Sesc SP

postado em 13/06/2019

Olá, Shakespeare!

Thiago Lacerda em <i>Macbeth</i>. Foto: João Caldas
Thiago Lacerda em Macbeth. Foto: João Caldas

      


Um dos maiores especialistas da obra do bardo inglês, o ator e diretor Ron Daniels conta em livro sua fascinante relação com o teatro shakespeariano

Por Gustavo Ranieri*

 

William Shakespeare continua exercendo um enorme fascínio. Mais do que isso, o bardo inglês, nascido em 1564 e falecido 1616, permanece um enigma. Em torno dele várias perguntas e teorias são feitas, incluindo as que alegam que ele não foi o criador de todos os textos teatrais que a ele são atribuídos, ou mesmo que talvez sua pessoa nem mesmo tenha existido. As especulações, no entanto, não importam. O que mais interessa é a qualidade daquilo que escreveu: um teatro popular, uma complexidade de personagens e a receita da “eternidade” artística que, certamente, o próprio autor não imaginou.

O ator e diretor Ron Daniels sabe de tudo isso. Aliás, não apenas sabe como é também um dos maiores especialistas no mundo sobre o dramaturgo inglês. Carioca de Niterói e um dos fundadores do Teatro Oficina, o criador brasileiro mudou-se para a Inglaterra nos anos 1960, onde iniciou sua carreira no teatro britânico. Uma década depois, tornou-se diretor artístico do teatro The Other Place Theatre da Royal Shakespeare Company, onde permanece como um dos diretores honorários da Royal Shakespeare Company. Com o selo das Edições Sesc, Daniels lança agora o livro Encontros com Shakespeare, no qual não apenas conta sua trajetória, como faz um guia para outros diretores e atores compreenderem melhor a obra do bardo, assim como traz peças que ele adaptou e traduziu no Brasil: Rei Lear, Hamlet, Medida por medida e Macbeth.

 


Raul Cortez em Rei Lear, Thiago Lacerda em Hamlet e Marcos Suchara em Medida por medida. Fotos: João Caldas

 

É sobre o novo livro que conversamos brevemente com Ron Daniels, que, atualmente, dá aulas de direção e interpretação no curso de cinema da Universidade de Nova York, e, igualmente, leciona na Universidade de Yale.

Em uma analogia com o título do livro, se houvesse qualquer possibilidade de ficar diante de Shakespeare, mais de quatro séculos após sua morte, o que você perguntaria a ele? 
– Fale a verdade, William, você escreveu mesmo todas essas peças? A pergunta é brincadeira, claro. Talvez seria curioso saber quem foram os professores do homem de Stratford-Upon-Avon (se é que ele existiu!), quais os livros na sua mesa, se por acaso um dia ele viajou pela Europa, e outros detalhes da sua vida. A verdade é que nada disso importa. O que importa são essas peças extraordinárias que temos pela nossa frente. Quem as escreveu, não importa! 

No livro, você cita a família como o tema que percorre a obra toda do bardo e que continua a nos fisgar a atenção. Seria esse o elo que liga a criação shakespeariana com a sociedade contemporânea? 
Acho que sim. Os laços familiares, que todos reconhecemos de tão de perto e que nos afeta tanto, as relações de pais e filhos e pais e filhas (não são muitas as mães nas peças de Shakespeare), e o rei como o pai da nação, estão presentes de uma forma ou outra em todas as obras. Esse me parece ser o ponto de partida de cada uma das peças e, muitas vezes, o seu ponto de chegada também. 

Há algo que, em sua opinião, os diretores, os atores e o próprio público precisam compreender melhor em torno da obra de Shakespeare? 
Creio que todos nós temos a liberdade e, mais do que isso, a obrigação, de interpretar a obra de Shakespeare de acordo com a nossa realidade atual. Mas precisamos também de uma certa humildade. Precisamos aceitar que Shakespeare sabia o que estava fazendo. Ele não precisa de nossa ajuda para fazer bom teatro. Mais do que isso, precisamos de muita curiosidade, pois há maravilhas escondidas nos textos, no jogo e significado de suas palavras, que estudadas com carinho e amor, e sem temor algum, podem nos revelar verdades incríveis sobre nós mesmos.


*Gustavo Ranieri é jornalista e escritor.

 

Veja também:

:: trecho do livro

 


:: Tópicos shakespearianos | Igualmente aficcionado por Shakespeare, o diretor inglês Peter Brook lançou em 2016 o livro Reflexões sobre Shakespeare, editado no Brasil também pelas Edições Sesc e com texto de orelha assinado por Ron Daniels

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