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Programa Saúde da Família procura cuidar do doente, não da doença

RAFAELA G. MÜLLER e GUSTAVO PRUDENTE


Distribuição de remédios em fazenda /Foto: Rafaela G. Müller

A canjica fresca na cozinha de um barraco da metrópole. O cheiro de mato e a paisagem verde das terras do interior. As casas conjugadas e coloridas da cidade agitada. As memórias da história numa comunidade remanescente de quilombo. Mas também a violência e o esgoto a céu aberto da favela. O batente puxado de trabalhadores do campo e da cidade. Os olhares curiosos de famílias de negros que pouco têm o que comer. Todos esses são ambientes, cheiros, cores e histórias da saúde brasileira. Realidades mais amplas que o éter dos hospitais, o branco dos consultórios e a frieza dos diagnósticos clínicos. E que começam a ser consideradas por uma política pública ainda pouco conhecida: o Programa Saúde da Família (PSF).

"Comadre!", atrapalha-se Adelaide da Silva Medeiros, de 55 anos, ao chamar Ângela Machado, médica da equipe que há quatro anos a atende em sua casa, em Baependi, sul de Minas Gerais. Além da família de Adelaide, Ângela é hoje responsável pela saúde de centenas de outros moradores do município, a maioria na zona rural. Para isso, conta com alguns parceiros. Em condições ideais, a chamada equipe básica do PSF é formada por um enfermeiro, dois auxiliares de enfermagem e de quatro a seis agentes comunitários de saúde.

O programa reflete uma mudança mundial no conceito de saúde, que tira o foco da doença e o direciona para a valorização do ser humano e a construção participativa da qualidade de vida. Na prática, esse ideal implica priorizar a atenção básica (ou primária) da saúde, a qual concentra as ações de prevenção de doenças e o cuidado dos problemas de simples resolução ou de diagnóstico precoce. No Brasil, esse setor está sob responsabilidade das Unidades Básicas de Saúde (UBS) - os famosos "postos". Quando funciona bem, resolve e previne pelo menos 80% dos problemas e serve de filtro para os serviços de média e alta complexidade (ou secundários e terciários), que envolvem consultas, exames e cirurgias especializados e se encontram em centros de saúde e hospitais. Juntos, os três níveis do sistema deveriam formar uma pirâmide, em cujo topo ficariam os casos de difícil (e cara) resolução.

A superlotação de centros de saúde e hospitais no Brasil e em diversos outros países demonstra, no entanto, como esse ideal está longe da prática. A atenção básica comumente não funciona bem, por descaso dos gestores ou por ser ignorada pela população, que procura atendimento de média e alta complexidade para casos de simples resolução. Diante dessas circunstâncias, o PSF surge como estratégia para reorganizar o atendimento do setor primário. Criado em 1994 no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), ele se estruturou melhor nos últimos anos e passou a apresentar resultados mais sólidos, tornando-se uma referência mundial de política de saúde. Enfrenta ainda, porém, vários problemas, que vão do vínculo empregatício precário dos profissionais às lacunas que estes têm na sua formação, passando pelas barreiras que a dura realidade social de boa parte da população brasileira impõe.

Equipe diversificada

Cada equipe do PSF atua numa área circunscrita - uma comunidade - e é responsável pelo atendimento de, no máximo, mil famílias (cerca de 4,5 mil pessoas). Os agentes comunitários de saúde são escolhidos entre os moradores e fazem a ponte entre os habitantes e os profissionais. Levam à equipe um "olhar de dentro" da realidade social e, na outra ponta, falam à população com sua linguagem. Para isso, primeiro, eles fazem um mapeamento completo do território. Passam de casa em casa para conhecer pessoas (e rever conhecidos), preenchendo formulários com informações que vão de doenças à freqüência de crianças na escola. Também registram valas de esgoto abertas, córregos e rios poluídos, locais de tráfego perigoso, pontos de prostituição, de tráfico e de consumo de drogas, centros de lazer, templos religiosos e tudo o mais que sirva para entender o perfil da comunidade.

A partir daí, fazem visitas mensais às famílias sob sua responsabilidade (entre 450 e 750 pessoas). Tudo o que influencie a saúde, de enfermidades a desemprego, deve ser comunicado à equipe, para que ela possa agir de modo a combater problemas - e não somente doenças - e valorizar a saúde coletiva. Aos moradores, o agente leva orientações sobre hábitos de higiene e alimentação, atividades e campanhas de prevenção e consultas marcadas com o médico da equipe ou especialista, além de verificar se os remédios estão sendo tomados corretamente.

O médico, um generalista, fica boa parte do tempo na sede, a UBS. Em alguns lugares, faz visitas domiciliares periodicamente; em outros, só quando necessário. Junto com o enfermeiro, sua função é tratar de doenças sem gravidade, como gripe, fazer o controle de moléstias crônicas, como hipertensão e diabetes, e encaminhar os casos indefinidos ou de maior complexidade para consultas e exames especializados. Exames mais simples, como o preventivo de colo do útero ou os de acompanhamento pré-natal, ocorrem na UBS.

Casos e estratégias de atuação são discutidos por toda a equipe em reuniões em geral semanais. Com a convivência, o "doutor", que costuma preceder o nome do médico, é às vezes deixado de lado pelos outros profissionais. A cooperação é essencial, embora nem sempre fácil - exige habilidade e flexibilidade para driblar as diferenças e se valer delas quanto a pontos de vista, formação e até classe socioeconômica. "Todos, inclusive o médico, têm de ‘pisar no barro’ e ter paixão pelo social", diz Daniel Almeida Gonçalves, médico do PSF em São Paulo.

Vínculos

A convivência diária com uma comunidade e um grupo de famílias específico gera proximidade e co-responsabilidade entre profissionais de saúde e moradores. Com isso, as chances de cura e promoção da saúde aumentam.

"O que é que eu tinha mesmo?", pergunta o aposentado Jorge Aparecido Batista, de 47 anos, a Fernando Mazzilli Vernacci, médico responsável por sua família em Cidade Tiradentes, bairro periférico de São Paulo. "Psoríase", responde o médico, sentado no sofá da casa de Jorge, durante uma visita de rotina. "Era esse nome feio?", indaga Jorge. Ele conta, brincando, que já tomou "o laboratório todo" em suas tentativas frustradas de cura. Mas foi somente ao se mudar para Cidade Tiradentes, em 2003, e ser atendido por uma equipe do PSF que viu as manchas que tanto o incomodavam começar a desaparecer. Primeiro, sua agente comunitária o convenceu a conversar com o médico, que, depois de alguns encontros, conseguiu descobrir uma forte raiz emocional no problema do aposentado, que estava sendo processado pela ex-mulher. Com alguns bons conselhos quanto ao seu estilo de vida e menos medicamentos do que havia tomado até então, Jorge viu a doença controlada. "Fiquei surpreso quando, tempos depois, fui ao posto e ele perguntou se meu rosto estava bom. Ele lembrava!", fala. "Eu realmente me sinto mais à vontade para falar com ele."

O vínculo é reforçado pela busca ativa de casos pela equipe, que acaba por descobrir não apenas doenças, mas problemas sociais que fazem parte das aflições cotidianas da população e afetam a saúde - como, por exemplo, a solidão. "Você sabe que conversando assim, recebendo as pessoas em casa, é uma saúde para a gente?", diz Conceição Albuquerque Albino, de 74 anos, moradora da Cancela Preta, bairro periférico do Rio de Janeiro. Mesmo sem sair muito de casa, devido a um problema na perna, ela se mostra alegre e falante - para o que as visitas da equipe contribuem. Sem elas, Conceição teria de gastar a pouca renda em táxis para fazer seus tratamentos.

O PSF também traz conquistas em alguns índices de saúde, cujos dados começam a ser pesquisados - como a queda de verminoses entre crianças, a redução das internações hospitalares (sobretudo ligadas a hipertensão e diabetes), e a melhora na convivência da comunidade com indivíduos com transtornos comportamentais. Esses avanços ajudam a concretizar uma nova concepção de saúde no Brasil - especialmente importante num contexto de falência do modelo vigente, em que predominam a tecnologia, os exames e as consultas rápidas e superficiais.

Iniciativas e problemas sociais

"A medicina precisa fazer mais sínteses - juntando desde Deus até o meio ambiente na busca por fatores determinantes da saúde", afirma o professor José Carlos Seixas, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). Segundo ele, muitos inconvenientes do atual sistema hegemônico de saúde decorrem de seu modelo predominantemente analítico, ou seja, com foco excessivo em destrinchar e fragmentar um assunto ou doença. O contato com a realidade local, como ocorre no PSF, já representaria um avanço, pois evita que o profissional se centre apenas no que apreende no consultório e o impede de concluir que "o que não chega até ele não interessa".

Fazer essa síntese significa pensar que "tudo o que implica qualidade de vida entra como ação de saúde", explica Maria Rizoneide Negreiros de Araújo, diretora do departamento de atenção básica da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Há diversas iniciativas possíveis: da reeducação alimentar por meio de hortas plantadas na comunidade, ou das ações de vigilância sanitária (em parceria com órgãos responsáveis pela limpeza e pelo controle de pragas), até os empreendimentos para melhorar o acesso da população a educação, profissionalização, cultura e lazer. Na comunidade quilombola de Cafundó, na área rural de Salto de Pirapora (SP), serviços básicos, como a passagem de um caminhão de coleta de lixo pelo local, foram obtidos desde que o PSF começou a atuar lá. Antes, os resíduos ficavam nas portas das casas. Na unidade do PSF do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro, aulas de alfabetização para adultos devem ser iniciadas no princípio deste ano.

"O programa não está na comunidade para resolver todos os seus problemas, mas para ajudá-la a se pensar coletivamente, descobrindo dificuldades, causas e soluções, em busca de uma crescente autonomia", ressalta a psicóloga social Neuza Maria de Fátima Guareschi. Em alguns lugares, o PSF está promovendo a formação de conselhos locais, para que os moradores debatam suas condições de vida. Na Cancela Preta, no Rio de Janeiro, por exemplo, as ações prioritárias da equipe de saúde são definidas com a comunidade.

Mas, apesar desses e de outros bons exemplos, ações intersetoriais continuam a ser um desafio. Quando o município não conta com uma rede de instituições e serviços sociais bem estruturada e acessível - o que inclui órgãos públicos, privados e do terceiro setor articulados - as propostas das equipes e comunidades podem ser frustradas ou nem sair do plano das discussões. "Na iniciativa privada, por exemplo, há pouca consciência de que lazer e emprego repercutem na saúde. O pensamento mais comum é: ‘Não temos a ver com saúde’", diz Maria Cristina de Paiva, coordenadora de atenção básica na região de Varginha (MG).

Nesse contexto, muitos profissionais do PSF acabam frustrados, não só por se sentirem incapazes de ajudar a resolver as dificuldades da comunidade à qual estão vinculados, mas porque essas carências andam na contramão de sua atuação, enfraquecendo-a. O desemprego - que pode gerar fome, conflitos familiares e depressão - é o problema mais freqüente. Outras situações, como condições desumanas de trabalho, também são um entrave. "O fisioterapeuta passou uns exercícios e me disse para interromper minha atividade de tempo em tempo, para não ter mais dor na coluna. Mas não dá, senão a gente não produz o suficiente para sobreviver", afirma Ismail Candido de Lima, que confecciona cestas de bambu em Baependi, durante mais de 12 horas por dia, com a ajuda dos filhos e da mulher. Revendido a preços baixos, o artesanato local precisa ser produzido em grande quantidade.

A questão não é só de sobrevivência. Noções como o "autocuidado" e a prevenção ainda são pouco valorizadas pela população, especialmente a de baixa renda. Quando atuam, ainda por cima, relações de poder, as ações do PSF podem ser totalmente freadas. Muitos trabalhadores rurais, por exemplo, dependem da moradia - freqüentemente precária - oferecida pelo proprietário da terra, que resiste a melhorá-la. O prejuízo, novamente, recai sobre a saúde.

Desafios à vista

A gestão do PSF está sob responsabilidade do município, que, muitas vezes, não oferece salários, contratos e instalações físicas adequadas para o trabalho da equipe. Parte da verba do programa vem do Ministério da Saúde - mas em geral essa parcela não chega a 30% do necessário. Na cidade de São Paulo, por exemplo, o custo de uma equipe é de cerca de R$ 29 mil por mês - incluindo os encargos sociais e o salário do médico, que recebe até R$ 6 mil. A média brasileira, de R$ 4 mil, varia regionalmente de R$ 1 mil a R$ 9 mil. Na outra ponta, há agentes comunitários que recebem menos de um salário mínimo - a média fica em R$ 400. A categoria é a mais atingida pela precariedade dos vínculos empregatícios - pesquisas indicam que em 70% das equipes os contratos são informais, temporários ou de prestação de serviços.

Nesse contexto, uma mudança de prefeito pode tirar muitos profissionais de seus cargos de uma hora para outra, devido a corte de gastos da gestão que está terminando ou de escolhas pessoais da nova administração. A contratação por concurso público ajudaria a solucionar o problema, por um lado. "Com plano de carreira e avaliação de desempenho, o funcionário se sente incentivado", diz Maria Rizoneide. Por outro lado, surgiria a dificuldade de tirar do cargo um funcionário público "acomodado" ou ruim. Enquanto a solução é debatida, a rotatividade de profissionais segue bastante alta, especialmente em localidades muito pequenas e distantes, ou muito violentas. Mais uma vez, o programa é prejudicado, pois trabalha com princípios que dependem do longo prazo, como o vínculo.

Há ainda situações em que a própria população não recebe bem o PSF, devido a uma cultura arraigada segundo a qual saúde equivale a ter acesso a remédios, hospitais, exames e médicos especializados. A dificuldade para reverter esse quadro aumenta quando se considera a força dos interesses de laboratórios farmacêuticos e, sobretudo, das indústrias de tecnologia. "As empresas de saúde do setor privado não trabalham com a atenção básica, porque ela não dá lucro rápido", afirma Maria Rizoneide. Há uma exceção: os planos de saúde, que já perceberam o potencial do modelo encabeçado pelo PSF e a possibilidade de ele reduzir custos com procedimentos complexos. Isso não significa que o programa pretenda eliminar os serviços de média e alta complexidade - eles são essenciais para sua continuidade. A resistência da população ao PSF cresce justamente quando seus profissionais não contam com uma boa rede para onde possam encaminhar casos mais complexos ou que suscitem dúvidas.

Educação como alicerce

O fato de a atenção à saúde no PSF ser básica não significa que seja simples. Saber conjugar fatores sociais, psicológicos e epidemiológicos em busca da melhor estratégia de recuperação, prevenção e promoção da saúde é tarefa complexa. Por isso, a formação dos profissionais é decisiva - antes e durante sua atuação.

"O médico é formado na maioria das vezes para ver a pneumonia, e não o indivíduo com pneumonia", afirma Ramiro Antero de Azevedo, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). "Seu conhecimento é construído de forma fragmentada", conclui. Além dessa transmissão segmentada do saber, feita segundo as especialidades (cardiologia, neurologia, ginecologia, etc.), a falta de estágios práticos em todos os serviços de saúde é outra lacuna da graduação, tanto em medicina como em enfermagem. Disciplinas de saúde coletiva, política em saúde e ciências humanas também são escassas, lembra Maria de Lourdes Cavalcanti, do Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "O médico se relaciona com pessoas, mas esse fato é pouco privilegiado na formação."

Como conseqüência, o profissional graduado pode não estar bem preparado para atuar como generalista. "Muitas vezes ele se forma tendo assistido a uma cirurgia neurológica, mas não sabe tratar uma micose", exemplifica Antero de Azevedo. E mesmo que saiba curar uma moléstia simples, na maioria das vezes não teve contato com a abrangência dos problemas sociais e psicológicos que afetam a saúde de um indivíduo - inclusive a dificuldade que a população mais desfavorecida tem de expressar sintomas, sensações e sentimentos.

Hoje, esse quadro está começando a mudar - na medicina e em outras áreas da saúde. Gabriela Pessoa Rodrigues, enfermeira do PSF em Salto de Pirapora, é formada pela Faculdade de Medicina de Marília (Famema), que usa métodos como a Aprendizagem Baseada em Problemas - em vez de aulas expositivas, os alunos se reúnem em pequenos grupos para discutir questões de saúde e buscar soluções, orientados por um tutor. Gabriela conta que teve contato com a prática do PSF desde o primeiro ano de graduação - quando ajudava o agente comunitário a cadastrar famílias. No último, já acompanhava uma equipe. "Acho que nem saberia mais sentar numa sala de aula tradicional", fala.

O problema no caso do médico é que, ainda hoje, o domínio de procedimentos de alta complexidade e da tecnologia de ponta é visto entre a maioria dos recém-formados como o único caminho para o sucesso profissional. A mudança passa, portanto, por tornar o mercado de trabalho atrativo para o generalista - daí a importância de uma política salarial no PSF.

De qualquer forma, optar pelo programa não é fácil. O contato constante com o paciente torna a realidade do trabalho mais imprevisível e cheia de riscos - inclusive o de errar - do que, por exemplo, a de quem lida com diagnóstico por imagens. Muitas vezes, é preciso reconhecer que a cooperação com o grupo de trabalho tem mais resultado que a simples aplicação do conhecimento técnico adquirido na faculdade. "Acaba sendo empolgante pelo impacto e pela diversidade da atuação", garante o médico Daniel Gonçalves. O entusiasmo não diminui seu cuidado com a formação: ele mesmo optou por uma das residências médicas em saúde da família e da comunidade hoje oferecidas em várias faculdades.

Para que o PSF sobreviva em longo prazo, outro investimento é importante: a capacitação permanente de todos os profissionais. Pólos de formação para os programas do SUS foram criados pelo Ministério da Saúde com esse fim, mas muitos funcionam parcialmente ou ainda nem saíram do papel - a falta de verba é o principal motivo. Para o médico, essa educação continuada é essencial para que se atualize sobre os protocolos de atendimento e diagnóstico das doenças. Sem conhecimento adequado, ele corre o risco de virar um "encaminhologista", como define Maria de Lourdes Cavalcanti, ou seja, mero marcador de consultas para especialistas da rede secundária e terciária.

O agente também precisa ser capacitado. Deve estar preparado, por exemplo, para entrar nas casas e lidar com situações variadas, sem preconceito, distinguindo quando manter sigilo absoluto ou repassar informações reveladas por moradores e equipe. A profissão foi regulamentada em 2003 e contará com um curso técnico, que está sendo articulado entre o Ministério da Saúde e as escolas técnicas estaduais. "É preciso valorizar esse trabalhador, melhorando sua formação", diz Maria Rizoneide. "Mas eles não podem ser capacitados em excesso", acrescenta Cristiane Herold de Jesus, enfermeira do Centro Escola Barra Funda, em São Paulo, "senão perdem o olhar de comunidade e vestem completamente a camisa dos profissionais de saúde."

Vida longa?

O PSF enfrenta hoje um paradoxo. Sua prática demonstra a necessidade de ajustes, avanços e incentivos para que sobreviva e se firme como alternativa ao modelo tradicional de saúde no Brasil. Apesar disso, seu modelo já se tornou referência - é um dos poucos defendidos por diversos partidos políticos. E os resultados alcançados mostram que é possível se aproximar do ideal: o acesso universal a um serviço de qualidade no qual a saúde seja vista como um sistema, cujo centro não precisa ser o hospital ou o médico, mas o próprio ser humano, responsável e autônomo. Foi o que percebeu Maria Ortiz, de 62 anos, após entrar para o grupo de hipertensos e diabéticos organizado pela equipe que a atende, num bairro rural de Salto de Pirapora: "Coisa gostosa, agora, só uma vez por semana", decidiu. A enfermeira do grupo ainda não sabe, mas Maria e seus colegas também começaram a trocar receitas de comidas saudáveis, na busca por mais qualidade de vida. "Já sofri muito. Quero viver mais um pouco e aproveitar."

 

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