganistão, a Rússia foi intermediária em algumas ex-repúblicas soviéticas, para facilitar a instalação de bases militares norte-americanas nesses territórios. Agora os norte-americanos não saem de lá, apesar das negociações, e isso de algum modo vem reforçar a idéia de certa blindagem que se faz em torno da Rússia ainda hoje, a despeito do fim da guerra fria. A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) avança para o leste, treina tropas no Usbequistão, no Turcomenistão, na Geórgia, todos na região do Cáucaso, apesar dos entendimentos que a Rússia mantém com a Otan no esquema 19 mais um. São 19 membros mais a Rússia, esta sem poder de decisão, só de opinião. Uma questão complicada.
Sobre a situação internacional, uma pergunta que se faz é a seguinte: se a capacidade econômica da Rússia decresceu em mais de 50% e o país pode em termos econômicos ser considerado emergente (ainda que esse termo precise ser qualificado), como pode ser tratada no mundo inteiro como grande potência? Essa indagação tem várias respostas. A mais simples é a que diz que o país tem arsenal nuclear. Ele está de certa forma tecnologicamente superado, não só por causa da falta de manutenção mas também porque, segundo a concepção moderna, é preciso maior mobilidade, o que as imensas ogivas nucleares não oferecem. Hoje essa tecnologia não é mais privilégio de dois países, vários deles têm armamento nuclear, o que não deixa de ser um perigo para a humanidade.
Mas há outros fatores, e o primeiro deles é a posição geográfica da Rússia, que lhe dá uma condição estratégica privilegiada. Ela está situada entre o Oriente e o Ocidente, e tradicionalmente constitui uma ponte entre as duas civilizações. Em segundo lugar, a Rússia ocupa uma posição no continente europeu que não pode ser subestimada. É difícil imaginar a Europa unida sem a Rússia, ela tem metade do território, é um depositário de riquezas naturais imensas.
Em terceiro lugar, os russos ainda detêm poder de veto no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Mesmo que se fale muito hoje de reforma da ONU, possivelmente com a ampliação do número de membros desse conselho, é uma vantagem que eles procuram explorar bem, como se viu no conflito com o Iraque. E há a herança do passado, que não é só essa cadeira no Conselho de Segurança, mas também as vinculações tradicionais da ex-União Soviética com as repúblicas vizinhas e a China, que vem sendo pintada como grande potência mundial nos próximos anos.
Isso não significa que a situação da Rússia seja fácil. Ela precisa se equilibrar entre o Ocidente e o Oriente, especialmente quando seus investimentos são afetados. Os russos têm grandes interesses econômicos no Iraque e no Irã, e isso torna difícil uma guinada para o Ocidente. Mais: as vantagens que eles têm podem desaparecer no médio e longo prazos se a Rússia não enfrentar suas debilidades, a mais importante das quais é a militar. O país está tentando reformar suas forças armadas, mas o processo empacou por falta de recursos. A idéia era criar um exército profissional reduzido, de oficiais e soldados bem treinados, mas hoje o que existe é uma corporação mista de conscritos com treinamento reduzido de um ano para seis meses, porque não há dinheiro para mantê-los. E um grupo de oficiais que é de longe muito menor do que se esperava em termos de um exército profissional. Há a tentativa de alocar recursos do orçamento para restabelecer o complexo industrial militar, mas esse processo está no início, e vai levar certo tempo.
Quanto às relações do Brasil com a Rússia, elas vão muito bem. Durante o governo Fernando Henrique foram assinados muitos acordos de cooperação no plano econômico, político e cultural. Levamos a Vai-Vai para dançar em Moscou, entre outras coisas. Parece que essa disposição existe também no governo Lula, porque a primeira missão comercial que saiu daqui, chefiada pelo ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, foi para Moscou. No plano comercial, nossas exportações para a Rússia crescem muito, passaram de US$ 570 milhões em 1995 para US$ 1 bilhão em 2001 e US$ 1,2 bilhão em 2002. As importações flutuam em torno de US$ 400 milhões a US$ 450 milhões. A perspectiva desse crescimento é boa, porque implica exportar produtos novos, a carne, por exemplo, que está ocupando o lugar do café e do açúcar. Os russos estão criando problemas de ordem protecionista para a compra de açúcar, fixando cotas, e nossa exportação do produto não é igual à do passado, nem a do café e do café solúvel. No lado das importações, quase 80% do que compramos são matérias-primas para adubos e fertilizantes.
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