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Aliança com a natureza

“Seria muito difícil conceber uma aliança por um mundo responsável, plural e solidário sem  o tema florestal. A própria arquitetura da floresta inspira um trabalho em aliança. A floresta  tem como uma de suas mais marcantes características a explícita e estreita relação entre todos os seus  componentes. As florestas tropicais, de forma especialmente potencializada, sintetizam o que se pode  chamar de harmonia da diversidade – genética, de cores, de formas, de tamanhos... Compreender –  com a mente e o coração – a dinâmica que sustenta esses grandes ecossistemas é uma das chaves  para a construção de propostas e ações no rumo da sustentabilidade ambiental planetária", Luis Felipe César

Quantas vezes na vida paramos para pensar que a árvore da calçada, a praça perto de casa, o parque do município onde vivemos ou mesmo a reserva  que visitamos nas férias têm relação direta  com o ar que respiramos ou com a conservação dos corpos d´água, para citar apenas  dois exemplos essenciais à vida?

Embora a relação entre florestas e sociedades humanas seja vital, as raízes do  nosso distanciamento em relação à natureza são antigas; podem ser identificadas  até nas bases da política de conservação. As discussões iniciais sobre a criação dos  primeiros parques, nos EUA, fortaleceram  o conceito de isolamento das áreas protegidas; pensar a conservação significava  manter a natureza intocada, afinal, era  preciso distanciar seu elemento ameaçador  – a sociedade humana – para protegê-las.

Esse pensamento influenciou a  política brasileira de conservação, na  medida em que restringiu a presença  das pessoas nas áreas protegidas, em  nome da biodiversidade e da integridade  do ambiente. De certa forma, modos de  vida de populações que viviam nessas  áreas foram colocados em segundo plano;  os conhecimentos tradicionais foram descartados em nome da preservação.

A mudança desse conceito foi  influenciada pela evidência de que o  modelo que excluiu as pessoas do convívio  com a natureza não necessariamente  promove a conservação; pelo contrário:  alijar as populações tradicionais  desvirtuou a compreensão de que o  elemento humano é essencial para  a conservação, pois sua existência é  claramente vinculada aos ciclos naturais. Também no contexto urbano, onde o  distanciamento em relação à natureza é  ainda maior, o conflito permanece.

Essa discussão revela que nossa relação  com a natureza está em constante construção, determinando modos de nos  relacionarmos com ela e de definirmos a  paisagem que nos cerca. Se hoje habitamos  cidades adoecidas pelo excesso de construções, de poluição atmosférica e visual,  e com bem menos áreas verdes do que  gostaríamos, isso tem relação direta com a  forma como elaboramos nossa existência.  Compreender que a qualidade de vida  humana está diretamente ligada a essas  escolhas é o primeiro passo para estabelecermos outra relação com a natureza: a de  reciprocidade. Isso vai além da definição  de um território físico para a conservação,  da existência de uma determinada espécie,  vegetal ou animal, ameaçada de extinção;  passa pela percepção de que pertencemos  ao mesmo sistema.

Mas que valor atribuímos à natureza?  Se hoje o discurso corrente busca o valor  econômico da biodiversidade, da água, do  solo, e outros recursos, quando e como  fortaleceremos a noção de que a natureza  tem seu próprio valor? As populações  tradicionais, por exemplo, não falam em  “consciência ecológica” para explicar  sua relação com a natureza porque elas sempre souberam que dependem dela.

Do ponto educativo, Fritjof Capra  defende que os ecossistemas naturais têm  muito a nos ensinar em relação à aplicação do conceito de sustentabilidade. Compreender os princípios de organização dos  sistemas vivos e suas relações de interdependência está na base do que chama de  alfabetização ecológica, uma pedagogia  voltada ao conhecimento da complexa teia da vida. A partir de uma visão ecológica profunda, que evidencia que o ser  humano é parte indissociável de um  sistema, esse autor acredita que o processo  educativo capaz de gerar engajamento  social e político em prol da vida é aquele  que se inspira e reconhece o conhecimento produzido pela própria natureza.  Poeticamente, Paulinho da Viola fez sua  versão em música, quando compôs Coisas  do mundo minha nega: “As coisas estão no  mundo, só que eu preciso aprender”.

Com esse olhar atento para o que  nos cerca e toda a beleza que envolve as relações que sustentam a teia da  vida, a proposta da educação para  a sustentabilidade busca construir  entendimentos sobre como o mundo se  organiza e como as escolhas humanas  afetam a dinâmica do planeta.

Hoje, com a maioria da população  mundial vivendo em cidades, são  necessários esforços enormes, de todos,  para gerar conhecimento e criar situações  que busquem restaurar a aliança entre os  seres humanos e a natureza.

Lazer e educação em áreas naturais

Buscar conhecimento e envolvimento  a partir do contato direto com as áreas naturais sempre foi objeto de trabalho do SESC, seja nas ações de formação, seja nas vivências que revelam aspectos muitas vezes despercebidos no dia a dia: observar aves, conhecer a simples e sofisticada decomposição de matéria orgânica nas composteiras, ilustrar os frutos e folhas da mata em oficinas de artes, ouvir canções e poesias que se inspiram na natureza ou simplesmente estar sob uma árvore.

Aliar lazer e conservação ambiental é marcante no SESC Interlagos, inaugurado em 1975. Ocupando o que antes era uma área rural, chamada Sítio da Figueira, o projeto manteve uma das poucas áreas remanescentes de Mata Atlântica na cidade de São Paulo, hoje de grande significado na região sul. A partir do estudo realizado em parceria com o Instituto de Biociências da Unesp de Rio Claro, em 1999, foi identificada uma diversidade de espécies bastante considerável, estimulando um trabalho de recomposição da mata. Com propósito de difundir a valorização dessa área e desenvolver a temática socioambiental, foram gerados vários projetos educativos destinados aos educadores da região e à imensa população visitante dessa unidade.

Em 1992, com a criação do SESC Itaquera, localizado numa área de preservação ambiental essencial para a zona leste do município de São Paulo, vários programas educativos voltados à questão ambiental foram desenvolvidos. Durante estes anos, o Programa Pólos Integrados de Educação Ambiental criou significativo espaço de discussão no campo da educação socioambiental na região, propiciando a elaboração de projetos que articulavam conteúdos da interpretação ambiental às mais diversas linguagens artísticas, voltados a educadores, lideranças comunitárias, organizações sociais e alunos das redes pública e particular de ensino.

Com o mesmo propósito, o Centro de Férias SESC Bertioga tem intensificado ações que valorizam o contato direto com a natureza. O projeto Avifauna é um exemplo. Criado em 1992 com o  objetivo de potencializar o envolvimento  dos hóspedes com a riqueza da fauna  local, consistiu num amplo diagnóstico  de ocorrência das aves na região,  na implantação de dispositivos de  alimentação e construção de ninhos, que  permitiram que aves se aproximassem  de locais ao alcance da observação. Além  disso, foi incrementado o plantio de  árvores nativas com maior potencial de  atração de aves.

Com a abertura do Centro de Educação  Ambiental, em 2008, o conceito do  projeto educativo pautou-se no tema  “Entre a serra e o mar”, potencializando  ainda mais a percepção sobre a  importância da Mata Atlântica. Entendidas, então, como espaços  educadores, as áreas naturais possibilitam  uma série de abordagens socioeducativas,  pois evidenciam a complexidade das interrelações entre natureza e cultura.

Dia Mundial do Meio Ambiente

Com uma programação voltada ao tema Florestas para o Povo, idealizada pela Organização das Nações Unidas dentro do Ano Internacional das Florestas, em 2011, o SESC inclui a discussão global a cerca da importância estratégica da conservação ambiental na sua agenda, inserindo-a no contexto de atuação de suas unidades, a partir dos conhecimentos e das percepções locais.

Por que é importante entender e destacar esse tema? O alerta em relação à conservação de áreas verdes e à gestão sustentável das florestas está amparado na constatação de que a sua exploração sem manejo adequado gera uma série de danos à vida humana e ao equilíbrio do planeta: a perda da biodiversidade; o comprometimento dos mananciais; o agravamento das mudanças climáticas; a exploração indiscriminada da fauna; o empobrecimento da  paisagem, entre outros.

Acreditando que pela ação sociocultural podemos transformar nosso olhar e nosso agir, a programação comemorativa do Dia Mundial do Meio Ambiente no SESC apresenta diversos temas e abordagens que buscam provocar, construir e comunicar conteúdos sobre o modo como podemos fortalecer nossa aliança com a natureza.

Bibliografia

→  Florestas do mundo: propostas para a sustentabilidade. São Paulo; Instituto Pólis; 2003. p.13 (Cadernos de proposições para o século XXI, 6)
→  Físico, fundador do Centro para Alfabetização Ecológica em Berkeley, Califórnia. Autor de vários livros, entre eles O tao da física, O Ponto de mutação  e Alfabetização Ecológica.
→  As aves do Sesc Bertioga. São Paulo: SESC, 2004.