Postado em
Quarenta anos de Brasil
Ao completar quatro décadas de vida, "Problemas Brasileiros" reafirma a missão de debater e mostrar soluções para as questões nacionais
Em 1963 o Brasil era governado por João Goulart, que chegou à presidência após a desastrosa renúncia de Jânio Quadros. O país vivia momentos de grande tensão política, que culminariam no ano seguinte no golpe militar que dominou a cena política brasileira por mais de duas décadas.
Foi nesse ano que surgiu a revista Problemas Brasileiros, nascida para divulgar os trabalhos de um órgão da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, denominado Instituto de Estudos Sociais, Econômicos e Políticos (hoje Conselho de Economia, Sociologia e Política). O nome da publicação, a um tempo sugestivo e provocante, resumia seu conteúdo: um amplo debate sobre as questões nacionais de atualidade e interesse, realizado por especialistas e personalidades de peso da cultura e intelectualidade brasileira.
A revista registrou, assim, desde os primórdios, temas relevantes sobre todas as áreas do conhecimento. Em 40 anos de publicação, formou-se um amplo registro das profundas alterações políticas, econômicas e sociais desse período. Uma trajetória fielmente acompanhada, com análises e debates permanentes.
Assuntos que hoje estão em pauta, como violência, produção de energia, educação, distribuição de renda, entre outros, aparecem freqüentemente ao longo das quatro décadas da revista, um amargo sinal de que muitos de nossos problemas, além de não terem sido resolvidos, se acentuaram dramaticamente.
Crises
Em agosto de 1963, José Pedro Galvão de Souza escrevia nas páginas de Problemas Brasileiros: "Indagar das origens da crise brasileira não é apenas uma obra de história. Trata-se de pesquisa indispensável. (…) Até aqui têm imperado as soluções empíricas e imediatistas, ou então a demagogia mais desenfreada (…). Revoluções, golpes de Estado, alterações no sistema de governo vêm-se sucedendo numa seqüência interminável, desde a quartelada da qual se originou a República. (…) A Revolução de 30, pondo fim à Primeira República, longe de aplacar estas manifestações cíclicas de um mal pertinaz, veio torná-las mais virulentas. Tais episódios, chegando a agosto de 1961 [quando ocorreu a renúncia de Jânio Quadros], não constituem várias crises em cadeia, mas lances sucessivos da mesma crise".
Mal sabia o autor que, menos de um ano depois, uma nova revolução agitaria o país, corroborando amplamente suas afirmações. E que, mesmo depois que o governo militar deixou de existir, a crise permaneceu, como aliás se pode ver na matéria da página 6 desta edição.
Outro exemplo desse acompanhamento fiel da história do país é a questão da reforma agrária, um dos temas mais comuns nos primeiros números da revista – reflexo daqueles tempos agitados, quando o assunto era foco de discussão não somente no Congresso como em todos os setores da vida nacional. Com a preocupação de oferecer uma colaboração para debate tão relevante, a publicação registrou em novembro de 1963 sua contribuição. "Resolver os problemas da zona rural significa remover importante funil de estrangulamento de nossa economia", diz o texto. E acrescenta mais adiante, em palavras que não perdem a atualidade: "Não se trata meramente de proporcionar aos sem-terra acesso à agricultura como proprietários, sem cuidar de planos de colonização de áreas em mãos do poder público. O problema não se reduz a desapropriar o que já existe e se encontra em produção".
A matéria se estende com definições sobre propriedade agrícola, latifúndios ("grandes áreas desaproveitadas por omissão, negligência, incapacidade ou especulação"), minifúndios ("pequenas propriedades em que a combinação inadequada dos fatores de produção torna sua exploração antieconômica"), e sugere que a reforma da estrutura agrícola seja completada pela dos processos de produção e de comercialização.
O texto conclui afirmando que a reforma agrária deve ser feita "não através da alteração de textos constitucionais, mas mediante a execução de um extenso, profundo e permanente plano de política agrícola".
Alalc e Alca
A revista Problemas Brasileiros acompanhou também os debates sobre a integração econômica da América Latina. Em fevereiro de 1964, um artigo assinado pelo professor Dorival Teixeira Vieira discorre sobre a Alalc (Associação Latino-Americana de Livre Comércio), oferecendo um histórico das circunstâncias e fatos que geraram sua criação pelo Tratado de Montevidéu, em 1960.
O texto destaca o ceticismo empresarial em relação à iniciativa, que congregava sete países (Brasil, Argentina, Uruguai, Venezuela, Chile, México e Colômbia). E alinhava uma série de medidas, complexas e difíceis de implementar, necessárias a que o projeto desse certo. "A Alalc não é uma panacéia, capaz de curar nossos males e restabelecer o livre-cambismo na América Latina. O que dá vitalidade à economia e garante a prosperidade dos negócios é a continuidade das transações. Não havendo esta garantia, qualquer negócio se transforma numa aventura, de conseqüências imprevisíveis."
São palavras de grande oportunidade nos dias de hoje, quando as nações latino-americanas, depois da tentativa do Mercosul, voltam a debater a integração econômica regional, agora patrocinada por um concorrente ameaçador, os Estados Unidos.
A luta dos empresários por maior liberdade para a produção também encontrou eco nas páginas de Problemas Brasileiros. Já em setembro de 1965, o próprio ministro da Fazenda, Otávio Gouveia de Bulhões, aparece na revista, reconhecendo que a "economia brasileira está sob o peso de uma regulamentação econômica demasiadamente complexa que, não poucas vezes, desestimula o que deve ser estimulado e desencoraja o que deve ser encorajado". Poucos foram os avanços, como se sabe, nesta área em que o cipoal de empecilhos, regras, regulamentos, leis e normas tanto dificultam a tarefa de empreender, necessária à geração de renda e emprego.
Educação, segurança pública e meio ambiente, entre tantos outros temas da realidade brasileira, foram assim amplamente debatidos e oferecidos à sociedade nas páginas da revista. A partir da edição nº 321 (maio/junho de 1997), este mesmo material passou a ser divulgado na Internet, abrindo a oportunidade de leitura e consulta a um número muito maior de leitores.
Problemas Brasileiros orgulha-se de seus primeiros 40 anos e se compromete a seguir sua missão de informar e debater, de maneira objetiva e independente, as grandes questões nacionais.
![]() | |