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Roqueiro do bem

foto: Adriana Vichi

O músico escocês David Byrne, mais conhecido como líder do Talking Heads, banda formada em Nova York que se consagrou ao fundir ritmos de outros países – africanos, gitanos, caribenhos, brasileiros – com a pesada levada do rock, esteve no Brasil em julho para defender uma nova causa: a do ciclismo como prática capaz de reconfigurar a paisagem das grandes metrópoles, por meio de políticas públicas de transporte sustentáveis.

Na agenda, a participação no fórum Cidades, bicicletas e o futuro da mobilidade – que ele próprio idealizou – no Sesc Pinheiros, no dia 12, e a passagem pela Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Hoje, de cabelos grisalhos, o roqueiro, que está na ativa desde os anos de 1970, com músicas iniciais de forte impacto, como Psycho Killer, mantém agora uma postura mais branda e é também autor do livro Diários de Bicicleta (Amarilys, 2009), em que conta sua experiência, sobre duas rodas, pelas cidades de Sydney, Manila, São Francisco, Nova York e Buenos Aires.

Embora tenha levado exatos 60 minutos no percurso de 6,5 quilômetros entre o hotel onde estava hospedado, localizado na avenida Brigadeiro Luís Antônio, e a unidade do Sesc em que ocorreria o encontro, Byrne mostrou-se otimista em relação à cidade. “Andei de bicicleta em São Paulo. Algumas ruas são mais fáceis e não têm muitos carros, outras são mais difíceis devido ao trânsito”, afirma em conversa à Revista E. ?“As pessoas em Paraty me diziam: ‘Você é louco. É impossível’. Mas não é. Olhe para Nova York: há o crescimento do número de ciclistas pelas ruas”. A seguir, os melhores trechos.


Mobilidade Urbana


Andar de bicicleta é um modo de conhecer melhor a cidade em que se vive e fazer amigos. Acaba se tornando um estilo de vida. Em determinados países, há uma cultura em torno da bicicleta. Em Copenhague, na Dinamarca, metade da população usa a bicicleta para ir ao trabalho.

A rua tornou-se mais amigável para receber os ciclistas. Para minha geração e para os mais novos, talvez marque uma tomada de consciência sobre como essa simples atitude pode reduzir a poluição que vem dos automóveis. Andei de bicicleta em São Paulo.

Algumas ruas são mais fáceis e não têm muitos carros, outras são mais difíceis devido ao trânsito. As pessoas em Paraty me diziam: “Você é louco. É impossível”. Mas não é. Olhe para Nova York: há o crescimento do número de ciclistas pelas ruas.


O punk e as utopias do passado


A maioria dos problemas enfrentados ao redor do mundo deu-se porque os países espelharam-se no modo como os Estados Unidos pensam e lidam com o dinheiro. Talvez no Brasil essa atitude seja mais branda. O punk foi uma forma de questionar tal poderio. Mas acho que utopia é algo perigoso. Viver sem ela é bom, pois as pessoas vivem caminhos muito estreitos quando seguem determinadas regras.


A crise das gravadoras


Por causa da internet, os artistas têm de encontrar outros modos de ganhar dinheiro. Muitos apelam para a publicidade. Para mim, o contato com o público sempre foi importante nos shows. Mas nem todos os músicos são bons performers, apesar de alguns serem incríveis compositores. É preciso encontrar um modo de sobreviver nos dias de hoje.


Músicos brasileiros


Na década de 1980, pude trabalhar com Tom Zé. Também já trabalhei com músicos de diversas nacionalidades. Sempre estive aberto à possibilidade de experimentar diversas sonoridades e misturá-las ao rock. Também gosto desse novo cenário na música brasileira, a exemplo de Tulipa e Céu [jovens intérpretes e compositoras de música popular brasileira].


Engajamento


Não acho que seja necessário a um rocker defender grandes causas. Se você é um bom performer já é o suficiente. No caso de lutar a favor do uso da bicicleta nas grandes metrópoles, o engajamento não vem de mim. Vem de todos. A sensibilidade das pessoas em várias partes do mundo está mudando. Sou apenas um no meio dessa mudança.

“Por causa da internet, os artistas têm de encontrar outros modos de ganhar dinheiro. Muitos apelam para a publicidade. Para mim, o contato com o público sempre foi importante nos shows”