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Do gibi ao feed
HISTÓRIAS EM QUADRINHOS PUBLICADAS NA INTERNET DÃO VISIBILIDADE
A NOVOS ARTISTAS E AMPLIAM DIVERSIDADE DE TEMAS
Se a internet mudou a forma como nos relacionamos, vivemos, consumimos, trabalhamos e fruímos expressões artísticas, não seriam os quadrinhos a ficar de fora dessa história. Na última década, milhares de artistas encontraram nas redes sociais uma plataforma que lhes dá visibilidade e liberdade de criação. Webcomics, quadrinhos online ou web quadrinhos dá nome a esse formato de autopublicação independente que arrebata leitores e leitoras que já consumiam o gênero literário em páginas impressas, e que agora também atrai um novo público.
A quadrinista Carol Ito publica seus trabalhos nas redes sociais desde 2014, o que, segundo ela, contribui para a cena dos quadrinhos. “Atualmente, acho que o Instagram é a rede mais usada por quadrinistas justamente por priorizar a imagem e por ter uma usabilidade interessante para o quadrinho [nela, há a possibilidade de postar as histórias em sequência, no formato carrossel]. Para mim, como artista independente, a rede social foi o começo de tudo e ainda é uma forma de nos comunicarmos com os leitores sem intermediações. Sem necessariamente estar na imprensa ou ter que publicar livros por editoras”, destaca Carol.
Além de proporcionar um espaço para mais artistas criarem e mostrarem seus trabalhos, ampliando, consequentemente, sua audiência, as redes sociais ainda se tornaram espaços onde é possível tratar de diferentes temas. “Quanto mais pessoas produzindo de maneira independente e livre de critérios das editoras e de grandes eventos, que muitas vezes são limitadores da criatividade, mais diversidade a gente acaba vendo”, observa a jornalista e mestra em antropologia Gabriela Borges, criadora e curadora da plataforma digital e revista Mina de HQ. Inclusive, é essa diversidade de quadrinhos nas redes que fomenta o trabalho de canais como a Mina de HQ. “A curadoria que eu faço existe graças às redes sociais, porque é onde consigo chegar a esse tesouro dos trabalhos independentes. É justamente na internet, nesses espaços abertos e mais democráticos, que eu consigo buscar essa pluralidade”, acrescenta.
ARRASTE PARA O LADO
Realizado pelo Sesc Pompeia, o projeto Quadro a Quadro, publicado no canal de Instagram da unidade, soma-se a essa cena digital de fomento aos quadrinhos. Todo mês, um(a) artista é convidado(a) a criar e publicar uma série semanal, dividida em quatro capítulos – cada qual com nove quadros. “A ideia foi trazer quadrinistas de todas as regiões do Brasil, tanto pessoas já conhecidas por terem seus trabalhos publicados em grandes editoras quanto artistas que só publicavam na internet”, explica Soraya Idehama, programadora do Sesc Pompeia.
Já foram publicadas mais de dez histórias desde junho de 2021, narrativas que passeiam por invasões de alienígenas, desilusões amorosas, questões de gênero e outros temas. Entre alguns dos convidados, o quadrinista Rafael Côrrea trouxe para o feed do Instagram Epílogo, uma inusitada história de amizade entre um robô e uma vovó num mundo pós-apocalíptico. “Eu gosto muito de histórias mudas e acho um desafio fazer uma narrativa gráfica nesses moldes. O fato de não ter texto amplia o alcance, atingindo um público ainda mais diverso”, conta.
Segundo a programadora do Sesc Pompeia, apesar do tema livre, a curadoria do Quadro a Quadro procurou trazer temáticas diversas. “O projeto atentou-se de forma bastante cuidadosa para o momento em que estávamos e também para dar visibilidade aos quadrinhos que expunham questões que estavam pulsando devido à pandemia, e de que forma os(as) artistas estavam retratando essas situações, como por exemplo a saúde mental e o isolamento social, em seus trabalhos”, complementa Soraya.
Foi o caso da webcomics Inteiro pesa mais do que a metade, na qual a quadrinista Carol Ito ilustra, de maneira sensível, a forma como ela própria lida com a ansiedade e a depressão. “Foi inevitável falar desse assunto até porque eu estava elaborando essa questão e tentando encontrar caminhos e novos tratamentos. Pensei: vou ter que fazer uma história sobre isso. Inclusive porque, para mim, os quadrinhos também são uma ferramenta terapêutica, uma forma de canalizar o que estou sentindo”, compartilha.
A partir dessa experiência, a autora criou, semana a semana, um roteiro e se surpreendeu com a resposta do público. “Recebi muitos comentários de pessoas vivendo coisas parecidas e que perceberam que precisavam buscar ajuda. Acho que foi bem importante para que pudessem rever o que elas estavam passando”, recorda.
Dessa forma, para além da fruição cultural e do fomento da produção autoral brasileira, os web quadrinhos ainda se revelam como potencial suporte para reflexões. “As mídias sociais e outras ferramentas digitais são importantes não só por atingirem públicos que muitas vezes não conhecem seu trabalho, mas também por promoverem acesso a uma discussão sobre saúde mental, por exemplo, em forma de quadrinhos. E é bem legal que essa troca possa acontecer”, celebra a quadrinista.
SERVIÇO | Quadro a Quadro
Neste projeto de webquadrinhos com histórias publicadas exclusivamente online, pelo Instagram do Sesc Pompeia, os leitores acompanham uma narrativa com quatro capítulos cada. Toda semana, um capítulo da HQ – composto por nove quadros, exibidos no formato de carrossel – é publicado. Em abril, quem ilustra o Quadro a Quadro é a quadrinista Hipácia Caroline, com a HQ Maritza.