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Medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos, Fernando Meligeni fala da aposentadoria e dos planos para o futuro

Depois de 24 anos colado na raquete e na bola, Fernando Meligeni, uma das maiores consagrações brasileiras nas quadras de tênis, anunciou sua aposentadoria. Sua última competição foi nos Jogos Pan-Americanos - que aconteceram em agosto deste ano na República Dominicana. Fininho, como é chamado pelos amigos, encerrou a carreira com o mesmo estilo que fez dele um dos nossos grandes. Bateu o chileno Marcelo Ríos na quadra e trouxe o ouro para a gente. Neste depoimento, ele nos conta como foi o começo, como está sendo o fim e o que espera do recomeço.

"Comecei no tênis aos 8 anos de idade, quando cheguei no Brasil. Era 1979 e meu pai, um fotógrafo profissional, veio trabalhar aqui, onde encontrou um paraíso de cores e paisagens. Ele achou o cenário ideal para suas lentes captarem, e eu encontrei meu país. Minha primeira escolinha se chamava Bola de Neve. Coincidência ou não, o fato é que as bolas foram companheiras por décadas, onde quer que eu estivesse. Foram, não, ainda são. Lá em casa, achávamos que quem levava jeito com as raquetes era a Paula, minha irmã. Ela leva, mas quem levou as raquetes para a profissão fui eu. Aos 15 anos, resolvi que queria morar na Argentina para aperfeiçoar meu jogo. O país passava por um bom momento nesse esporte e achei que treinar lá seria mais produtivo. Além disso, tinha o desafio de se virar sozinho que me instigava muito. Meu pai só deixou eu ir com a condição de que eu voltasse entre, pelo menos, os dez melhores da Argentina. Voltei como o melhor. Quando virei o número 1 de lá, resolvi que era hora de reaver o Brasil e virar brasileiro de vez."

O começo de novo
"Depois de 24 anos correndo o mundo com minha raquete na mão, chegou a hora de mudar o rumo dessa trajetória. Minha última competição foi nos Jogos Pan-Americanos que ocorreram neste ano na República Dominicana, de onde voltei com o ouro. Apesar de ter encerrado minha participação nos campeonatos, minha vida ainda continua muito corrida. Tenho muitos projetos em andamento e continuo a fazer muitas exibições de tênis pelas mais diversas cidades do Brasil. Outro dia, por exemplo, fui fazer uma lá em Araçatuba, no interior de São Paulo. Estou passando por aquela fase em que geralmente nos preparamos a vida inteira para chegar, que é a aposentadoria da profissão. Tenho só 32 anos e, para mim, ela já chegou. Dava para jogar mais, mas achei que essa era a hora de parar. Meu corpo pediu e minha cabeça também. As pessoas dizem que ainda seria cedo para parar, mas só quem viaja nove meses por ano sabe a loucura que é ficar nessa rotina. Estava precisando parar, ficar mais tempo em casa. Já tinha conseguido os objetivos que havia traçado e agora pretendo alcançar outros. Tenho um enorme orgulho de ter sido o melhor jogador de tênis do Brasil durante um período, de alcançar a 25ª posição em 1999 e de ter conseguido todos os títulos que já consegui. Encerrar carreira nos Pan-Americanos deste ano foi uma das minhas grandes conquistas e, realmente, eu não esperava. Fiz o possível para representar o País da melhor maneira possível e saiu melhor do que eu esperava. Não só eu, mas muitos atletas brasileiros fizeram bonito na República Dominicana, o que prova o quanto temos potencial para conseguirmos excelência nos esportes. É muito bom ver as mais diferentes modalidades, como o judô e a vela, trazendo o ouro para casa."

Mudança
"Falaram muito que eu iria sofrer com essa mudança radical. De fato, é triste perder o dia-a-dia na quadra de tênis. Também não vou ter mais a emoção de pisar numa quadra para jogar a Copa Davis ou os Jogos Pan-Americanos. Essas são grandes perdas. Mas eu estou curtindo as novidades que essa fase me traz, como ter um final de semana tranqüilo ou conviver mais próximo dos amigos e da família. Há também os novos desafios, e para mim a sensação de ter que encarar novas 'quadras' é sempre muito boa. E vencer em outras atividades, além do tênis, também deve ter um gosto muito bom. Quero ajudar o tênis juvenil e tenho alguns projetos que estão começando a sair do papel. Um deles, inclusive, já saiu. É a 1ª Copa Fino (desde criança, o apelido de Meligeni é Fininho), que reunirá jogadores de 10 a 18 anos e deve acontecer em dezembro aqui mesmo em São Paulo, que é a cidade onde vivo. Novos parceiros estão chegando aos poucos para os projetos. Pretendo ajudar o tênis juvenil e também promover melhoria na estrutura desse esporte, para que quem comece nele não tenha que abandoná-lo em detrimento de outra carreira. Por isso, é importante o incentivo nessa fase que ocupa a via entre o amador e o profissional. Para o ano que vem pretendo alargar ainda mais o potencial do esporte e capitanear um grande projeto que abarque desde o juvenil até o profissional, além de trabalhar para que o tênis possa servir como instrumento que colabore para a melhoria da nossa situação social. Todos que quiserem ajudar a construir uma melhor base para essa modalidade no Brasil estão mais do que convidados. Preciso de gente que, como eu, preze trabalhar com alegria e tenha vontade de empreender novos projetos. A idéia é dar o máximo de informação e competitividade aos atletas para que o País tenha muitos Gugas, Meligenis e Jaime Oncins em seu futuro. Sempre tive um carinho muito grande pelas crianças e adolescentes e sinto um grande respeito dessa meninada por mim. É uma via de mão dupla que tem tudo para dar certo. Há pouca gente trabalhando a base do tênis brasileiro. Há muito investimento em quem está no top, mas esquecem que, para termos gente lá em cima, precisamos começar a subir a escada. Apesar do tênis ter se tornado mais popular nessa última década, ainda é muito difícil engatar uma carreira, porque há pouco investimento na molecada, os patrocínios são esporádicos e acaba que os pais assumem este papel, como os meus fizeram até eu completar 21 anos e conseguir um patrocínio da Rainha. É importante também divulgar informações sobre o tênis para que todos saibam como seguir no esporte. Temos tudo para melhorar a maneira como encaramos o esporte, que tem um grande potencial social, além de trazer muita alegria ao nosso povo. Portanto, não há razão para tão pouco investimento."