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Longevidade pela arte
PRÁTICA DE ATIVIDADES ARTÍSTICAS NA VELHICE
DERRUBA PRECONCEITOS E PROMOVE
BENEFÍCIOS À SAÚDE FÍSICA E MENTAL
“Como vou fazer aula de dança se tenho dois pés esquerdos?”, questionava-se Luzia Cotrim, de 64 anos, enquanto Sumiko Arimori, de 76, acreditava que balé se aprende apenas “quando criancinha”. Apesar dessas barreiras erguidas ao longo do tempo e repetidas em frases como “não sou capaz” ou “não tenho idade para isso”, ambas tomaram coragem e se lançaram na arte do movimento, embaladas pelo ritmo. Como resultado, disseram experimentar maior disposição e equilíbrio físico. Seja pela prática ou pela fruição, a arte é, como já disse o psicanalista Christian Dunker, “uma fonte de saúde mental” (leia a seção Encontros publicada na Revista E nº 286, de agosto de 2020). As histórias de Luzia e de Sumiko tornam-se cada vez mais comuns entre mulheres e homens acima dos 60 anos, porque essa faixa etária da população brasileira vem se apropriando do direito à cultura e ao lazer.
Segundo o relatório Idosos no Brasil II – Vivências, Desafios e Expectativas na 3ª Idade, realizado pelo Sesc São Paulo em parceria com a Fundação Perseu Abramo, e publicado em fevereiro de 2020, 58% da população idosa afirma que tem mais possibilidade de lazer do que tinha antes de completar 60 anos. Além disso, 90% dos entrevistados disseram: “Eu sei melhor do que ninguém como e com o que gosto de me divertir”.
“Eu achava que tudo tinha idade. E que a gente que é mais velho tinha que dançar ‘música de velho’ e que, nessa idade, ficaria ridículo fazer algumas coisas. Mas, quando começamos a fazer as aulas de dança, nossa professora mostrou que todos somos capazes, que não tem idade certa, desde que se tenha disposição e boa vontade. A dança é para todos”, conta Luzia, que fez uma oficina de balé em outubro de 2020, pela programação virtual da Mostra Sentidos – A Longevidade pela Arte (leia boxe Provocar sentidos).
Assíduos frequentadores do Sesc Bertioga, Luzia e o marido, Manuel da Silva Paiva, de 71 anos, aprenderam a utilizar os recursos do smartphone para fazer as aulas junto aos colegas, cujas idades variavam entre 60 e 90 anos. “Fizemos pelo celular, aquela imagem pequenina, mas, mesmo assim, foi muito bom”, compartilha Luzia. Manuel, que já gostava de dançar, destacou outra vantagem: “Me diverti muito porque a gente estava dentro de uma gaiola, se sentindo preso, e as aulas só me fizeram bem”.
Autoretrato
Dois pra lá, dois pra cá
Sumiko Arimori também teve que derrubar a barreira do “não posso” e “não tenho idade para isso” ao dar uma chance às aulas de dança, mesmo que não lhe saísse da cabeça a imagem de levar a sobrinha para as aulas de balé e assistir às apresentações dela. “A gente não ficava na ponta dos pés, mas a preparação, a ginástica, a orientação da professora foi algo muito bom. Ajuda no envelhecimento mesmo: ensina você a ter equilíbrio, a perceber o modo como vai usar o pé, como a sola ‘suga’ o chão, como se fosse uma ventosa. Começamos a nos perceber melhor”, explica.
Adriana Vichi
Depois da experiência, Sumiko fez aulas online de ritmos brasileiros e, para além de se beneficiar física e mentalmente com a dança, ela conta que fez novas amizades. “Nessas atividades, você vai conhecendo as pessoas também, formando grupos. E, quando a gente fica online, parece que está longe, mas a gente fica tão perto porque se fala mais e mantém contato. E se alguém fala: ‘Eu não sei’, ‘Nunca fui boa nisso’, a gente se estimula, uma puxa a outra”, complementa.
Hoje, quando não está em uma aula de yoga online, Sumiko está na internet participando de um clube de leitura – o próximo livro que ela vai ler é O Nome da Rosa, de Umberto Eco –, criando um podcast, escrevendo sua biografia, bordando, desenhando... “Em cada coisa que a gente faz, a gente se realiza e se diverte. Viramos crianças, artistas, ainda mais com a idade, que ajuda muito, pois a autocrítica diminui. Quando você é mais jovem, está na ativa, trabalhando, tem muitas responsabilidades, mas na nossa idade tudo é lucro, e a gente se atreve mais, se joga mais”, avalia.
Para a bailarina, coreógrafa e professora Mônica Monteiro, que trabalha com dança e coordenação motora para a longevidade e realizou uma oficina na Mostra Sentidos 2020, as práticas artísticas desenvolvem um diálogo saudável com o processo de envelhecimento. “Essa coisa de usar a imaginação, acho que a arte dá isso para a gente. Ela te dá outro plano, outra possibilidade, algo que nos deixa mais vivos”, resume.
Provocar sentidos
DEBATES E OFICINAS VIRTUAIS DE TEATRO E DANÇA
COMPÕEM PROGRAMAÇÃO DEDICADA A REFLEXÕES SOBRE
ENVELHECIMENTOS E DESCONSTRUÇÃO DE ESTEREÓTIPOS
Há 30 anos, a Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu que em 1º de outubro seria celebrado o Dia Internacional do Idoso, com a finalidade de sensibilizar a sociedade para as questões do envelhecimento e de evidenciar a legislação de proteção à pessoa idosa.
O Sesc São Paulo reverbera essa data, dando início à programação da Mostra Sentidos – A Longevidade na Arte. A ideia é contribuir para a desconstrução de discriminações relacionadas ao processo de envelhecer. Uma ação que faz parte do Trabalho Social com Idosos (TSI) do Sesc São Paulo, criado 1963, referência precursora na construção de programações socioeducativas voltadas especificamente para pessoas idosas.
“O Dia Internacional do Idoso tem como objetivo sensibilizar a sociedade para as questões do envelhecimento, assim como para ressaltar a legislação de proteção à pessoa idosa. Com o intuito de reverberar essa efeméride, contribuindo para a desconstrução de estereótipos e preconceitos relacionados ao processo de envelhecer, a Mostra Sentidos – A Longevidade na Arte reúne uma curadoria de trabalhos artísticos virtuais de teatro e dança com o propósito de gerar reflexões sobre a longevidade.
Essa ação destaca a potência dessa fase da vida, em uma intensa interface com as artes e com o protagonismo do público de pessoas idosas que participa das oficinas”, explica Juliana Viana Barbosa, assistente da Gerência de Estudos e Programas Sociais.
Realizada nos canais digitais do Sesc São Paulo e de suas respectivas unidades, de 1º de outubro a 12 de dezembro, esta 5ª edição reúne nove oficinas artísticas virtuais e gratuitas, com inscrições voltadas exclusivamente para as pessoas idosas, sendo cinco dessas ações dedicadas à linguagem do teatro e quatro, à dança. Cada uma delas busca criar pontes com as produções do campo das artes cênicas e fomentar uma visão mais plural da longevidade, jogando luz sobre as múltiplas velhices na tentativa de evitar que sejam silenciadas.
Acesse a programação completa no portal do Sesc São Paulo: sescsp.org.br/mostrasentidos.
Confira alguns destaques:
SESC IDEIAS
Live Mostra Sentidos – A Longevidade na Arte
Francisco Gaspar
Na abertura da ação, no dia 1º de outubro, pelo Sesc Ideias, acontece o bate-papo online que leva o nome do evento: Mostra Sentidos – A Longevidade na Arte, às 16h, no canal do YouTube do Sesc São Paulo. Dele, farão parte a atriz, dançarina, professora e diretora de teatro Aysha Nascimento (foto), integrante da companhia de Teatro de Rua da Cidade de São Paulo, da Cia. dos Inventivos e do Coletivo Negro; a psicoterapeuta corporal Rebeca Berger, do Instituto Internacional de Análise Bioenergética; e Ervelina Semerjian, que participa de diversos cursos de dança e teatro promovidos pelas ações permanentes e institucionais vinculadas ao programa Trabalho Social com Idosos (TSI). A conversa terá mediação de Mauro Lucas, animador sociocultural no Sesc Belenzinho. (Dia 1º/10, às 16h, no canal do YouTube do Sesc São Paulo)
TEATRO
A Ciranda do Tempo
MaGon Ligia Jardim
A atriz Aline Filócomo e o ator Thiago Amaral (fotos), da Cia. Hiato, ministram essa oficina composta por experimentos teatrais online. Nos encontros, os participantes vão experimentar elementos da linguagem cênica em diálogo com as tecnologias e a comunicação virtual. (De 13/10 a 10/11, quartas, das 10h às 12h, pela plataforma de videochamada Zoom / 30 vagas / Sesc Consolação)
Compartilhar Ideias, Refazer Histórias
Utilizando o teatro como encontro e compartilhamento de ideias e histórias, o ator, diretor e cineasta chileno Cristian Beltrán (fundador do Coletivo Enredo) propõe exercícios cênicos e corporais, bem como o resgate da tradição oral e escrita, a fim de refletir sobre as velhices. (De 6/10 a 17/11, quartas, das 14h30 às 16h, pela plataforma de videochamada Zoom / 40 vagas / Sesc Belenzinho)
DANÇA
Folhas ao Vento – Criação, Corpo e Poesia
Essa oficina de dança ministrada pelo bailarino e produtor cultural Luis Ferron tem como objetivo promover um processo de criação com coreografias pautadas por tecnologias da linguagem audiovisual. (De 5/10 a 12/11, terças e quintas, das 9h30 às 11h30, pela plataforma de videochamada Zoom / 15 vagas / Sesc Ipiranga)
Longevidade e Expansão: Corpos Plurais e Potências
Lua Santana
Ministrado pelo grupo Zona Agbara, que possui entre suas integrantes a dançarina e atriz Gal Martins (Cia. Sansacroma), esse laboratório de criação em dança busca o encontro e a permanência da autonomia, da autoestima e da interação social, por meio do resgate das raízes culturais da jornada de vida de cada participante. (De 6 a 29/10, quartas e sextas, das 10h às 12h, pela plataforma de videochamada Zoom / 25 vagas / Sesc Osasco)