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Tom Zé reencontra o clássico "Todos os Olhos"

Tom Zé toca Todos os Olhos na íntegra no Sesc Belenzinho<br>Foto: André Conti/Divulgação
Tom Zé toca Todos os Olhos na íntegra no Sesc Belenzinho
Foto: André Conti/Divulgação

Entre os dias 5 e 8 de dezembro, Tom Zé revisita, no palco do Sesc Belenzinho, "Todos Os Olhos", quarto disco de sua carreira. O álbum apresenta, em dez canções, toda ousadia, experimentalismo e criatividade sonora de um dos mais criativos tropicalistas. Lançado em 1973, no ápice da ditadura militar e em pleno momento de ascensão de sua carreira, o trabalho foi responsável por levá-lo ao esquecimento da mídia, crítica e público.

Quatro décadas depois, a obra é reconhecida por crítica especializada e fãs como uma das mais inventivas da música nacional. Atingindo as redes sociais, vídeos publicados no YouTube com as canções do álbum chegam a mais de 60 mil visualizações. Seu vinil foi relançado em 2010 pela Polysom e atualmente não pode ser comprado por menos de R$ 100,00 em sebos.

Por esses e outros motivos, a série de shows que comemora os 40 anos do lançamento do álbum está com os ingressos esgotados. O que é motivo de muita alegria para Tom Zé: "foi 'Todos os olhos' que me afastou das mídias e me levou ao ostracismo. Então, comemorar 40 anos com essa curiosidade do público é uma verdadeira redenção".

O que explica esse interesse tardio na obra? O próprio artista teoriza em entrevista à EOnline: "De vez em quando eu ouvia esse disco e me admirava: 'Meu Deus, que coisa bem-feita!'. Depois, em 1989, David Byrne [músico, líder da banda inglesa Talking Heads] me fez um relato da audição, dando parabéns por ele. Talvez coisa semelhante esteja interessando o público agora".  A chegada do inglês na biografia de Tom Zé o trouxe de volta aos holofotes exatamente quando estava de malas prontas para deixar a vida de músico de lado para trabalhar em um posto de gasolina em sua cidade natal, Irará, na Bahia.

Um trecho da canção que dá nome a "Todos os Olhos" retrata o momento vivido por Tom Zé em 2013: "De vez em quando todos os olhos se voltam pra mim, de lá do fundo da escuridão, esperando e querendo que eu seja um herói".

Na conversa com a EOnline, Tom Zé contou outras características das letras do disco. A canção “Complexo de Épico” é uma crônica da seriedade dos homens em tempos de ditadura militar: "havia uma impressão de que quanto mais carrancudo, mais engajado era o cara. Acho isso um equívoco", detalha.

Também entram lá os sonhos dos jovens com suas musas, representados por Brigitte Bardot. A canção diz: "A Brigitte Bardot está ficando velha, envelheceu antes dos nossos sonhos. A Brigitte Bardot está se desmanchando e os nossos sonhos querem pedir divórcio". O tempo passou e para o autor nada mudou: "parece que ela é candidata à imortalidade física".

No álbum ainda tem uma das diversas músicas de Tom Zé sobre São Paulo: a faixa "Augusta, Angélica, Consolação". Em sua discografia ainda estão: "A Volta do Trem das Onze", "São, São Paulo" e a mais recente: "O Motobói e Maria Clara", do disco "Tropicália Lixo Lógico". Perguntado se São Paulo a cidade o inspira hoje como nos anos 1970, ele agradece: "Obrigado por fazer essa comparação, é quase uma informação para mim mesmo. Pelas canções que você enumerou nesta pergunta eu vejo que vai ocorrendo uma mutação".

Acima, clipe da música 'Um Oh!, Um Ah!', penúltima faixa do álbum, lançado apenas nos anos 1990.

Além das canções, a capa do disco (imagem acima) é uma das lendas da música brasileira, pois em plena ditadura apresenta uma bola de gude em cima de um ânus. "A ideia foi de Décio Pignatari, eu achei muito corajosa, um gesto digno do poeta concreto que ele era. O pessoal da agência de publicidade que ele tinha na época foi quem providenciou todo o mecanismo", conta Tom Zé. Nem todo mundo tem a certeza de que se trata de um ânus na foto.

Recentemente, os bastidores da foto mostrando um ânus foram divulgadas pelo fotógrafo Chico Andrade mostrando que se trata de um ânus. Entretanto, Reinaldo Moraes, o responsável pela finalização da obra afirma que a imagem foi substituída por uma bola de gude na boca de outra modelo." "Ninguém ficou sabendo sobre a capa. Nem a gravadora, que era a Continental. Se soubesse, ela mesma se encarregaria da censura", afirma Tom Zé. Por curiosidade, perguntamos se a mesma imagem estamparia a capa de um disco em 2013. Ele duvida: "não sei se seria. Mesmo porque, nos dias atuais, pode-se botar até a mãe nua na capa".

Projeto Álbum

O show faz parte do projeto Álbum, que leva ao Sesc Belenzinho apresentações ao vivo e na íntegra de obras que remontam a memória da música brasileira. Já passaram pelo projeto Ultraje a Rigor, Sepultura, Titãs, Pato Fu, Alceu Valença, Naná Vasconcelos, Os Paralamas do Sucesso e muitos outros.

 

O vídeo acima é um trecho da apresentação de Tom Zé no Sesc Belenzinho, no dia 5 de dezembro. Quem perdeu pode ver o show novamente, vontade do artista não falta: "Eu quero repetir o show em outras cidades e locais. Tomara que haja muitos convites".