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Ciência no dia a dia

Foto: Wikimedia Commons
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Imagine o cotidiano de um laboratório no século 19, na França. Curiosidades, perguntas e respostas moviam os cientistas do período (como hoje ainda movem), encarregados de fazer descobertas que circulariam e modificariam para sempre a vida da população. Um dos responsáveis por acender a fagulha que iluminaria esse caminho da popularização da ciência foi Louis Pasteur. Era parte de sua estratégia a exibição pública dos experimentos realizados em laboratório. Quem ilustra a atitude é museógrafa Astrid Aron, da exposição interativa Pasteur, o Cientista, no Sesc Interlagos (leia Lente de aumento): “Para provar ao público reunido na Sorbonne que as bactérias estavam por toda parte, mesmo no ar, ele direcionou um projetor de luz para iluminar os grãos de poeira”.

Logo cedo

Pasteur nasceu em Dole, no interior da França, em 1822, numa família que era proprietária de um curtume. Desde cedo, mostrou interesse pela ciência e, ainda na adolescência, aos 17 anos, construiu um relógio solar.

Um dos seus mestres nos estudos acadêmicos foi o francês Jean Baptiste Dumas, conhecido por formular princípios químicos e determinar o peso de elementos da composição do ar, como o gás carbônico. Determinado a popularizar as novidades do campo científico e fazê-las se espalhar para além da academia, Pasteur foi professor em Estrasburgo e Paris.

Microuniversos

Tentar, experimentar, corrigir e acertar são verbos que deviam ser recorrentes no repertório linguístico do cientista, lembrado como um pesquisador obstinado, que disseminou a relação do desenvolvimento científico com a mudança na qualidade de vida das pessoas. Em termos práticos, seus estudos culminaram na revolução da química e da medicina, levando-o a se tornar um dos criadores da microbiologia.

A investigação sobre doenças que seriam transmitidas por seres invisíveis a olho nu (vírus, bactérias etc.) é anterior ao trabalho de Pasteur, mas a partir de suas pesquisas essas relações ficaram mais claras e se desdobraram. Uma de suas contribuições para o estreitamento das relações entre pesquisa, saúde e a aplicação em nosso cotidiano é a assepsia, considerada a base da higiene hospitalar, afirma a biomédica Paola Minoprio, coordenadora da Plataforma Científica Pasteur-USP (SPPU), realizada pela ação conjunta do Instituto Pasteur de Paris, da Universidade de São Paulo e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro. “Sua preocupação com as doenças infecciosas levou a mostrar a relação microrganismo-doença e assim encontrar os princípios da prevenção”, esclarece.

A influência de Pasteur não se restringe à área da química e da biologia. Ele alcançou outros cenários: o da agricultura, do campo cirúrgico e da higiene. Tal impacto tem como referência seus estudos da pasteurização, fermentação láctica e alcoólica, e da esterilização. Uma das indústrias afetadas positivamente foi a da fabricação do vinho e da cerveja e até o mercado da produção da seda (em sua pesquisa, o químico descobriu o agente infeccioso de uma doença do bicho-da-seda e a maneira como esse agente era transmitido).

Ecos no Brasil

Da construção do relógio solar amador para os estudos avançados e com impactos sociais, Pasteur redefiniu as práticas científicas, alavancando as descobertas feitas no laboratório para outros lugares do mundo. São conhecidas as tentativas de Dom Pedro II em trazer o cientista ao Brasil, em convites feitos nas cartas trocadas entre eles. O francês nunca pisou em solo brasileiro, mas influenciou o médico e cientista Oswaldo Cruz (1872-1917), que, encantado por microbiologia, chegou a montar um laboratório improvisado no porão de sua casa. Já formado, viajou para Paris em 1897, onde estudou no Instituto Pasteur.

Em 1847, Pasteur recebeu a concessão da Légion d’Honneur Francesa (condecoração por méritos eminentes militares ou civis à nação). Entre outras realizações, desenvolveu a primeira vacina contra a raiva, em 1885. De acordo com Paola, essa pesquisa derivou da comprovação de que a “atenuação de microrganismos se dava efetivamente por meio da vacinação contra infecções causadas por esses mesmos microrganismos”.

Em 1888, foi inaugurado o Instituto Pasteur, com a missão de ser um centro de educação e de tratamento da raiva e de doenças infecciosas. “Seu principal objetivo não era reunir uma fortuna, mas assegurar fundos para prosseguir com as pesquisas”, destaca o curador científico da exposição Pasteur, o Cientista, Maxime Schartz.

As descobertas iniciadas no século 19, muitas delas fruto dos estudos de Pasteur, pautaram uma série de mudanças que, até hoje, têm reflexos na implementação de políticas públicas voltadas à saúde, resultando no aumento da longevidade. Louis Pasteur morreu em 28 de setembro de 1895 em Marnes-la-Coquette, na França.

De descoberta em descoberta

Marcos históricos para um novo olhar sobre a ciência

1848: Louis Pasteur leva à Academia de Química de Paris a teoria da assimetria molecular, afirmando que as propriedades biológicas das substâncias químicas dependem da disposição dos átomos no espaço e não só da natureza da sua composição.

1857: Desta data até 1876 o trabalho com a pasteurização resolveu problemas da indústria das bebidas, potencializando a qualidade da produção, em especial da cerveja, do vinho e do leite.

1860: Dos experimentos no campo da pasteurização chegamos às relações criadas pela contaminação de microrganismos. Destacou-se a importância da esterilização de instrumentos cirúrgicos para a não proliferação de doenças causadas por bactérias.

1864: Pasteur bateu de frente com teorias da época para demonstrar, na Universidade Sorbonne, que organismos se originavam de outros já existentes, contrariando a teoria vigente da geração espontânea.

1870: Aquecer os líquidos a 60º foi um dos apontamentos da pasteurização, que impediu a proliferação de microrganismos. Os líquidos eram conservados nesta temperatura até serem transferidos a embalagens limpas e hermeticamente fechadas.

1880: Pasteur inventou a vacina que curou a até então fatal raiva, transmitida pela mordida de mamíferos, como cães e lobos. A vacina curou crianças e adultos, tornando seu laboratório um endereço muito procurado, o que resultou, com o passar dos anos, na criação do instituto que levaria seu nome.

1888: Inauguração do Instituto Pasteur, em Paris, construído por meio de doações. Entre os doadores, Dom Pedro II, homenageado com um busto na biblioteca. O instituto se mantém em atividade e foi dirigido por Pasteur até sua morte, em 1895, aos 72 anos.

Lente de aumento

Vida dedicada ao saber é tema de exposição interativa

O pesquisador Louis Pasteur é revisto com lupa no Sesc Interlagos de 6 de fevereiro até 26 de julho na exposição Pasteur, o Cientista. São 730 m² para celebrar o pesquisador que renovou noções químicas e biológicas, deixando-as ao alcance da sociedade em geral. Trata-se de uma reunião de vídeos, grafismos, animações, projeções, textos e desenhos vindos direto do Palais de la Découverte, em Paris.

A mostra é dividida em seis partes vistas em ordem cronológica. Para receber os visitantes, há um busto de Pasteur em 3D, seguido das respostas dos enigmas químicos até a descoberta da vacina contra a raiva. No encerramento, há o espaço para a relação de Pasteur com o país, exemplificado com pesquisas aqui realizadas e o desenvolvimento da produção de vacinas pelos institutos Butantan e Oswaldo Cruz. A exposição foi concebida pela Universcience – órgão do Ministério da Cultura da França – e é uma realização do Sesc São Paulo, com patrocínio da Sanofi Brasil, Magazine Luiza e apoio da Embaixada da França no Brasil e do Museu da Vida.