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Senta que lá vem história

Atualmente a produção de animação para os pequenos está, com o perdão do trocadilho, bem animada. No cinema, o Festival Internacional de Cinema Infantil, a Mostra Infantil de Florianópolis e o Prix Jeunesse Iberoamericano conquistam as crianças com longas e curtas-metragens de temas e propostas estéticas diversas.

Para aqueles que gostam de navegar na internet, o YouTube também oferece uma extensa gama de opções audiovisuais infantis, desde programas antigos exibidos na TV até animações recentes.

Na televisão, o surgimento da TV Rá Tim Bum ampliou o espaço, na TV a cabo, para os desenhos de perfil educativo já exibidos na TV Cultura. Peixonauta, Turma da Mônica, Meu Amigãozão, Escola Pra Cachorro e Princesas do Mar são outros títulos que surgiram nos últimos dez anos para mostrar que agora é a vez dos pequenos.

Na telona

Para ter uma ideia da força e do peso do mercado audiovisual destinado às crianças, entre as 11 maiores bilheterias do cinema no Brasil, entre janeiro e novembro de 2011, seis são produções que miram no público infantojuvenil. A animação Rio, dirigida pelo brasileiro Carlos Saldanha voou alto para pousar no primeiro lugar da lista: foi vista por mais de 6 milhões de pessoas. 

Apesar de os longas-metragens norte-americanos caminharem a passos largos no solo brasileiro, a produção nacional nesse formato ainda engatinha. Não é de hoje que o cinema brasileiro para a criançada goteja em um terreno árido.

“Se contar todos os longas-metragens produzidos no Brasil, desde o primeiro longa brasileiro até hoje, apenas 2% foram filmes infantis”, relata o escritor e cineasta João Batista Melo, autor do livro Lanterna Mágica – Infância e Cinema Infantil (Civilização Brasileira, 2011), fruto de uma dissertação de mestrado defendida na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).  Atualmente os filmes abordam temáticas que não eram usuais há alguns anos.

“Temos visto toda uma preocupação com o ‘politicamente correto’, com a inclusão e com a diversidade”, analisa a pedagoga Monica Fantin, autora do livro Crianças, Cinema e Educação (Annablume, 2011).

“Também se trabalha com valores que são muito representativos do nosso momento e da nossa sociedade. Por exemplo, a preocupação ambiental.” Monica realizou uma pesquisa para saber quais elementos um filme deve ter para agradar o público infantil. De acordo com a pedagoga, os campeões entre a criançada foram a diversão e a fantasia.

Formação de público

Se por um lado as produções internacionais são importantes como meio de a criança conhecer outras culturas, por outro é fundamental assistir a conteúdos locais com o intuito de reconhecer a própria identidade a partir das imagens projetadas na tela.

Por isso os festivais têm-se mostrado como um caminho interessante para os pequenos acompanharem o que se produz aqui e nos quatro cantos do globo. Por exemplo, o Festival Internacional de Cinema Infantil (que acontece em dez cidades brasileiras, incluindo São Paulo), a Mostra Infantil de Florianópolis e o Prix Jeunesse Iberoamericano são grandes vitrines de longas e curtas-metragens que traduzem a multiplicidade cultural do Brasil e do mundo.

Dos 117 filmes inscritos este ano para a competição de títulos nacionais da Mostra Infantil de Florianópolis, 77 foram selecionados para a programação, apresentada entre junho e julho. O Filho do Vizinho (2010), de Alex Vidigal, e Menina da Chuva (2010), de Rosaria, foram os escolhidos pelo júri oficial como melhor filme e melhor animação, respectivamente.

O evento ocorre na capital catarinense e em cidades do interior do estado desde 2002. Da primeira edição para cá, o número de público progrediu geometricamente: de dois mil para 40 mil espectadores. “As crianças amam as sessões Diversidade Brasil, que são as sessões em que a gente reúne seis ou sete curtas brasileiros de todas as partes do Brasil”, informa a diretora geral da Mostra Infantil de Florianópolis, Luiza Lins.

“O curta-metragem é muito legal para trabalhar nas escolas e em cineclubes, porque tem um tempo bárbaro.” O Prix Jeunesse Iberoamericano (prêmio da juventude, em francês) é mais um exemplo de mostra bem-sucedida. Baseado no festival de mesmo nome realizado na Alemanha desde 1964, chegou à sua quinta edição em junho deste ano, com evento no Sesc Consolação (veja boxe Sessão Infantil).

O prêmio é bienal e já foi sediado no Chile (2003, 2005 e 2007) e no Brasil (2009 e 2011). Mesclando o formato de competição com debates, exibe conteúdos realizados por emissoras e produtores independentes com trabalhos realizados para TV aberta, por assinatura e internet.

“Estamos num momento de grande transformação, há pesquisas que apontam que as crianças estão consumindo mais internet do que televisão”, conta a coordenadora geral do Prix Jeunesse, Vanessa Fort. “Os produtores estão correndo atrás e tentando se localizar e produzir de forma extremamente criativa para essa nova configuração.”

Caiu na rede

Com um computador conectado à internet, de preferência sempre com a supervisão dos pais ou responsáveis, a criança pode interagir com o conteúdo audiovisual de uma maneira diferente. Ela escolhe o que quer ver, cria também suas próprias imagens (com a câmera de um celular, por exemplo) e compartilha vídeos com os amigos por meio de redes sociais.

O uso de equipamentos eletrônicos como tablets e smartphones também é cada vez mais comum. “Na medida em que ela está produzindo, vai criando a capacidade de identificar certos códigos dessa linguagem audiovisual, sobretudo se isso for trabalhado com mediação da escola”, avalia Monica. “O desafio é articular essa dimensão da arte, do cinema, da cultura com os conteúdos que estão sendo trabalhados em sala de aula. Isso amplia a educação do olhar.”

Referência máxima em postagem de conteúdo audiovisual na internet, o site YouTube abriga um “oceano” de vídeos. As opções são praticamente infinitas. Com isso, é possível “pescar” desde animações recentes, como o último capítulo de Peixonauta, até programas clássicos como Glub-Glub, exibido pela TV Cultura entre 1991 e 1999.

Uma boa pedida também é o portal Filmes que voam: www.filmesquevoam.com.br. Nele há um canal com uma seleção de curtas-metragens da Mostra Infantil de Florianópolis que pode ser baixada ou vista no próprio site.

Em novembro deste ano, o YouTube e a Disney formaram uma parceria para levar vídeos voltados à família para a web, a partir do início de 2012. As duas companhias deverão investir entre 10 e 15 milhões de dólares para produzir conteúdo próprio.

“O que muda [de hoje para a década de 90] são as opções de canais de televisão e as opções de plataformas – como TV a cabo, internet, celular, tablets. A criança em si é uma consumidora de fantasia, de uma boa história. Isso não muda”, acredita o cineasta Cao Hamburger, diretor da série de teledramaturgia Castelo Rá-Tim-Bum e do filme homônimo.

Televisão

Há menos de dez anos, por exemplo, inexistiam séries brasileiras do gênero na grade dos canais das TVs por assinatura e aberta. Hoje, pelo menos cinco produções nacionais exibidas na televisão chamam a atenção de crianças entre três e dez anos.

Turma da Mônica, Peixonauta, Meu Amigãozão, Escola Pra Cachorro e Princesas do Mar são desenhos que passaram a fazer parte do cotidiano da garotada. Além disso, competem de igual para igual com a programação vinda do exterior. “Após os canais internacionais terem se consolidado no Brasil, a situação é melhor”, diz a jornalista e radialista Beth Carmona – presidente do Midiativa (Centro Brasileiro de Mídia para Crianças e Adolescentes) –, que tem no currículo o desenvolvimento de programas infantis para TV Cultura e Discovery Kids, entre outros canais.

“Neste contexto, os produtores de animação foram os que mais avançaram, e já temos algumas séries produzidas ou em produção, coisa que alguns anos atrás nem sequer imaginávamos.” Por outro lado, as crianças têm pouquíssimas opções de programas de qualidade fora da grade dos canais pagos. “A TV [aberta] privada, que vive da publicidade, não vê vantagem em investir em produtos infantis, muitas vezes até mais caros que um produto adulto e sem uma receita garantida”, explica Beth.

Já a TV Cultura, emissora pública, notabilizou-se nos anos 90 por ter investido em produções brasileiras originais, premiadas nacional e internacionalmente. Entre os programas de sucesso de público e crítica, estão Castelo Rá-Tim-Bum, Mundo da Lua e Cocoricó. “É um dos veículos mais importantes, porque desenvolveu o know-how durante muito tempo, só precisa ter um pouco mais de dinheiro para reativar essa produção”, declara Cao Hamburger.

O perfil de programas educativos da TV Cultura – que valorizam o desenvolvimento do espírito crítico das crianças e defendem a informação como instrumento da cidadania – migrou para a TV a cabo em 2004 com a TV Rá Tim Bum, também mantida pela Fundação Padre Anchieta. Com reprise de programas exibidos na TV Cultura, produções próprias e co-produções com estúdios de animação brasileiros, é o único canal dedicado a crianças de 2 a 10 anos com programação 100% nacional.

De acordo com Fernando Almeida, diretor da Diretoria de Projetos Educacionais da TV Cultura, a opção por programas exclusivamente brasileiros tem como objetivo a preservação dos valores culturais nacionais e da identidade cultural das crianças. A grade é produzida sob a supervisão de profissionais ligados à educação infantil, com pedagogos e psicólogos.

“A TV não tem publicidade o que faz com que não sejam transmitidos valores consumistas. Além disso, os programas têm sugestões de atividades para as crianças com o objetivo de tirá-las da passividade”, diz ele.   Com a aprovação da lei 12.485, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em setembro deste ano, estabeleceu-se um marco regulatório para o setor de TV por assinatura no Brasil.

Entre outras coisas, os canais pagos que exibem filmes, séries, documentários e animações precisarão oferecer semanalmente 3h30 de conteúdo nacional. Isso significa que cada vez mais manifestações artísticas e culturais de todas as regiões brasileiras estarão nas telas.

Os personagens mais conhecidos dos quadrinhos nacionais – a Turma da Mônica, criada por Mauricio de Sousa em 1970 – podem ser vistos na televisão, desde 2004, em uma série de animação exibida na TV a cabo. E, a partir de 2010, as peripécias de Cebolinha, Magali, Cascão e Mônica também passaram a ser conferidas na TV Globo.

“Tem de levar em consideração essa mudança do perfil das crianças nos dias de hoje, que estão muito mais informadas, com muito mais referências que as de décadas passadas”, analisa José Márcio Nicolosi, diretor de animação da Mauricio de Sousa Produções.

“Evidente que a Turma da Mônica mantém aquelas piadas que são características dela há tanto tempo, mas os roteiristas sempre pensam em atualizações [para dialogar com o público contemporâneo].” Os canais infantis são o carro-chefe da TV paga, entre os cinco mais vistos, quatro têm conteúdo destinado à garotada.

“As crianças de hoje em dia têm acesso 24 horas à animação de primeira qualidade que se produz no mundo”, fala Kiko Mistrorigo, criador e diretor (juntamente com Celia Catunda) de Peixonauta – exibido no Discovery Kids, desde 2009, e, no SBT, há sete meses.

O desenho desenvolvido por Mistrorigo conta as aventuras de um peixinho que é agente secreto e usa uma roupa de astronauta para descobrir a vida fora d’água, acompanhado por seus melhores amigos, Marina e Zico. Atualmente Peixonauta é exibido em TVs de 67 países, como Tailândia e Israel. “Uma produção de animação tem de pensar em viajar. Senão, a conta não fecha”, revela Mistrorigo.

Túnel do tempo

O escritor italiano Italo Calvino, autor de As Cidades Invisíveis (Companhia das Letras, 1990), definiu que os livros clássicos são aqueles que “servem para entender quem somos e aonde chegamos”. A afirmação também é válida para trabalhos de outras linguagens artísticas, como a audiovisual. Portanto, confira abaixo algumas obras infantis que marcaram época e que valem a pena ser vistas ou revistas.

Filmes

O Mágico de Oz (Estados Unidos, 1939), de Victor Fleming
O Saci (Brasil, 1953), de Rodolfo Nanni
O Balão Vermelho (1956, França), de Albert Lamorisse
Meu Pé de Laranja Lima (Brasil, 1970), de Aurélio Teixeira
E.T. – O Extraterrestre (1982, Estados Unidos), de Steven Spielberg
História Sem Fim (1984, Alemanha / Estados Unidos), de Wolfgang Petersen
A Dança dos Bonecos (1986, Brasil), de Helvécio Ratton

Filmes de animação

Branca de Neve e os Sete Anões (1937, Estados Unidos), produção de Walt Disney
Fantasia (1940, Estados Unidos), produção de Walt Disney
Sinfonia Amazônica (Brasil, 1952), de Anélio Latini Filho
Piconzé (Brasil, 1973), de Ypê Nakashima
Mônica e Cebolinha no Mundo de Romeu e Julieta (Brasil, 1979), de Mauricio de Sousa
Toy Story (Estados Unidos, 1995), John Lasseter
Príncipes e Princesas (França, 2000), de Michel Ocellot
Viagem de Chihiro (Japão, 2001), de Hayo Miyazaki.

Séries de TV

Vigilante Rodoviário (Brasil, exibido pela Rede Tupi a partir de 1962), de Ary Fernandes
Vila Sésamo (Brasil, exibido pela Rede Globo e TV Cultura a partir de 1972), produção de Jayme Leite de Godoy Camargo
Sítio do Picapau Amarelo (Brasil, exibido pela Rede Globo a partir de 1977), de Geraldo Casé
Mundo da Lua (Brasil, exibido pela TV Cultura a partir de 1991), criação de Flávio de Souza e direção de Roberto Vignati
Castelo Rá-Tim-Bum (Brasil, exibido pela TV Cultura a partir de 1994), criação de Flávio de Souza e direção de Cao Hamburger  


Sessão infantil

Com cineclubes e parceria com um grande festival, Sesc oferece conteúdo audiovisual voltado às crianças

Por meio do Cineclubinho, criado em julho de 2010, o CineSesc tem sessões destinadas ao público infantil. As exibições dos filmes acontecem aos domingos, às 11 horas, e têm o objetivo de formar espectadores e estimular o desenvolvimento sociocultural das crianças.

A cada semana, um novo título entra em cartaz. Além disso, uma hora antes das projeções, a criançada participa de oficinas temáticas. Em uma dessas atividades, por exemplo, os pequenos aprenderam a criar brinquedos óticos para fazer animação. 

Como é de costume no mês de dezembro, o CineSesc realiza a Retrospectiva do Cinema Brasileiro. E o CineClubinho entra nessa programação exibindo os longas-metragens infantis produzidos no Brasil e lançados durante o ano. Nos dias 4 e 18, é a vez de Uma Professora Muito Maluquinha, dirigido por André Alves Pinto e César Rodrigues.

Para o dia 11, a diversão é garantida com a animação Brasil Animado, de Mariana Caltabiano. “De uma forma bem descontraída, estamos educando essas crianças para o cinema, quem sabe desse grupo não vá surgir algum diretor ou roteirista do cinema nacional”, diz o técnico da programação do CineSesc e coordenador do projeto CineClubinho, Adolfo Mazzarini.

Desde a inauguração, em agosto deste ano, o Bom Retiro também investe na programação infantil. O CineClubinho da unidade acontece aos sábados e aos domingos, às 11 horas. Este mês será dedicado aos curtas-metragens. Nos dias 3 e 4, é exibido O Planeta Pipsqueak (Espanha, 2011), de Baltasar Pedrosa, que consiste em vários episódios de três minutos que abordam questões relacionadas ao meio ambiente.

Nos dias 10 e 11, Wenceslau e a Árvore de Gramofone (Brasil, 2008), de Adalberto Müller, conta a história de um menino de imaginação inventiva que possui uma ligação muito especial com o avô. E, nos dias 17 e 18, é apresentado Josué e o Pé de Macaxeira (Brasil, 2009), uma animação de Diogo Pereira Viegas que faz uma releitura bem brasileira do clássico da literatura infantil João e o Pé de Feijão.

“Os filmes apresentados são de caráter lúdico”, explica a técnica da programação Thereza Cavalcanti.  Já a unidade Consolação abrigou, em junho deste ano e em 2009, a programação do festival infantil Prix Jeunesse Iberoamericano (prêmio da juventude, em francês). O evento, bienal, é baseado na mostra de mesmo nome realizada na Alemanha desde 1964.

Os objetivos da empreitada são apresentar produções de qualidade realizadas para a TV e a internet, formar público, debater sobre esse segmento do mercado e premiar os trabalhos que mais se destacam. “O Sesc nos apoia e nos legitima como festival, isso ajuda a nos posicionarmos conceitualmente perante o público”, comenta a coordenadora geral do Prix Jeunesse, Vanessa Fort. “E a afinidade permite que essa parceria aconteça”. No início de 2012, o SescTV vai exibir uma seleção de filmes que participaram da última edição do festival.

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