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Para todos!
Ilustração: Marcos Garuti
Sempre vi com naturalidade o fato de as pessoas com deficiência poderem ter uma vida normal e ativa. Talvez porque, desde criança, convivi com um familiar – o primo do meu pai – que, apesar de ter o braço amputado e usar uma prótese, vivia razoavelmente bem e com certa autonomia. No entanto, quando saía do ambiente familiar, eu notava que, geralmente, as pessoas com deficiência não estavam na escola, raramente passeando com a família e, quando as encontrava nas ruas ou no supermercado, havia olhares de pena. Levou um tempo para eu entender por que, em termos de legislação e de garantias de cidadania, não éramos todos vistos como iguais em direitos.
Era um erro comum, até pouco tempo, chamar alguém de deficiente, mas era ingenuidade minha também achar que as pessoas com deficiência faziam parte de tudo. Isso eu não sabia. Conforme cresci, vi que havia bons exemplos de pessoas com deficiência que estudaram, trabalharam e tiveram oportunidades, assim como meu parente. Percebo que tudo é uma questão de convivermos para aprendermos na diferença.
Hoje, comparo a interação com a pessoa surda como a de quem fala outro idioma, como a Libras – Língua Brasileira de Sinais. Logo concluí que a barreira é comunicacional apenas. Sabemos hoje que a deficiência é somente mais uma dentre as diversas características biopsicossociais de uma pessoa e temos que reduzir as barreiras que as impedem de acessar o mundo.
Podemos dizer que houve histórica evolução do modelo médico assistencialista do passado para um modelo social atual, onde há um crescente protagonismo das pessoas com deficiência, que buscam um lugar na sociedade, ser ouvidas e ter seus direitos garantidos como qualquer outro cidadão. As empresas e instituições começam a olhar as competências e não mais as deficiências dessas pessoas. Começamos a perceber que recursos e tecnologias assistivas, como a interpretação em Libras ou mesmo a audiodescrição em atividades culturais, não são apenas serviços de mediação. São pontes de acesso à cultura, agregam novas percepções e oportunidades.
A Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, que completou dez anos em 2016; as lutas pelos diretos humanos desde os anos 1970; a Lei de Cotas, desde 1991; e a Lei Brasileira da Inclusão – que fará dois anos de vigência neste ano – fortalecem a dignidade dessas pessoas. O desenho universal e a acessibilidade permitem equiparação de direitos. Também garantem usabilidade de espaços, equipamentos e serviços; autonomia e segurança; e comunicação acessível para qualquer um. Essas iniciativas apontam que esse fenômeno sociológico sem precedentes não tem mais volta e vai muito além da dimensão arquitetônica. Assim, atitudes acessíveis e inclusivas promovem a cidadania das pessoas com deficiência e garantem equidade de direitos para todos.
Essa tomada de consciência está mudando o rumo da sociedade contemporânea, das cidades, dos serviços e fruições da vida. Acredito que reparamos melhor no outro quando exploramos mais nossos sentidos – mesmo na falta de algum deles –, saímos um pouco do ritmo frenético de nossos tempos e ampliamos nossa percepção de mundo.
O trabalho de cada um de nós no Sesc busca esse desafio de articular, estimular e promover ações que sejam para pessoas – com e sem deficiência – usufruírem de momentos de convivência, trocas, respeito mútuo e alteridade. Essa construção permanente será sempre gratificante e motivadora, pois busca ser para todos!
Octávio Weber Neto é assistente-técnico na área de acessibilidade da Gerência de Educação para a Sustentabilidade e Cidadania do Sesc São Paulo. Graduado em Biologia, com pós-graduação em Educação Ambiental e especialização em Educação e Desenvolvimento de Pessoas.