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Esportes
A democratização do tênis
O esporte é democrático em sua essência. Inúmeras modalidades nasce-ram por meio da elite e se popularizaram entre as pessoas menos privilegiadas. Atravessan-do oceanos, hoje fazem parte do cotidiano de toda a sociedade, como é o caso do futebol, criado pela elite inglesa e hoje conhecido em quase todo o mundo, ou da sinuca ou bilhar, proveniente dos salons franceses e atualmente encontrada em meio às mesas dos tradicionais botequins espalhados por todo o Brasil.
A atividade física proporcionada pelo esporte é, teoricamente, acessível a qualquer pessoa. Mas o que se observa hoje nas grandes cidades é um processo que vai diretamente contra estes princípios básicos. Muitos esportes vem se restringindo apenas a quem possui condições financeiras ou sociais de praticá-los.
O país do futebol vem perdendo espaços públicos para os esportes nas grandes cidades. Os campos de várzea, tão comuns no passado e responsáveis pela formação e o aparecimento de grandes craques da preferência esportiva nacional, simplesmente estão em pleno desaparecimento. Se o esporte mais popular do Brasil vem perdendo espaço, outras modalidades, como a natação e o tênis, são acessíveis praticamente apenas a pessoas que podem frequentar clubes ou a quem tem possibilidade de ingressar em uma academia.
Em um país onde o investimento na educação pública não é medida prioritária da maioria dos governos, o desporto é praticamente ignorado. Os escassos centros esportivos, quando não estão fadados ao abandono, são insuficientes para atender à população. Fato inconcebível para uma nação que a pouco tempo pretendeu abrigar uma Olimpíada.
Sensível ao problema da democratização do esporte, o Sesc sempre buscou dar a possibilidade da experiência, das mais diversas modalidades esportivas, ao maior número possível de pessoas. A filosofia adotada não leva em conta a alta performance dos competidores ou tem como objetivo formar campeões. O mais importante é estabelecer o contato inicial e o aprendizado através da vivência do esporte. A partir deste ponto o participante toma conhecimento da modalidade e passa, por conta própria, a desenvolver um conhecimento mais profundo da atividade.
Parceria para a democratização
Um exemplo prático desta forma de trabalho é a parceria entre o Sesc e a ATP Tour, órgão máximo do tênis mundial. A ATP é uma sociedade de tenistas sem fins lucrativos, organizadora dos maiores eventos de tênis do planeta, que tem como principal meta a difusão do tênis. No Brasil este esporte possui tradicionalmente o estigma de ser praticado apenas pela elite. São raras as quadras públicas desta modalidade à disposição do público geral.
Com o intuito de popularizar e democratizar o esporte no país, a parceria Sesc - ATP Tour promoveu o Seminário Internacional de Tênis, realizado nos dias 19, 20 e 21 de maio no Auditório do Sesc Paulista. No encontro foram apresentados e discutidos caminhos de incentivo a prática esportiva, formas de democratização, a importância do marketing e da mídia no processo de difusão não só do tênis, como do esporte em geral, por importantes dirigentes esportivos, jornalistas, professores, tenistas, técnicos, convidados internacionais e o público. Alguns projetos pioneiros foram apresentados em workshops, como o Pee-wee, um programa de iniciação para crianças de 4 a 5 anos desenvolvido por Wilton Carvalho, formador de tenistas. "O esporte é adaptado para que as crianças possam praticá-lo desde cedo. As dimensões da rede, quadra, raquete e bola são menores, e o material é fornecido pelo professor. Dessa maneira, o aluno não se preocupa com o material e a prática pode ser levada a escolas, praças públicas e estacionamentos" diz Wilton. "Hoje é possível encontrar raquetes a preços acessíveis. O problema reside na falta de quadras públicas de tênis, o que impossibilita a prática de quem não frequenta clubes", completa.
Formas de popularização
A difusão do esporte é ponto fundamental para que o investimento seja feito, tanto por parte do poder público quanto da iniciativa privada. Nos últimos anos os investimentos em torneios no país desapareceram em quase sua totalidade. Resultado: o Brasil foi obrigado a ceder suas datas a outros países sulamericanos, não possui um torneio de renome e seus bons tenistas - apesar de não figurarem entre os melhores do mundo - perderam espaço dentro de seu próprio país. "É fundamental que haja um ídolo, entre os melhores do mundo, como um impulso para a difusão do esporte. Os iniciantes precisam de alguém para se espelhar" diz Eduardo Menga, Diretor da ATP Tour para a América Latina. "No Chile, o fenômeno Marcelo Ríos, um tenista carismático, elevou o tênis a preferência esportiva nacional. A federação chilena aproveitou o momento de popularização do esporte, criando a estrutura necessária", completa. Eduardo afirma que nos outros países da América Latina existe uma política diferenciada em relação ao tênis. "Os torneios são mais valorizados, com maior divulgação e com maior preocupação por parte dos governos, pois são considerados eventos nacionais de importância, e é claro, que geram lucros". O abandono dos torneios faz com que o Brasil tenha que recomeçar todo o caminho do esporte no país.
A ATP dá uma grande contribuição à retomada do crescimento do esporte no país com a prioridade para o trabalho de base com as crianças, popularizando o tênis. Um dos projetos é a associação com o canal de desenhos animados Cartoon Network, onde personagens populares como Scooby-Doo dão aulas de tênis para as crianças. Em apenas um dia mais de mil crianças participaram do evento. O Sesc também faz sua parte através de projetos inovadores. "A nossa unidade procura dar espaço para um público sócio-economicamente destituído do tênis, através do aluguel de quadras a preços acessíveis e de iniciativas como a do projeto Tênis em Ação", diz Maria Luiza Souza Dias, gerente do Tenisesc. Este projeto consiste em levar o tênis até o praticante, montando quadras em escolas, supermercados, lanchonetes e estacionamentos. A didática é simplificada para que o aluno obtenha seus primeiros resultados rapidamente. Neste caso, para o aluno, o mais importante é que a sua bola passe da rede, um resultado imediato, como um estímulo para que depois ele possa se aprofundar no esporte. Neste projeto a vivência e a experimentação do tênis são os pontos fundamentais. Mas apesar de iniciativas como estas, o trabalho ainda está no começo.
O Seminário Internacional de Tênis é um dos primeiros passos para que se apontem os caminhos e soluções para o tênis e o esporte em geral no país. "Esperamos que com o seminário sejam traçados alguns novos caminhos para o tênis do Brasil", afirma Maria Luiza. O trabalho realizado por instituições como a ATP Tour e o Sesc são possibilidades que já estão sendo realizadas em prol da democratização do esporte no país. Mas é necessário que toda a sociedade sensibilize-se em torno deste crescente processo, que mais uma vez marginaliza a parte da população menos privilegiada economicamente. Wilton Carvalho sintetiza a medida mais necessária. "Sem a participação da sociedade como um todo, não há solução para este problema. Projetos como o que nós realizamos deveriam ser feitos e estendidos a todos pelas mãos do poder público e pelas federações desportivas do Brasil. Enquanto esses setores não estiverem realmente engajados, a democratização do esporte estará ameaçada".