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Caminhar ou navegar?

São Paulo é recortada por centenas de rios escondidos do olhar de quem transita por ruas e avenidas da cidade
 


Um dos principais afluentes que banham a cidade de São Paulo, o rio Pinheiros nasce do encontro entre o rios Guarapiranga e Grande e vai desaguar no Tietê. Na foto, o rio Tietê, que percorre 1.100 km, banha 62 municípios ribeirinhos e sofre com o despejo diário de 480 toneladas de dejetos | Foto: Divulgação

 

Já imaginou poder velejar pela avenida Sumaré? E se fosse possível trocar um tour a pé pelos famosos grafites do Beco do Batman, na Vila Madalena, por um passeio de canoa? Tais situações podem parecer surreais, mas é grande a quantidade de água que flui debaixo de camadas e camadas de cimento. E poucos moradores ou turistas da capital paulista sabem que sob prédios, casas, ruas e avenidas correm mais de 400 rios. Número que corresponde a, aproximadamente, três mil quilômetros de curso d’água no município.

Para entender o que aconteceu com a rede fluvial da cidade, vale a pena voltar no tempo. Por aproximadamente três séculos, São Paulo só existiu por causa de rios como Tamanduateí, Pinheiros, Tietê e Anhangabaú. Somente depois do processo de urbanização, que teve início no século 20, estes e outros cursos d’água foram soterrados.

O arquiteto e urbanista José Bueno explica que naquela época, tanto no Brasil quanto em outros países, os rios eram tratados como um desafio para o desenvolvimento urbano. “Os urbanistas, que também eram sanitaristas, precisavam resolver a questão da drenagem da água dos rios, que provocavam enchentes e doenças. Por isso, durante o século 20, fomos conduzidos a pensar no rio como um problema a ser resolvido, como algo que inviabilizava a cidade”, explica.

O primeiro passo para equacionar o “problema” na capital paulista foi dado pelo arquiteto Francisco Prestes Maia. Prefeito de São Paulo de 1938 a 1945, Prestes Maia coordenou estudos sobre os sistemas viário e de transporte locais com base no projeto do Perímetro de Irradiação, proposto pelo engenheiro Ulhôa Cintra, em 1924. Seguindo o modelo radial-concêntrico de cidades como Moscou, Paris e Viena, o plano não contemplou um estudo sobre o anel hidroviário da cidade, mas fomentou a indústria automobilística, como explicam estudiosos no documentário Entre Rios – A Urbanização de São Paulo (2009), de Caio Silva Ferraz, Luana de Abreu e Joana Scarpelini.

 

Rios vivos

Tendo em vista a falta de conhecimento quanto à existência e importância da extensão fluvial da metrópole, criou-se o projeto Rios e Ruas, em 2010. Fruto da parceria do urbanista José Bueno com o geógrafo e educador Luiz de Campos Jr., a ação se baseou no mapeamento das bacias hidrográficas da cidade para realização de expedições organizadas – da nascente à foz dos cursos d’água – nos últimos sete anos.

A boa notícia é que esses rios podem, segundo Bueno, coexistir em harmonia com ruas, avenidas e construções. “Mas precisa haver um modelo de desenvolvimento das metrópoles que contemple a preservação deles. Na Alemanha, por exemplo, o governo declarou como política pública a revitalização de todos os seus cursos d’água nos próximos 20 anos”, conta.

Recentemente, Bueno e Campos realizaram expedições com grupos organizados em Recife (PE), Cuiabá (MT), Vila Velha (ES), Rio de Janeiro (RJ) e Curitiba (PR). Todas elas baseadas na mesma metodologia feita em São Paulo: pesquisas mapográfica e histórica somadas à pesquisa de campo e coleta de histórias orais de moradores. “Precisa haver uma mudança de olhar do brasileiro. Porque os rios continuarão vivos mesmo que tenham sido canalizados e poluídos pelo ser humano”, acrescenta Bueno.

 

Explorar para conhecer

Projeto de artemídia evidencia a condição atual de rios e corpos d'água da Bacia do Rio Verde, na Zona Oeste de São Paulo
 


Mapa interativo convida o público a descobrir os caminhos dos rios da capital paulista | Foto: Estúdio Laborg


Por meio de uma maquete interativa, a exposição Rios Des.Cobertos – O Resgate das Águas da Cidade, que já esteve nas unidades do Carmo e da Vila Mariana, desembarca no Sesc Pinheiros até o dia 24. Idealizada e realizada pelo Estúdio Laborg, com o projeto Rios e Ruas, do Instituto Harmonia, uma projeção mapeada interativa apresenta a extensão e a dimensão da hidrografia da cidade de São Paulo. A ideia é oferecer aos visitantes uma experiência sensorial como ferramenta de aprendizagem.

Dessa forma, o público poderá navegar pela instalação de diferentes modos. Será possível descobrir os caminhos das águas na capital e identificar as consequências do ocultamento dos cursos d’água. Além disso, é possível conhecer a história das retificações realizadas e ver ações para o redescobrimento dos rios.

“O diferencial dessa maquete é a possibilidade de mergulho no território sem que percamos a visão do todo, da geografia. A cada itinerância, o projeto ganha uma leitura específica da região [onde é realizada a exposição] que complementa a compreensão sobre a dinâmica das águas na cidade”, explica Tania Perfeito Jardim, assistente técnica da Gerência de Educação para Sustentabilidade e Cidadania do Sesc.

Assim, os visitantes poderão conhecer mais sobre o Rio Verde, cujas nascentes estão próximas à região do metrô Vila Madalena, correndo em direção ao Rio Pinheiros, nas proximidades do Sesc Pinheiros. Ainda na programação, serão realizadas oficinas, saraus, expedições e outras atividades para provocar debates sobre a sustentabilidade e o uso responsável dos recursos hídricos.

“O potencial educativo dessa exposição está em chamar atenção para a importância das bacias hidrográficas e para a história de ocupação e de transformação das paisagens. Dada uma avaliação positiva, estamos estudando possibilidades de continuidade da itinerância em 2018”, acrescenta Tania.

Confira a programação completa

Faça o download do mapa com o curso natural e modificado da bacia do Rio Verde

 

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