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O mesmo espaço ao mesmo tempo


Maria Alice Oieno de Oliveira

As matas, sobretudo as tropicais, são massas vegetais volumosas e densas, preenchendo plenamente o espaço em que se desenvolvem cidades, essencialmente abrigo de humanos, são entendidas - de modo simplificado - como aglomerados de construções, imaginadas com tijolos, concreto, azulejos etc. arranjados de forma a "aproveitar" todo o espaço existente.

A mata, nessa concepção, é retirada para dar lugar a tal modelo de ocupação. Assim a expansão das cidades, vista e executada como mera ocupação de área, deixa de considerar outros aspectos, tais como: controle de erosão (a não ser através de muros de arrimo ou outras estruturas equivalentes), manutenção do clima, de nascentes, da teia alimentar e da biodiversidade, da saúde em seu sentido mais amplo (que envolve o estímulo diversificado dos órgãos dos sentidos por exemplo), depuração da água, solo e ar, entre outros fatores. Todas essas são preocupações extremamente recentes e ainda pouco conhecidas e difundidas.

Sob esse modelo de "desenvolvimento" foram-se 93% da mata atlântica e estão indo vorazmente milhares de hectares de Amazônia. Dessa forma, a especulação imobiliária, grande vilã nesse processo, antecipa-se mesmo às primeiras ocupações, desmatando áreas para elevar seus preços. Além disso, a legislação é mais amena com referência a áreas já alteradas.

Os ciclos de ocupação sobrepõem-se uns aos outros. À medida que os serviços urbanos se estruturam numa dada área, os custos sobem, os mais endinheirados instalam-se, encadeiam-se entre seus altos muros e grades de proteção. Os menos abastados são empurrados para áreas mais periféricas, com menos, ou nenhum, serviço instalado, às vezes recorrendo a invasão de áreas como desbravadores do tempo dos bandeirantes...

Não é a única forma. Existem outras. A instalação de indústrias, a exploração dos recursos naturais de uma determinada região, geralmente seguem o padrão predatório, que esgotam absolutamente a área, abandonando-a e partindo para a seguinte. A sustentabilidade das cidades exige uma política habitacional e de ocupação industrial ou comercial consistente. Há, no município de São Paulo, algumas áreas centrais, plenamente atendidas por todos os serviços urbanos, hoje abandonadas em função das mudanças de perfil que se sucedem.

A ANTP (Associação Nacional dos Transportes Públicos) estima que mais da metade do solo urbano nas metrópoles é ocupada por vias públicas, viadutos e estacionamentos.

É preciso ordenar atividades urbanas, ocupar os espaços vazios, viabilizar deslocamentos a pé ou de bicicleta, descentralizar atividades econômicas - reduzindo o tráfego de passagem - criar espaços de lazer e priorizar transportes coletivos.

Já estamos fazendo o caminho, caminhando. Falta ainda um pouco mais de integração de áreas de conhecimento, comprometimento, seriedade... Há experiências acumuladas para sustentar tal empreitada. Mais do que providências eleitoreiras ou iniciativas isoladas, privilegiando este ou aquele aspecto, trata-se portanto de um conjunto de processos a serem desenvolvidos que contemplem a qualidade de vida em seu sentido mais amplo.

Maria Alice Oieno de Oliveira
é bióloga e técnica da Gerência de Programas Socioeducativos do Sesc/SP