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A grande viagem

"Ombilic", 2012, de Dominique Fleury

Percorrer o mundo com aspirações artísticas provocantes, como em uma grande odisseia, e reeducar o olhar por meio da exploração do ambiente urbano. Esses são alguns dos propósitos do Eternal Tour, festival multicultural que ocupou, durante o mês de setembro, o Sesc Consolação, proporcionando o acesso a prazeres e vivências culturais apreciados em outras grandes edições.

Fundada em Genebra (Suíça) em 2007 por artistas e pesquisadores, a organização Eternal Tour remonta e renova na megalópole brasileira o que apresentou em Roma em 2008, Neuchâtel em 2009, Jerusalém/Ramallah em 2010, em um roteiro de Nova York a Las Vegas em 2011 e em Genebra (também em 2012).

Dessa forma, o festival foi um grande convite à capital paulistana para interagir com o próprio cosmopolitismo, e também transcendê-lo. Por meio de mais de 20 projetos envolvendo intervenções urbanas, arquitetura, artes visuais, performances, música, dança e conferências, entre os dias 28 de agosto e 6 de setembro, o Eternal Tour reuniu mais de quarenta artistas e pensadores suíços, brasileiros e de outras nacionalidades e tomou a área de convivência do Sesc Consolação.

Além disso, artistas promoveram intervenções e deixaram suas obras na área renomeada de Moebius e que abrigou uma exposição até o dia 29 de setembro. Tematizando o cosmopolitismo do século 21, o espaço deu vida a obras sobre temas como antropofagia, natureza e beleza, escravatura, modernismo e racismo. Tudo porque a busca do eterno turista, como propõe a exposição, perpassa pelo contexto histórico local.

Foi por visitar e participar da edição de 2010 do festival, na Palestina, que a artista plástica Fabiana de Barros pensou em trazê-lo a São Paulo. Segundo a artista, o Eternal Tour não poderia acontecer em outro local que não o Sesc Consolação. “O espaço propicia a relação do artista com o público e o festival, que é jovem”, explica. 

De acordo com Donatella Bernardi, curadora da exposição, a cidade de São Paulo abriga a edição de encerramento do festival pela relação entre arquitetura, economia e humanidade que oferece. “São Paulo é ao mesmo tempo ligada à Europa e dotada de costumes diferentes que oferecem aos participantes do Eternal Tour um monte de surpresas e oportunidades”, afirma.

Fabiana, que construiu sua pesquisa e obra Cidade Gato Quente em conjunto com o marido, Michel Favre, acrescenta que a forma de apresentação da Eternal Tour faz com que os participantes e artistas pensem no que está acontecendo na arte e cultura. “É como uma grande panela de pipoca, que esquenta e faz acontecer. As pessoas se encontram, debatem, além de conhecerem e conversarem com os artistas”, explica. E continua: “É como se recebêssemos um turista utópico nessa exposição, que vem para entender São Paulo. E a Eternal Tour é uma recepção de turistas filósofos, turistas pensadores”.

Múltiplas formas de expressão

No campo das intervenções, o Eternal Tour contou com caminhadas urbanas, promovidas pelo coletivo formado pelos arquitetos Celine Guibat, Thais Ribeiro, David Zumstein e a designer suíço-brasileira, Karin Zindel. O objetivo era mostrar um novo olhar, não somente aos participantes do festival, como aos habitantes de São Paulo interessados em conhecer melhor sua cidade.

“A proposta do coletivo fundamenta-se na ‘promenadologia’, ciência fundada pelo sociólogo suíço Lucius Burckhardt nos anos 1980 que visa confrontar o pedestre com a paisagem e o espaço urbano, na perspectiva de um explorador curioso e entusiasta, que aprecia a estética de todo e qualquer lugar, na sua simplicidade ou mesmo banalidade, em oposição ao espetacular”, explica Karin. “A intenção é provocar um olhar distinto e subjetivo do espaço urbano, do seu contexto e sua realidade espacial, que vá além do evidente e dos estereótipos.”


A mágica do eterno

Em são paulo, Experiência ampliada reúne em exposição 40 artistas

A montagem do festival Eternal Tour exigiu a modificação total da área de convivência do Sesc Consolação, entre os dias 28 de agosto e 6 de setembro, para abrigar intervenções e obras de mais de 40 artistas. O local, renomeado de Moebius, foi transformado no berço da exposição que seguiu em cartaz até o dia 29 de setembro.

De acordo com a Técnica de Programação da unidade Ana Luisa Sirota, o trabalho de pré-produção foi intenso e acompanhado diariamente. “Além do auxílio na montagem que iria dispor a obra de cada um dos 40 artistas, buscou-se garantir que cada uma das expressões fosse captada e ligada à Grand Tour – ideia de conhecer e disseminar cada cultura ao viajante”, explica.

Todas as obras, segundo Ana Luisa, foram ligadas por um fio condutor com ideias filosóficas da alemã naturalizada norte-americana Hannah Arendt (1906-1975) e do alemão Immanuel Kant (1724-1804). “A área de convivência do Sesc Consolação recebe todos os visitantes da unidade. É um espaço frequentado por todos”, afirma. Após a captação e avaliação do espaço com a referência dos artistas participantes, a ação dos grupos foi levada ao público. 

Para adaptar a área, que recebeu o nome de Moebius, os sofás foram removidos e deram espaço a painéis suspensos. Além disso, o espaço ganhou mobiliário especial para acompanhá-los, com leveza, transparência e cores sutis e ao mesmo tempo provocantes. Durante os dias de interação com o público, foi nessa área que os artistas e pesquisadores modificaram pouco a pouco a viagem de quem passasse pelo recinto. “Para o público frequentador, perceber a mudança diária do espaço o fez conviver e desmistificar todo o universo que a exposição proporcionou”, acrescenta Ana Luisa.

Até o dia 6 de setembro, os artistas estavam bem ali, para debater, buscar respostas junto ao público. Além disso, um grupo de estudantes teve a chance de, em caráter educativo, participar ativamente de todo o processo. “Mesmo que os artistas tenham partido do espaço no dia 6, estes estudantes continuaram ali para interagir com os visitantes e manter o diálogo sobre a exposição bem vivo. É uma forma de continuidade das narrativas em circulação; e a viagem do ‘turista eterno’ não acabar”, finaliza.

O projeto Fita de Moebius, do fotógrafo Beto Shwafaty, fez parte da exposição e apresentou a ligação entre um ente abstrato (imagem e forma) e os discursos que se apropriam deste em função de objetos específicos, como narrativas de progresso, economia, confiabilidade e inovação.

“A arte e a noção de visualidade não estão isoladas de outros campos sociais, mas em diálogo constante com estes, para ser vistas como forma de comunicação”, afirma o artista. “A ideia de mapeamento ou cartografia destes movimentos relativos, neste caso a Fita de Moebius, é um foco e método produtivo do projeto, uma ação em progresso que visa gerar em um futuro próximo uma espécie de atlas panorâmico destas migrações.”


agorafobi/agorafobia/agoraphobia, 2011, de Anna Kindgren e Carina Gunnars, em colaboração com Ivaneti de Araújo, Sheila Souza, André Kobashi, Eduardo Costa e Renato Cymbalista. Possibilidades de entendimento da urbanização  e dos efeitos da cidade sobre seus habitantes por meio de um olhar cruzado entre  Estocolmo e São Paulo.

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