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Turismo social
texto da Gerência de Programas Socioeducativos do SESC-SP
"Parte, deixa o ninho para se enriquecer com os costumes de outros lugares, aí ouvir palavras nunca antes proferidas. Expõe o corpo ao vento e à chuva, porque, para ser verdadeiramente educado, é preciso se expor ao outro, esposar a alteridade e renascer mestiço." Michel Serres, filósofo francês
“Para mim, viajar é alimentar a alma”. a definição, citada por uma frequentadora do SESC-SP, ajuda a resumir o que é o Programa de Turismo Social do SESC-SP.
Alimentar a alma, podemos entender, é o resultado de experiências que movimentam internamente nossos conhecimentos, valores, crenças, sentimentos. Em outras palavras, é a articulação de mente e corpo que se fazem inquietos diante do novo.
O novo, no contexto do Programa de Turismo Social, é apresentado a partir de vivências que oferecem aos participantes a possibilidade de desenvolvimento de suas habilidades intelectuais e físicas, de aquisição de conhecimentos e de interação entre os indivíduos, sempre por meio da oferta de produtos e serviços acessíveis ao seu poder aquisitivo ou adaptados a possíveis necessidades especiais do público. Tais vivências são planejadas a partir do foco no objetivo da atividade (e não somente no destino) e no desenvolvimento operacional ético e sustentável e destinadas a tornar o movimento turístico acessível ao maior número de pessoas possível. Por isso, para o SESC-SP, o turismo social é entendido como uma atividade inclusiva, pressuposta como plural, democrática e transformadora.
O desenvolvimento de suas ações vem se pautando nas últimas décadas a partir do aperfeiçoamento da ação sociocultural no SESC-SP, praticada por meio de diversas linguagens. A primeira ação aconteceu em 1948, com a inauguração do SESC Bertioga, um centro de hospedagem social localizado no litoral do Estado de São Paulo. Nessa época, não existiam no Brasil colônias de férias dotadas de instalações próprias, e o SESC Bertioga serviu como modelo para a criação de centenas de equipamentos similares em todo o país. Seu maior mérito, entretanto, foi o de inserir no cotidiano dos trabalhadores a questão do tempo livre e do lazer de férias numa época em que poucos se davam conta de sua importância para o bem-estar e o desenvolvimento social e cultural do indivíduo. Apenas 3 anos mais tarde, o SESC São Paulo deu início à sua programação de excursões rodoviárias.
Atualmente, também integram o conjunto de atividades de Turismo Social, oficinas, bate-papos, mostras e outras ações desenvolvidas que não envolvem deslocamento físico, mas que possuam as viagens e turismo como tema, proporcionando uma maior compreensão do ato de viajar, assim como de seus impactos positivos e negativos e da necessidade do desenvolvimento de uma relação harmoniosa com o local e a população visitados.
Dia Mundial do Turismo 2010
Desde 2006, as unidades do SESC-SP oferecem ao público programações comemorativas ao Dia Mundial do Turismo, anualmente celebrado pela Organização Mundial do Turismo (OMT, agência das Nações Unidas para o Turismo), no dia 27 de setembro. A cada ano um tema é escolhido para orientar internacionalmente as comemorações, sempre de forma a colaborar para o alcance dos Objetivos do Milênio, estabelecidos pela ONU em 2000 como prioritários para a superação do que são considerados os principais problemas mundiais.
Em 2010, a OMT sugeriu que as comemorações buscassem a elevação da consciência da relação entre desenvolvimento turístico, conservação da biodiversidade e redução da pobreza,
a partir da reflexão sobre a viabilidade de um turismo sustentável, caracterizado por sua capacidade de não apenas minimizar o impacto negativo sobre os ambientes, mas também impulsionar ações de suporte à salvaguarda do patrimônio natural e geração de riqueza para as populações envolvidas na atividade.
Pensar a manutenção da biodiversidade faz sentido especialmente no Brasil, uma vez que é considerado um dos países com a maior diversidade biológica do mundo. As diretrizes que orientam o tema foram definidas na Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92), um acordo internacional do qual o Brasil foi o primeiro país a ratificar. A CDB tem como pilares a conservação da diversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados do uso dos recursos genéticos.
Com a declaração que estabelece o ano de 2010 como o Ano Internacional da Biodiversidade, a questão da conservação do patrimônio natural tem ganhado projeção e passado por uma intensificação de ações.
No SESC-SP, o assunto entrou na pauta das ações comemorativas ao Dia Mundial do Turismo 2010 a partir do tema “Viagens na minha terra – turismo e sociobiodiversidade”. As Unidades do SESC-SP desenvolverão ações, de 17 de setembro a 3 de outubro, que busquem provocar a atenção do público para o universo das viagens e dos viajantes, tendo sempre como referência sua relação com o patrimônio natural dos destinos turísticos e, especificamente, o papel do turismo como possível agente de conservação da sociobiodiversidade, além de ajudá-los a refletir sobre a inclusão da perspectiva humana no ambiente natural e as relações socioculturais ali inseridas.
Por sociobiodiversidade, o Programa de Turismo Social do SESC-SP entende um conceito ampliado com relação à simples diversidade de espécies, propondo que a diversidade biológica não esteja desconectada da diversidade cultural, assim como a natureza não esteja apartada da cultura. Isso porque há de se considerar que a participação humana nos ambientes naturais é antiga e extensa, produzindo uma relação de apropriação material e simbólica das populações tradicionais com relação ao natural – expressa nos variados tipos de manejo, que passam a caracterizar determinada riqueza biológica e identidade cultural. Dessa forma, como propõe Diegues (p. 309, 2005), a “biodiversidade é também fruto da cultura enquanto conhecimento que permite as populações tradicionais entendê-la, representá-la mentalmente, manuseá-la, transferir espécies de um lugar para outro e frequentemente, adensá-la, enriquecendo-a local e regionalmente”. Este conceito é dado como ponto de partida para as atividades comemorativas ao Dia Mundial do Turismo no SESC-SP, que buscam estimular a criticidade sobre o turismo em áreas naturais considerando o contexto social e cultural em que se inserem.
Ao refletir que as dimensões ambientais, humanas, sociais, culturais e econômicas se imbricam, perfazendo um todo, a atividade turística dever ser pensada também em sua totalidade. O ponto de partida para a preparação do destino deve sempre ser o planejamento turístico consolidado que, para o caminho da sustentabilidade, há de ser participativo e inclusivo. Neste ponto, o turismo de base comunitária apresenta-se como uma das formas de realização desse tipo de planejamento, ao atribuir à comunidade a decisão de se ter ou não a atividade turística como mobilizadora da economia local. É ela, portanto, o principal agente responsável pelo planejamento e gestão do turismo, desenvolvendo os serviços relacionados e se beneficiando da atividade como geradora de renda e promotora de desenvolvimento econômico e social.
Relacionar turismo e sociobiodiversidade é, também, compreender que entre ambiente e comunidade se interrelacionam outros sujeitos, que produzem interferência sobre o lugar e a paisagem. São eles o poder público, os operadores de viagens e os viajantes que ativam a cadeia turística, formada por grande variedade de atores que propulsionam a economia do turismo.
Em número crescente, esses viajantes refletem respostas da sociedade contemporânea urbana ao cenário de distanciamento físico e afetivo do mundo natural. A busca por vezes idealizada de ambiente integralmente selvagem, desabitado e preservado, caracterizam um fenômeno social impulsionado pelo “mito moderno da natureza intocada” (Diegues, 1996), revelando um contraponto entre o que se busca – e aqui há de se observar a existência de um mercado mediador de sonhos e experiências e criador de demandas – e o que efetivamente se configura como destino turístico. Segundo Irving (p. 3, 2008), essas buscas “atendem aos sonhos dos imaginários urbanos, que ressignificam e transformam os recursos renováveis em sonhos de consumo contemporâneos”. Por isso a necessidade de trabalhar cuidadosamente com o viajante, da preparação ao retorno da viagem, na perspectiva de satisfação pessoal e no estímulo à adoção de sua postura como agente de conservação socioambiental.
No SESC-SP, essa forma de planejamento realiza-se por meio da animação sociocultural aplicada ao turismo. Significa não apenas tornar transmissível um conjunto deensinamentos, mas propiciar uma série de vivências e contatos significativos. Implica estimular aptidões e habilidades por meio da interação entre pessoas, do contato com ideias novas, da aproximação com realidades diversas. Trata-se de um vasto processo educativo em andamento, fundamentado na informalidade, na livre escolha e na valorização da criatividade.
Assim, contemplados viajantes, comunidades e ambientes e especialmente a harmoniosa interrelação entre eles, pode-se seguir a passos mais seguros em direção a um possível caminho de sustentabilidade no turismo.
A Gerência de Programas Socioeducativos do SESC-SP responde pelas áreas de Diversidade Cultural, Educação InfantoJuvenil, Educação para a Sustentabilidade e Turismo Social.
bibliografia
- DIEGUES, Antonio Carlos Sant’ana. Sociobiodiversidade. In: Encontros e Caminhos:formaçao de educadoresambientais e coletivos educadores. Brasília: Ministério do Meio ambiente, 2005. p.309.
- DIEGUES, Antonio Carlos Sant´ana. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo:Hucitec, 3ª edição, 2001.
- IRVING, Marta. Ecoturismo em áreas protegidas: da natureza ao fenômeno social. In: Pelas trilhas do ecoturismo. São Carlos: RiMa, 2008. p.3
- SANSOLO, Davis Gruber.Turismo – aproveitamento da biodiversidade para a sustentabilidade. In: Turismo: o desafio da sustentabilidade. São Paulo: Futura, 2002.p.69.
- SESC-SP. Turismo Social no SESC-SP. Turismo para Todos. São Paulo: SESC-SP, 2007.