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Cultura é resistência

A força do coletivo e o impacto provocado
por jovens protagonistas das periferias
são capazes de mudar a vida das
pessoas nas comunidades

Foto: Divulgação


No Capão Redondo, Zona Sul de São Paulo, um processo criativo, árduo e diário delineia, desde 2002 a trajetória da Cia Sansacroma – grupo de dança criado pela coreógrafa e atriz Gal Martins, calcado nas poéticas do corpo negro. “São mais de vinte anos desenvolvendo trabalhos como artista da dança. Nunca trabalhei em outro setor ou área. A produção artística, a gestão cultural, a arte e a educação sempre foram os meios de meu sustento e o da minha filha”, conta a dançarina, exemplo para muitos jovens da periferia que almejam trabalhar com arte ou ter garantido o acesso a atividades culturais.

No entanto, esse acesso ainda é escasso. Dados do Mapa Digital da Cidade de São Paulo mostram que nas regiões mais centrais existem inúmeros espaços culturais, bibliotecas, museus, cinemas e teatros. Enquanto isso, nas regiões mais periféricas, a quantidade de equipamentos ainda é mínima.

Mesmo assim, a ausência desses equipamentos não implica ausência de cultura. “Nas periferias é possível encontrar diversos coletivos, ONGs e projetos sociais, que fomentam e difundem a produção cultural local”, destaca Gabriela Neves, assistente técnica da Gerência de Estudos e Programas Sociais do Sesc.

Passado, presente e futuro

Alguns fatores foram importantes para que a produção cultural das periferias ganhasse alcance, segundo Dennis de Oliveira, pesquisador e professor de Jornalismo, na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), membro do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre o Negro Brasileiro (Neinb). “Entre eles, o movimento hip hop dos anos 1980. Não só pela expressão da música, da dança, do grafite e dos fanzines, mas porque gerou educadores sociais que se propunham a formar outros jovens. Esses, por sua vez, tiveram acesso à formação, fortalecidos por cotas nas universidades”, aponta.
O professor também atribui um importante papel às novas tecnologias, “que permitiram aos jovens a criação de plataformas próprias, além de produção e divulgação de conteúdo”, complementa. Nesse caso, ele dá como exemplo o coletivo de comunicação Periferia em Movimento, criado por jornalistas que escrevem sobre o dia a dia da Cidade Dutra, Grajaú, Marsilac e Parelheiros.

Além dele, já são mais de nove mil coletivos de jovens só na cidade de São Paulo, segundo levantamento feito pela ONG Ação Educativa. Juntos e organizados, eles promovem diferentes formas de vínculo e de pertencimento social, o que facilita a expressão de uma juventude que busca denunciar descontentamentos e, ao mesmo tempo, valorizar suas expressões criativas. “Os arranjos coletivos são potentes nesses processos, geram segurança e afetos, o que traz diretamente satisfação pessoal e perspectiva de futuro”, observa Gal Martins.

Mas, segundo Dennis Oliveira, para que o cenário de produção e fruição cultural seja favorável para esses jovens, é imprescindível a continuidade de programas e leis de fomento, bem como a ampliação de um debate ideológico e político sobre a ação cultural nas periferias. “A universidade também tem que se abrir para esses novos protagonistas”, completa.


 

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