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Com a palavra o corpo
Durante a reunião de “pauta”, uma breve conversa sobre a edição da revista, fui imaginando milhares de cenas, de pessoas, a vontade era de sair correndo em busca dessas imagens, mas uma pessoa foi aparecendo com muita nitidez: João Silvério Trevisan. Inspirada em sua iconicidade, elegância, beleza, inteligência, clareza e fotogenia, fui construindo mentalmente o ensaio. A missão foi designada, o tempo (final de ano, quando tudo parece mais acelerado) corria, os sinais foram enviados e as incertezas foram se intensificando. João Silvério Trevisan não saia da minha cabeça, seja por sua importância na história da luta pelos direitos LGBT no Brasil ou por tudo que já enumerei, sim, sou suspeita, minha grande admiração me denuncia. As confirmações não chegavam e a torcida pela aceitação de João Silvério era a mais forte certeza no momento. Ele aceitou nos 49 do segundo tempo. A alegria foi colossal. O imaginário foi novamente entrando em ritmo alucinante. Marcamos um café e a admiração só aumentou, falamos sobre a Grécia: literatura e música, sugerindo ótimas dicas. Acompanhado de Nina Pina, em homenagem a Pina Bausch, sua cachorra, uma Airedale Terrier, muito linda, fez várias pessoas pararem na rua. Ele comentou sobre uma fotografia que fez há alguns anos e que gostaria de refazê-la, um nu com um violão. Era tudo que queria ouvir, pois a ideia era mostrar a sensualidade de um homem mais maduro, corajoso e de bem com a vida. O ensaio foi em sua casa, um apartamento típico de escritor, inspirador, no centro de São Paulo. Nina fez festa na chegada, ficou empolgada e corria pelos espaços. Fui montando a luz e registrando a naturalidade da sua rotina, ele estava respondendo e-mails e escrevendo, tudo era fotogênico. Meu desejo era captar o seu mundo, sua biblioteca, o seu quarto, sua sala e seu jardim. O cenário de criação. Uma pitada de sua obra, Pedaço de mim, 2002, ilustra a inspiração literária para o ensaio fotográfico. “Sempre considerei fundamental que minha vida e minha obra se correspondessem. Tanto quanto meu cérebro pensante é parte da minha alma, minha alma é extensão do meu corpo. E meu corpo, a forma palpável da minha psique.