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Retrato de uma lenta caminhada

Foto: Reprodução
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Por: HERBERT CARVALHO

Os 25 anos transcorridos entre 1988 e 2013 configuram um período de grandes transformações no Brasil e no mundo. Na esfera das relações internacionais ocorreram durante esse tempo alguns acontecimentos marcantes: o colapso da União Soviética e a queda do Muro de Berlim; a vertiginosa ascensão da China; o surgimento e a consolidação de megablocos como a União Europeia, o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta) e o Mercado Comum do Sul (Mercosul); a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC) e a configuração do G20 (grupo integrado pelos ministros de finanças e chefes dos bancos centrais das 19 maiores economias do mundo e a União Europeia); a desregulamentação dos mercados e a eclosão da mais grave crise financeira desde a Grande Depressão da década de 1930.

No Brasil, no plano político, essa quadra representou a retomada da vida democrática plena com a promulgação da Constituição de 1988, a volta da eleição direta para presidente da República e o traumático impeachment de um governante eleito desse modo. Conseguimos a estabilidade da economia com o Plano Real e a incorporação de milhões de brasileiros aos mercados de trabalho e de consumo, ampliando a classe média. Apesar desses avanços, milhões de pessoas saíram às ruas em junho de 2013 para expressar sua insatisfação com o desperdício de recursos e a precariedade dos serviços públicos nos diferentes níveis.

Como observador atento dos cenários interno e externo, o empresário Abram Szajman acompanhou no dia a dia a evolução desses eventos com o propósito de interpretar seus significados mais profundos, desdobramentos e consequências em especial para o segmento econômico e social que ele representa como presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio SP) e dos Conselhos Regionais do Serviço Social do Comércio (Sesc) e do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac).

Suas reflexões – amplamente amparadas na experiência de líder empresarial responsável por um setor da economia que, em sua dimensão paulista, mobiliza mais de 1,8 milhão de atividades empresariais de todos os portes, responde por cerca de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e gera em torno de 5 milhões de empregos – foram publicadas ao longo desse tempo nos mais importantes meios de comunicação impressos do país, como os jornais “Folha de S. Paulo”, “O Estado de S. Paulo”, “O Globo” e “Valor Econômico”.

“Perseverar na cobrança”

Esses textos, entre os quais alguns divulgados originalmente aqui mesmo nas páginas de Problemas Brasileiros, foram agora reunidos em livro intitulado A Lenta Modernização, retrato paradoxal do país que avança exibindo relevantes conquistas, ao mesmo tempo em que convive com mazelas e distorções históricas ainda não corrigidas. “Ainda que soe fastidiosa, a insistente cobrança de medidas indispensáveis para a superação de velhos problemas brasileiros continua sendo necessária. Se as reformas não são feitas mesmo sendo cobradas com veemência por empresários, parte da classe política, acadêmicos e cidadãos em geral, muito mais tardarão se nada for dito. Daí a importância de perseverar na sua cobrança”, explica o autor na apresentação da obra.

A maior parte dos 106 artigos – agrupados em doze eixos temáticos com um texto introdutório para cada um – foi escrita e publicada entre os anos de 2003 e 2013. Representam, assim, uma continuidade de volume anterior com artigos de períodos precedentes, publicado em 2005 pela editora Átomo sob o título Aberto para Balanço.

Aos textos produzidos na década passada e na atual somaram-se outros recuperados das edições de Problemas Brasileiros entre 1988 e 2005. “Capitalismo Moderno”, o mais antigo deles, publicado em maio/junho de 1988, permanece atual, ao identificar os adversários da economia de mercado como “detentores de privilégios inaceitáveis, oportunistas e aproveitadores de toda ordem, que não são capitalistas nem sindicalistas modernos, mas parasitas que sugam o sangue da nação”.

Os grandes temas em que se divide a obra são os seguintes: 1 – O cidadão e o Estado; 2 – Vida moderna; 3 – Sesc/Senac; 4 – Economia moderna, empresa moderna; 5 – Relações de trabalho; 6 – A economia e o Estado; 7 – Reformas, ainda que tardias; 8 – Necessidades antigas e novas; 9 – Lições do passado; 10 – O empreendedor e seu papel transformador; 11 – A crise global e seus efeitos; 12 – O Brasil e o mundo em mudança.

No primeiro deles, o que se destaca é a contradição entre um Estado que interfere tanto na vida das pessoas que parece pretender controlar os atos da esfera privada. Mas esse mesmo Estado continua ausente em áreas nas quais sua ação é indispensável, como saúde, educação e segurança. Já os artigos sobre a vida moderna focam, sobretudo, as questões de mobilidade urbana e qualidade de vida numa metrópole como São Paulo.

É nas questões econômicas e suas implicações nas atividades empresariais, porém, que se concentram a maior parte das análises sobre as causas estruturais do nosso atraso, como as deficiências de infraestrutura, o excesso de burocracia, a elevada carga tributária e a rigidez da legislação trabalhista, que se arrastam por décadas sem solução. Nessa seara, alguns títulos de artigos resumem os problemas, ao mesmo tempo em que denunciam a procrastinação das reformas capazes de resolvê-los: Governo rico, povo pobre; Basta de burocracia; Impostos demais; Tirania fiscal; Leis que favorecem o desemprego; Por um novo modelo previdenciário; Por um novo pacto federativo; Reforma tributária é a saída para a crise.

Novos paradigmas

No texto que leva por título mais uma cobrança – “E as Reformas?” – Szajman comenta a falta de apetite dos parlamentares para votar questões polêmicas às vésperas das eleições: “Se as reformas imprescindíveis para o país não forem desvinculadas dos anos eleitorais, jamais nos livraremos do gerúndio, com as reformas sendo propostas, sendo analisadas, sendo elogiadas ou criticadas, e nunca concretizadas”.

Sobre a crise financeira global e os caminhos para superá-la, o empresário menciona a substituição do G7 (grupo formado pela Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido) pelo G20 e as novas formas de governança do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI) como os instrumentos necessários para que a globalização deixe de ser “um jogo de cartas marcadas”. E adverte: “A democracia nunca servirá como moldura de um sistema econômico baseado em lucro a qualquer preço. Nos Estados Unidos, na Europa ou no Brasil, governantes e parlamentares precisam parar de agir movidos por interesses pessoais, eleitorais ou corporativos. O atual estágio de desenvolvimento da sociedade humana exige a construção de novos paradigmas, tanto na economia, como na política”.

A inserção do Brasil na economia mundial é vista como um dilema: “Ou nos inserimos adequadamente na arena internacional, como um objetivo da nação, escolhendo modelos, aliados e parceiros, ou estaremos condenados a exportar produtos primários, a comprar produtos industrializados e a copiar modismos, eternizando nosso atraso e dependência”.

No último texto pela ordem cronológica – “Longa Caminhada para a Liberdade” –, publicado no jornal “Folha de S. Paulo”, em 24 de dezembro de 2013, Szajman se vale da vida e da luta de Nelson Mandela para perguntar: o que foi feito dos sonhos de Zumbi dos Palmares, Tiradentes e José Bonifácio? “Aqui, infelizmente, prevalece a máxima celebrizada pelo escritor italiano Giuseppe Tomasi de Lampedusa: ‘algumas coisas mudam para que tudo continue como sempre foi’”, é como o autor responde à própria pergunta, detalhando a essência de seu pensamento: “É impressionante a permanência, entre nós, de ilhas de modernidade em meio a um oceano de arcaísmos. Edifícios luxuosos ao lado de favelas. O orgulho de uma Embraer e a vergonha da rede de esgotos não chegar a quase metade dos domicílios”.

Engana-se, porém, quem achar que a crítica é acompanhada por pessimismo ou imobilismo. Szajman conclama a coletividade a exercer o protagonismo da cidadania: “Não haverá promoção social sem que as pessoas aprendam a lutar pelo que desejam. O assistencialismo é uma forma disfarçada de escravismo”. E conclui que, na falta de estadistas como Mandela, “teremos que contar com nós mesmos e nossa força de sociedade organizada se quisermos, como ele, um desenvolvimento lastreado em igualdade, diversidade, participação, solidariedade e liberdade”.

 


 

Estante

Depoimentos de um educador

Paulo Nathanael Pereira de Souza tem uma larga vivência na educação brasileira. Essa rica experiência está registrada no perfil biográfico Relógio do Tempo, realizado por Yvonne Capuano e publicado pela Miró Editorial. A autora, baseada em depoimentos do próprio biografado, resgata passagens pitorescas e significativas da vida do educador e gestor, idealista e “dedicado à prática do bem e à construção do futuro”. Entre seus múltiplos talentos destaca a oratória, sempre elegante, clara e objetiva.

Viagens do imperador

Dom Pedro II era uma pessoa erudita, com grande interesse por inovações. Suas viagens ao exterior tinham como objetivo ampliar esses conhecimentos e Dom Pedro II na Alemanha, escrito por Dom Carlos Tasso de Saxe-Coburgo e Bragança, publicação da editora Senac São Paulo, revela algumas dessas aventuras intelectuais do imperador pela Europa, onde chegou a impressionar grandes sábios tanto por sua erudição como pela simplicidade com que se apresentava. Grande parte dos fatos aqui narrados são inéditos, revelando detalhes imperdíveis da vida de nosso último imperador.

Lições cenográficas

Com Cenografia Brasileira, José Carlos Serroni, cenógrafo reconhecido por suas participações na paisagem teatral brasileira, se propôs a traçar a história dessa arte no país. Editada pelo Sesc de São Paulo, a obra apresenta ainda “princípios, conselhos e cuidados” relativos ao assunto e a biografia de alguns profissionais de destaque na área.