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Do morro às passarelas

A exposição Retalhar, em cartaz no Sesc Belenzinho, apresenta algumas das criações da Coopa-Roca, que começou como um projeto social de reciclagem de tecido e transformou-se numa das principais cooperativas de costura do país

Por entre o sobe-e-desce das escadarias do Morro da Rocinha, no Rio de Janeiro, a maior favela da América do Sul, algumas senhoras estavam confortavelmente reunidas nas varandas de suas casas. Entre um assunto e outro, com agulha e pano em mãos, o fuxico foi crescendo, não apenas sob a forma de prosa, mas também como arte de aproveitar retalhos.
O trabalho artesanal, antes utilizado para confeccionar peças apenas de uso pessoal - como roupas e mantas -, transformou-se em um negócio lucrativo, e, mais do que isso, uma forma de garantir a essas mulheres um merecido reconhecimento profissional.
Completando em 2002 duas décadas de produção direcionada à decoração e ao vestuário, a Coopa-Roca (Cooperativa de Trabalho Artesanal e de Costura da Rocinha) surgiu a partir da experiência de uma oficina de reciclagem de brinquedos para crianças da favela. Motivadas por essa atividade, as mulheres da comunidade decidiram levar adiante a proposta de desenvolver e comercializar produtos artesanais feitos com retalhos de tecidos e lixo industrial têxtil de grifes cariocas.
Mas elas não pararam por aí. Buscando explorar o potencial criativo e econômico das técnicas desenvolvidas no Coopa-Roca - crochê, fuxico, patchwork e nózinho - para aumentar a gama de produtos e garantir a geração de renda às artesãs cooperadas, foi criado o projeto Retalhar, que teve sua primeira exposição no ano 2000. A mais nova edição do projeto está em cartaz no Sesc Belenzinho até o dia 29 de setembro. Um evento cuja programação conta ainda com espetáculos teatrais, shows, cursos e oficinas.
O objetivo do projeto é disponibilizar o serviço das artesãs como mão-de-obra para produtos diversos idealizados por estilistas e designers. “Assim, é possível que elas participem do orçamento familiar sem sair da comunidade e, dessa maneira, relacionem a ocupação com o cuidado dos filhos e da casa”, afirma a coordenadora da Coopa-Roca e curadora da exposição, Maria Teresa Leal. Paralelamente, novas parcerias e projetos seguiram ampliando o número de mulheres envolvidas (hoje, 75 cooperadas) e o impacto social da iniciativa.
Dessa forma, associados às abordagens diferenciadas de artistas reconhecidos em várias áreas de atuação e empresas destacadas pela originalidade, os produtos da cooperativa se desvinculam da tradicional imagem assistencialista e assumem referências culturais brasileiras contemporâneas.

Mãos habilidosas
Rosângela de Sousa Teodosio, que já havia aprendido algumas técnicas artesanais com a mãe, resolveu se aprimorar. Realizou um curso técnico no Coopa-Roca e, em três anos, tornou-se reconhecida entre colegas e passou a presidente da cooperativa. “O Retalhar, além de trazer enorme satisfação pessoal para todas nós, alavancou a produção e o nome da cooperativa. Além disso, devido ao vínculo com os estilistas, há uma grande troca de idéias.”
A gerente de produção Lucélia Carvalho concorda com a colega, mas ressalta que a tarefa é árdua para mãos tão habilidosas: “Quando temos encomenda, as artesãs trabalham em ritmo acelerado, mas, pelo resultado final, vale a pena”, comenta Lucélia.
As criações do grupo para a atual edição cobrem desde objetos de design de Fernando Jaeger e Fred Gelli, até peças fashion, como o vestido de fuxico do estilista Carlos Miele (M. Officer) e o de patchwork de chamois de Maria Cândida Sarmento, da Maria Bonita, passando pela instalação assinada pela arquiteta e cenógrafa da Rede Globo, Fumi Hashimoto, e o registro fotográfico do alemão Michael Wesely sobre a comunidade da Rocinha.