Sesc SP

postado em 23/02/2023

Mapa das artes

guia-brasileiro-dest

      


Guia brasileiro de produção cultural: ações e reflexões, organizado por Cristiane Olivieri e Edson Natale, chega a sua nona edição com informações detalhadas sobre as etapas fundamentais dos processos de produção, práticas de planejamento e questões relativas aos direitos autorais

Por Dennis de Oliveira*

 

Os últimos tempos têm sido extremamente cruéis para aqueles que vivenciam o circuito da produção cultural. Primeiro, uma onda conservadora e fundamentalista transformou o território das vivências culturais em verdadeiro vilão, o grande culpado de todos os males da sociedade. Um discurso que se conecta diretamente a um fortalecimento da ideia que Herbert Marcuse propôs nos anos 1960, do “homem unidimensional”, aquele que limita a sua existência meramente a produzir bens, acumular riquezas e consumir.

Cultura é diversidade por princípio, particularmente em países em que a dimensão inconclusa da formação da nação traz para o centro da agenda a necessidade de se refletirem os diálogos da diversidade cultural. Por isso, a expansão – ainda que limitada – das vivências culturais que expressam a gama de possibilidades de existências humanas incomoda sobremaneira aos limitados pensamentos unidimensionais. Os fazedores de cultura foram muito insultados, e as políticas culturais, atacadas; os espaços culturais enfrentam situações de precariedade.

Segundo, a pandemia do covid-19 que atingiu todos nós também castigou o território da cultura, que é encontro, é diálogo, é vivência coletiva. A exigência do isolamento e outras medidas de prevenção da doença impactaram profundamente os fazedores da cultura, que precisaram reinventar os modos de realização desses encontros.

 


Trecho do livro

 

Porém, as situações de dificuldade e de crise impulsionam as mentes criativas, que se sentem desafiadas ante cenários negativos. A cultura não morre, reage, se movimenta e se reinventa. Ela se apropria das brechas proporcionadas pelas tecnologias de informação e comunicação como forma de reconstruir espaços de encontros diante de situações excepcionais como a da pandemia, e assim se mobiliza para pressionar os poderes públicos por políticas de fomento. A cultura renasce de cada monte de cinzas criado pelas tentativas infrutíferas do pensamento unidimensional funcionalista de querer impedir o espetáculo.

Esta edição do Guia brasileiro de produção cultural é uma síntese desse renascimento. É uma ação proativa em resposta a quem tentou decretar a morte da diversidade cultural no Brasil. O nome "Guia" parece ser algo um tanto diretivo para quem flui no universo da cultura, mas não: o que se tem em mãos é uma rede de autores que apresentam pensamentos tecidos como as mulheres rendeiras nordestinas produzem as rendas; cantando, evocando a ancestralidade, buscando mecanismos para sobreviver ante as brutais desigualdades sociais – enfim, exercendo plenamente as capacidades humanas para além da unidimensionalidade de quem se rende ao mercado. 

 

*Dennis de Oliveira é professor da USP e coordenador do Celacc (Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e Comunicação). Este texto foi originalmente publicado na orelha do livro.

Produtos relacionados