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O excêntrico Avner
Avner Eisenberg é, sem dúvida, um dos maiores palhaços de todos os tempos.
Em 2015, o americano esteve no Brasil para a segunda edição do CIRCOS - Festival Internacional Sesc de Circo. Agora, ele retorna com o espetáculo Exceções à Gravidade, para duas apresentações no Sesc Pompeia - depois de ter passado, também neste ano, por Campinas, Jundaí e Santos.
Aproveitamos a ocasião da visita anterior, e pedimos para que Pedro de Freitas, produtor cultural, fizesse uma entrevista por e-mail com o artista.
Pedro: Em sua biografia, você menciona que foi químico especialista em biologia antes de ser palhaço. O que deu de errado nesse percurso que o tirou de um caminho promissor?
Avner: No ensino médio eu era um nerd de matemática e ciência. Minha graduação, quando estava na faculdade, era biologia e química, e eu achei que trabalharia com animais, talvez como veterinários de animais selvagens. Cobras eram um interesse especial.
Quando fui pego por uma tempestade, o prédio no qual me abriguei acabou sendo o de teatro. Eu encontrei um amigo que estava fazendo um teste para uma peça, então acompanhei ele e acabei conseguindo o papel. A peça era Machiavelli and the Mandrake, uma versão de Mandrágora por Machavelli. Está sendo um maravilhoso “escorregão” desde então.
Pedro: Você vem de uma região dos Estados Unidos tradicionalmente conservadora (Atlanta). Como surgiu o interesse em fazer algo tão inusitado, como ser palhaço?
Avner: Quando criança, aprendi malabares em um circuito de artes de verão. Pratiquei ginástica e mergulho no ensino médio, além de salto na equipe de atletismo. Mais tarde, comecei a estudar truques de mágica e, mais recentemente, me tornei um hipnoterapeuta certificado. Todas essas disciplinas são as fontes para os números no meu show. Eu penso na estrutura do meu show de forma lógica, quase matemática, enfatizando a importância dos esclarecimentos das causas e efeitos. Durante meu primeiro ano de Universidade, eu vi Marceau Marceau e fui cativado pelos números de ilusionismo. Eu comecei a desenvolver alguns de minha autoria, mas incorporando a mágica, malabares, teatro de fantoches e acrobacias nas primeiras performances. A certa altura, eu estava deixando a barba crescer para uma produção universitária de Oedipus Rex (Édipo Rei) e a maquiagem branca tradicional da mímica não combinava com minha barba, então eu pesquisei tipos de clown e descobri o tramp clown, tipo que ficou famoso pelo trabalho de Emmett Kelly. Minhas primeiras iniciativas dentro do Clown usavam a maquiagem de tramp clown.
Pedro: Como foi que seus pais o “forçaram” a ser artista? Qual foi a participação da sua família em sua escolha profissional?
Avner: Era para ser entendido como uma piada. Eles sempre me apoiaram.
Pedro: Nos anos 70, você foi preso em Paris por “cometer” bufonaria em público. Como isso aconteceu? Por que a bufonaria era considerada crime? Ainda é?
Avner: Em 1972, um amigo e eu montamos um pequeno show de rua enquanto estudávamos na Lecoq School of Gestural Theater (Escola Lecoq de Movimentação Teatral) em Paris. Era um belo dia de primavera e nós fomos à fonte abaixo do Palais de Chaillot para performar e passar o chapéu. De repente, nós fomos cercados pela polícia e empurrados para a viatura enquanto a plateia gritava “Não, não, não!”
Ficamos detidos por várias horas e, eventualmente, liberados com uma citação nos acusando de “Bufonaria em Público”. Com esse incentivo oficial, continuei a minha jornada.
Pedro: Por que você decidiu partir para o encontro com Jaques Lecoq? Como essa experiência mudou o entendimento que você já tinha do que é ser palhaço?
Avner: Eu me formei em Teatro. Eu estava interessado em continuar minha carreira em mímica, e inicialmente gostaria de estudar com Marceau em Paris, mas não consegui achar seu endereço. Eu tinha visto uma palestra/demonstração de Jacques Lecoq em Nova York, onde estudei técnica de teatro e design por um ano. Então, eu me candidatei e fui aceito em um processo de 3 meses de teste com a intenção de me concentrar em mímica. Clown era só um curso de um mês na escola. Eu fui pego por isso e incorporei todas as minhas habilidades performáticas que eu vinha aprimorando. Eu mantive a mímica por longos anos, mas eventualmente parei de fazê-la em favor do show.
Pedro: Como foi lecionar na Dell’Art School em plenos anos 70, enquanto o mundo vivia o movimento da contracultura, justamente surgido na Califórnia? O que significava ser palhaço nesse contexto?
Avner: Eu nunca me identifiquei enquanto Clown. Eu tinha retornado recentemente de meus estudos na França e estava explorando possíveis formatos para show solo enquanto lecionava. Foi nesse período, apesar de não saber naquele tempo, que comecei a minha pesquisa sobre a relação entre performer e plateia.
Pedro: O espetáculo “Exceções à gravidade” estreou em 1984 e desde então segue se apresentando por todo o mundo. Como é fazer um espetáculo por tanto tempo? O que te motiva a fazer o mesmo espetáculo?
Avner: O show pode ser assistido como uma série de problemas para resolver. A chave para isso é ser interessado, não interessante.
Pedro: Sua participação no CIRCOS – Festival Internacional Sesc de Circo em 2015 foi rápida e avassaladora: ingressos esgotados em tempo recorde, alta procura para participar do seu workshop e o webdocumentário produzido com você é o vídeo mais acessado do festival. A que credita essa empatia do público brasileiro com seu trabalho?
Avner: Eu estou muito feliz e grato por isso, e não tenho ideia do porquê disso acontecer.
Pedro: Como é voltar para o Brasil depois da experiência de participar do Festival CIRCOS?
Avner: Eu estarei aí em duas semanas. Depois disso, te conto.
Pedro: O que você reconhece como uma caracterrísticaa ou estilo do palhaço brasileiro?
Avner: Num famoso caso, a Suprema Corte dos Estados Unidos disse “Eu não consigo definir pornografia, mas reconheço quando vejo”. Clown é isso, não é possível definir, mas completamente reconhecível quando se vê.
Assista ao Webdocumentário que mostra como a expressão corporal e o bom humor de Avner cativaram a plateia do último CIRCOS – Festival Internacional Sesc de Circo, onde a obra foi gravada: