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Em busca de um futuro melhor

por Mauricio Monteiro Filho

“Nunca tinha lido uma revista inteira antes”, diz Ataíde de Souza, um paulista de 53 anos que não esconde a surpresa e a admiração diante da novidade que segura nas mãos. “Gostei das histórias que relatam como a comunidade mudou o próprio bairro. Achava que este mundo não tinha mais jeito, mas começo a mudar de ideia.” O motivo do entusiasmo de Ataíde é a revista “Por Exemplo”, uma proposta editorial que ganhou vida pelas mãos da Editora Mol e do Instituto Grupo Pão de Açúcar (IGPA) e que tem em mira alavancar um projeto social ousado, que beneficie organizações dedicadas à questão educacional em todo o Brasil. A revista é bem clara quanto a isso. Em sua edição inaugural, lê-se: “Este é o primeiro exemplar de uma publicação que quer mudar a educação no país”.

A linha da “Por Exemplo” prima pela abordagem de pessoas comuns, que podem ser um vizinho, amigo ou familiar. Explica-se: a publicação pretende levar os leitores a tomar ciência de que fazer a diferença no mundo é algo mais simples e realizável do que possa parecer. É o tipo de mudança de atitude ilustrada pela reação do leitor Ataíde de Souza. “Não costumo comprar revistas e muito menos ajudar entidades. Mas quando vi a ‘Por Exemplo’ fiquei curioso.” Ele comenta que a pergunta estampada na capa – “Qual é o seu sonho?” – despertou sua atenção. “O meu é ver um país melhor, com pessoas que trabalham duro para conquistar as coisas. E foi exatamente o que encontrei nas páginas da revista”, ele escreveu para a redação.

Esse princípio – mobilizar por meio de relatos pessoais – esteve presente desde a concepção do projeto, que levou mais de um ano para ser posto em prática. “Nosso plano, elaborado junto com a equipe da Editora MOL, é mostrar exemplos de como se pode educar por meio de narrativas de gente comum”, relata Fernanda Cruz, coordenadora do IGPA. Ela sugere que qualquer pessoa pode inspirar-se nos casos apresentados, “pois eles são palpáveis”, diz.

Não há como não se sensibilizar, por exemplo, com a história do comerciante Luiz Amorim. Com 38 anos de profissão e dono de um açougue em Brasília, ele disponibiliza à clientela um serviço que o torna diferente em seu ramo de atividade: uma biblioteca com cerca de 5 mil títulos. Tudo começou com uma dezena de livros, que ele emprestava aos fregueses interessados. A iniciativa deu tão certo que, com o apoio do governo, instalou estantes nos pontos de ônibus da capital do país. Qualquer um pode levar os livros para casa, e isso está sendo possível porque 95% dos títulos emprestados são devolvidos.

Histórias como essa, nascidas de ideias simples, levadas a cabo com perseverança e que trazem impactos positivos, são o combustível do projeto editorial da “Por Exemplo”. São, também, a explicação de seu sucesso entre os leitores. Com apenas três edições, ela já conta com inúmeros fãs de carteirinha, que povoam o site e o canal da revista no Facebook com mensagens emocionadas e de agradecimento. “Notei que cada detalhe é feito com amor”, escreveu o leitor Flávio Henrique. “Fiquei encantado com os exemplos descritos ali. O normal é ver celebridades sendo prestigiadas por suas boas ações, mas, de repente, aparece um órgão da imprensa que mostra o que o meu vizinho está fazendo por um mundo melhor.” Henrique prometeu que em breve enviará algumas histórias suas para que sejam publicadas. Outra leitora, Daniele Motta, afirmou que adorou até agora todas as narrativas. “Além de contá-las, vocês mostram o caminho para cada um contribuir à sua maneira”, ela frisou.

O projeto

Desse sucesso de público depende o efeito mais profundo da iniciativa. E o resultado social é uma função direta de sua circulação. Isso se dá por meio de um tipo de negócio tão interessante quanto ousado. “É um modelo de revista em que um número de patrocinadores banca o projeto, anualmente, para que não dependamos do mercado comercial. Esse investimento é transformado num veículo de qualidade, com preço de capa baixo, e todo o dinheiro arrecadado é doado a instituições que atuam na área da educação”, explica Rodrigo Pipponzi, diretor executivo da Editora MOL.

As publicações geradas segundo esse modelo dependem sempre de uma tríade virtuosa: um braço no varejo, um pool de patrocinadores cotistas e organizações beneficiadas que são previamente selecionadas. São os cotistas que arcam com os custos de produção da revista – equipe editorial, gráfica, entre outros –, enquanto o varejo se encarrega das vendas, que irão abastecer o caixa das organizações.

No caso da “Por Exemplo” são, por ora, dois os patrocinadores, as empresas Kraft Foods e Procter & Gamble (ainda há quatro cotas de patrocínio em aberto). Segundo o site da revista “Sorria”, distribuída pela Droga Raia e que nasceu com os mesmos objetivos da “Por Exemplo”, o investimento nesse tipo de ação é um jogo de ganha-ganha, bom para todas as partes envolvidas: terceiro setor, empresas e varejo.

Para os cotistas, o atrativo é um investimento social com retorno garantido em mídia. E, claro, a oportunidade de reforçar suas ações de responsabilidade. De acordo com Stephanie Humpert, gerente de marketing da Procter & Gamble (P&G), uma das missões centrais da empresa é melhorar a vida de crianças com idade entre 0 a 13 anos. “A P&G acredita que a educação é um dos principais fatores que contribuem para seu desenvolvimento”, diz. Ela comenta que a parceria com a revista “Por Exemplo” é uma nova oportunidade para que o apoio da companhia chegue a um número ainda maior de crianças, através das doações geradas. “A P&G também vê a revista como uma importante ferramenta para mostrar como pequenas atitudes que visam incentivar a educação dentro da própria comunidade podem fazer diferença”, sintetiza.

A revista “Sorria”, no mercado desde 2008, é na realidade uma outra experiência bem-sucedida da Editora MOL, em parceria com a Droga Raia, que se apresenta como a segunda maior cadeia de farmácias do país. A revista é vendida exclusivamente nas mais de 400 lojas do grupo espalhadas por Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Descontados os impostos, os R$ 2,95 arrecadados com a venda unitária dos exemplares são atualmente direcionados a duas instituições, o Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer (Graacc) e o Instituto Ayrton Senna, voltado para projetos de educação.

O mais interessante é que a verba arrecadada com a venda literalmente multiplica o investimento dos patrocinadores. No exemplo da “Sorria”, que já está na 25ª edição, para cada R$ 1 aportado pelos cotistas, em média R$ 1,50 foi repassado às organizações beneficiadas. Ou seja, é mais vantajoso para as empresas ajudar as instituições por meio da revista do que diretamente. Por isso, em seus exatos quatro anos de existência, a publicação viabilizou uma arrecadação milionária aos cofres de entidades que fazem o bem. Até o fechamento desta edição, o contador no site da “Sorria” marcava a fabulosa cifra de R$ 7.595.679,63.

Tiragem

Isso, porém, não é tudo. Como se não bastassem os valores expressivos mobilizados, a revista da Droga Raia é um caso de sucesso como veículo informativo. Auditada pelo Instituto Verificador de Circulação (IVC), a publicação tem uma das maiores tiragens do mercado editorial, com 160 mil exemplares bimestrais, e o menor encalhe (em torno de 1%), graças à inteligência do varejo. Ela também se tornou uma das dez publicações mais vendidas de forma avulsa no país, sempre segundo o IVC. Consta que, até a 23ª edição, haviam sido comercializados mais de 3,1 milhões de exemplares. Esses resultados valeram algumas láureas, como a de Lançamento do Ano em Mídia Impressa e Digital, da Associação Nacional de Editores de Publicações (Anatec), e o ouro nacional na categoria mídia do tradicional prêmio da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje), além do 1º Prêmio Fecomercio de Sustentabilidade.

Se a Droga Raia é a interface varejista da “Sorria”, no caso da “Por Exemplo” esse papel cabe à rede de supermercados e drogarias Extra, do Grupo Pão de Açúcar. Isso significa que a nova revista social tem boas chances de mobilizar um montante bem mais expressivo de recursos. A rede de autosserviços reúne perto de 500 filiais no Distrito Federal e em 16 estados de norte a sul do país.

A tiragem máxima prevista para a “Por Exemplo” é de 275 mil exemplares. Como se trata de uma operação complexa, dado o tamanho da rede Extra e o perfil de suas lojas (hipermercados, supermercados, minimercados e drogarias), o número de revistas aumentará progressivamente até atingir esse total. A periodicidade da publicação é de 45 dias. “Na primeira edição, registramos números brutos relevantes, mas ainda pequenos diante do real potencial de mercado”, revela Pipponzi. “Queremos vender de 200 mil a 250 mil exemplares por edição”, ele ressalta.

Se esses números se tornarem realidade, numa projeção estimada com média de impostos em torno de 10% e oito edições anuais, estamos falando de uma arrecadação da ordem de R$ 3,65 milhões a R$ 4,5 milhões, beneficiando os cofres de organizações que trabalham de fato pela melhora da educação brasileira. Na hipótese de as tiragens de todas as edições da “Por Exemplo” serem comercializadas, o volume financeiro passará, então, a beirar os R$ 5 milhões.

A verdade é que os realizadores da revista “Por Exemplo” não hesitaram em destinar recursos à área da educação. Do total do valor arrecadado com a venda da revista, descontados os impostos, 40% serão igualmente divididos entre os movimentos Todos pela Educação e Parceiros da Educação. Esses aportes serão valiosos para que essas organizações mantenham projetos destinados a reverter as vergonhosas estatísticas do Brasil, uma nação avançada no plano econômico, mas atrasada em termos de ensino.

Edital

Criado em 2006, o Todos pela Educação é um movimento da sociedade civil mantido exclusivamente pela iniciativa privada e que visa contribuir para que todas as crianças e jovens do país tenham direito a uma educação básica de qualidade. Para tanto, foi elaborado um plano de cinco metas, a ser cumpridas até 2022, quando o país comemora o bicentenário da Independência. São elas: obrigatoriedade do ensino a crianças e jovens de 4 a 17 anos; todas as crianças plenamente alfabetizadas até os 8 anos; todo aluno com aprendizado adequado à sua série; todo aluno com o ensino médio concluído até os 19 anos; e investimento em educação ampliado e bem gerido. Entre várias outras conquistas, o Todos pela Educação foi responsável pela articulação que levou à aprovação da emenda constitucional nº 59, de 11 de novembro de 2009, que ampliou a faixa etária com vaga garantida na escola de 7 a 14 anos para 4 a 17 anos.

“A ‘Por Exemplo’ tem uma linha editorial muito parecida com nossa filosofia de trabalho”, afirma Andrea Bergamaschi, coordenadora-geral do Todos pela Educação. Ela diz que “a valorização da educação, mais do que constitucional, é um direito humano. Quando a revista traz casos de vida, de gente que faz educação, nos ajuda no trabalho de valorizar o professor, o aluno que vai bem e o pai que acompanha a vida escolar”.

Já o Parceiros da Educação promove e monitora parcerias entre empresas ou empresários e escolas da rede pública. Também foi criado em 2006, a partir da experiência bem-sucedida dos empresários Jayme Garfinkel e Jair Ribeiro, que utilizaram seus conhecimentos em administração de recursos e gestão de negócios para ajudar escolas públicas de São Paulo a transformar sua realidade. Atualmente, são mais de 78 empresários parceiros que contribuem para a formação integral de mais de 100 mil alunos de 81 escolas municipais e estaduais do estado de São Paulo. Dentre as instituições participantes, no ciclo de 1ª a 5ª série, mais de 90% superaram a média do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). A meta da organização é atender 500 escolas e mais de 500 mil crianças.

O papel da “Por Exemplo” na melhora da educação no país não se restringe, porém, a essas duas entidades. Os 60% restantes da renda obtida com a venda de exemplares, algo como R$ 3 milhões, serão concedidos a projetos em todo o país também voltados para a causa. Esses recursos serão destinados por meio de um edital, a ser publicado em breve.