Sesc SP

Matérias da edição

Postado em

Música
Antônio Nóbrega brilha no show Madeira que Cupim Não Rói

O Brasil vai começar!" grita a canção irradiando uma alegria que emociona. Abre-se, então, no palco, um Brasil desconhecido pela maioria da platéia e íntimo de Antônio Nóbrega. Movido por uma paixão que o faz devoto da cultura brasileira, o músico busca no universo popular a fonte de inspiração para o seu trabalho.

Nordestino de Pernambuco, conheceu a riqueza cultural que povoa este país através das andanças que fazia pelo interior da região. "No Nordeste há muita mistura. Lá temos heranças ibéricas, africanas, indígenas... Essa diversidade gera uma riqueza cultural muito grande."

Utilizando o conhecimento adquirido pelo músico, o Sesc promoveu um diálogo do Brasil com sua história. Durante todo o mês de julho, a unidade do Ipiranga realizou o Encontro com a Dança e a Música Brasileiras. Em parceria com o Sesc, Antônio Nóbrega coordenou o projeto que realizou espetáculos musicais, aulas-espetáculos, oficinas, mostras de vídeos e exposições. As aulas foram marcadas pela apresentação de ritmos e instrumentos que fazem parte do panorama musical brasileiro como o choro, a polca, a valsa, o maxixe, a viola, a gaita, a flauta, o orocongo e a rabeca. Com a da presença de artistas populares de diversas partes do país, os participantes, além de descobrir a música brasileira, tiveram a oportunidade de conhecer melhor as tradições do país. Repentistas pernambucanos, violeiros paulistas e mineiros e outros compositores e músicos vieram exclusivamente prestigiar o evento. "Esse projeto é um velho sonho meu que teve o engrandecimento do Sesc. Esse encontro está me deixando muito feliz. Vamos mostrar ao Brasil um pouco da sua cultura, o que, hoje, a mídia não permite."

Cantigas, cantadores e brincantes

O menestrel, como é chamado por alguns devido ao tom poético que dá aos espetáculos, apaixonou-se pela música aos 18 anos quando o "mestre" Ariano Suassuna apresentou-lhe o Quinteto Armorial. Com a banda, Nóbrega viajou pelo interior nordestino recolhendo cantigas populares que hoje fazem parte do seu repertório. "As músicas dos meus discos procuram fortalecer nossa herança musical que se acentua no Nordeste por meio de toadas e cantigas tiradas pelos cantadores e brincantes dos espetáculos populares."

Os dois CDs lançados por Nóbrega entre 1995 e 1997 deram origem aos seus mais recentes shows. A primeira coletânea de cantigas populares foi inspirada nos registros musicais que o escritor Mário de Andrade fez durante os anos de 1927 e 1928 em uma viagem pelo Norte e Nordeste do Brasil. Assim como os registros, o disco também recebeu o nome de Na Pancada do Ganzá, em homenagem à cadência do instrumento que se assemelha a um chocalho e é bastante comum nas manifestações musicais nordestinas. "No show, procurei revalorizar instrumentos brasileiros que estão quase em desuso e que, infelizmente, a ideologia da indústria cultural acha por bem não usar." A segunda coletânea levou o nome de Madeira que Cupim Não Rói, dessa vez em homenagem à marcha de bloco do frevista Capiba, que nos dias de Carnaval acompanha os incansáveis foliões pelas ladeiras de Olinda. "No Madeira eu avancei mais. Não fiquei preso somente às cantigas, há muitas músicas minhas em parceria com outros compositores. O espetáculo é mais colorido, mais exuberante. Além de tocar, eu danço mais, assim como me relaciono com a platéia de uma forma mais direta." Em ambos os shows, Nóbrega cria arranjos musicais a partir da mistura de instrumentos como cavaquinhos, violas, orocongos, rabecas e flautas para as canções de compositores nordestinos como João Pernambuco, Mestre Salustiano e do "amigo, poeta e pau prá toda obra", Wilson Freire.

Uma homenagem ao Brasil

A abertura do Encontro com a Dança e a Música Brasileiras foi marcada pelo show Madeira que Cupim Não Rói. O "menestrel" trouxe para o palco todo o seu clã: a esposa Rosana, que participa como bailarina, seduzindo a platéia com uma bela apresentação de dança; o filho Daniel, que atua como músico, e a filha Maria Eugênia, que divide o palco com a mãe em alguns números. Além da família, Nóbrega é acompanhado por mais sete músicos que se dividem entre os instrumentos de corda, sopro e percussão. Durante duas horas eles homenagearam o Brasil cantando, dançando e emocionando a todos com a alegria do espetáculo. As mais diversas expressões nacionais foram lembradas por eles, como Pixinguinha, Canudos, Pe. Viera, Jacob do Bandolim, bumba- meu-boi, capoeira, frevo, maracatu. "O show emociona. Estou conhecendo um Brasil que nunca havia visto", conta o estudante Eduardo Petroni.Nem o tempo frio e úmido de um típico domingo paulistano espantou as pessoas. "A proximidade com vocês é tão grande que parece até um sarau", confessou Nóbrega, em meio a uma canção. Ao fim de duas horas de show, o músico convidou todos para uma grande ciranda. O espaço aberto do Sesc Ipiranga acabou se transformando no grande palco do show. "O show está lindo! Sou do Nordeste e conheço muita coisa do que assisti aqui. Antônio Nóbrega é, com certeza, um dos artistas brasileiros que mais conhece seu país", afirma a pedagoga Maria Lúcia Aparato, que dançava junto aos filhos na grande ciranda.

Celebrar um encontro com a dança e a música brasileiras serviu, antes de tudo, para viabilizar o encontro do Brasil urbano, moderno e industrial com os diversos "brasis" que existem no interior deste imenso território. Na era da globalização, é fundamental possibilitar a construção da identidade cultural para que não se perca a compreensão da alma de um povo no trem da história. Para Nóbrega, esse encontro revela um Brasil com o qual continua sonhando.