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Poemas

 

NUVEM

a nuvem não tem nome
é e é
e pronto
não mais

não vence
se enlata
ou adula vigilância sanitária

é
antes de ser
foi
antes de nunca
ser

: elefante
guarda-chuva
uma guerra dos mundos
(sob o mar de Copacabana)

se destila nela mesma
e nunca batizou
vermes
larvas
nem mesmo a ferida de Ícaro
que morreu nele mesmo
como nuvem
que sempre foi a mesma
e nunca também
e nunca mais
será

não num avião
que as rebaixam
a terra
a terra de ninguém
a meros pedaços
cortados
guardados
numa janela
numa foto de www
como terras são guardadas
em gavetas de cartório
e cabem todas
as nuvens também
que não têm nome
três-por-quatro
e
já se foram

 


(sem título)

me entupiram sem licença de esperança
– é o que resta!
– a última que morre

e um tanto de outras coisas maquiadas de mentira
que a dose de veneno
mata a poucos goles

esperar esperar é uma sentinela da vida
que passa a noite
mas não dorme

– tudo sempre virá algum dia!
algum dia...
muito longe desta estrofe

e há o que esperar ainda
sempre há ainda
que no esperar console

 


Multidão

pessoas
no mesmo lugar

a fazer
a buscar
a olhar
as mesmas coisas

não cansam
não cansam

não cansam


Ode ao mar

esse brincar de ir-não-ir
começa aqui e
do outro lado do mundo
(onde na escola
me convenceram que existe)
o fim
: no beijo com o céu
o mar cabe na maior coisa do mundo

 


(sem título)

Minha lua, hoje não passa
do reflexo do botão de minha camisa,
que copia a luz sem graça
da lâmpada fincada no telhado.

Tal noite migalho companhia.
Não há cerveja, conversa, poesia,
só o esticar sem pressa do tempo
em um tudo vazio, um hiato.

Nesta noite sem luz de cidades,
a vida se comprime a paredes.
Hoje estou amarrado em desejos,
amanhã é dia novo, me desato.

 

 

Mailson Furtado Viana é um poeta cearense, estreante
na cena literária nacional com a obra À Cidade, publicação independente com a
qual ganhou na categoria Poesia e Livro do Ano o Prêmio Jabuti de 2018.