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Grande promoção... de saúde!
Mario Ferreira Junior*
Imagine a seguinte situação: “você passa diante de um grande shopping center de dois andares, com um imenso cartaz na fachada anunciando: “Não perca! Grande promoção de saúde!”. Por curiosidade, decide entrar para dar uma olhadinha e, quem sabe, fazer umas “comprinhas”.
Logo no primeiro andar, maravilhas e com as ofertas: “Faça exames ultra-modernos e descubra se está doente!”, “compre aqui os melhores medicamentos para os seus males!” ou “entre! Temos a cirurgia de que você precisa!”. São tantas e tão atraentes as propostas que não consegue se conter e sobe logo para ver o que há no segundo andar. Ali, porém, você se depara com uma situação diferente. Os anúncios são do tipo “venha caminhar no parque conosco”, “aprenda a cozinhar legumes e deixe-os deliciosos”, “quer parar de fumar? Podemos ajudar” ou “ajude a sua comunidade a conter a violência” ou ainda “saiba como se divertir sem abusar da bebida”.
Não se assuste, os cenários acima não existem de verdade, são meras fantasias, fruto da imaginação, mas, apenas para satisfazer, desta vez, a nossa curiosidade: em qual dos andares você faria as suas compras de saúde? Pense com calma...
Se respondeu “no primeiro andar”, saiba que você provavelmente enfrentaria longas filas, pois teria ao seu lado a grande maioria das pessoas, que acredita que o melhor caminho é mesmo procurar saber se está doente e se tratar. Já se a sua opção foi pelo segundo, você pertence a um seleto grupo que busca ter mais saúde e, por tabela, prevenir problemas futuros.
Há ainda uma terceira possibilidade, claro, fazer compras nos dois andares, mas lembre-se: um oferece diagnóstico e tratamento para algo que já aconteceu, fato consumado, enquanto que no outro a proposta é a de prevenir ou, melhor ainda, promover saúde.
Saúde, segundo a Organização Mundial da Saúde e um grupo enorme de especialistas, nada mais é do que estar bem do ponto de vista físico, mental e social. Em outras palavras, é estar de bem com a vida. E, ao contrário do que prega um velho mito popular, “estar saudável” não é igual a “não estar doente”. Quer uma prova? Repare nas pessoas ao seu redor que têm doenças ou deficiências, mas que conseguem controlá-las ou contorná-las e são perfeitamente autônomas e independentes na vida. Elas são exemplos vivos de que mesmo os doentes ou deficientes podem ser bastante saudáveis, fazendo tudo o que precisam e realizando seus sonhos.
Aí vem a pergunta: “E o que eu posso fazer para ter essa saúde toda?”.
Não existem milagres nem receitas de bolo infalíveis para alcançar altos patamares de saúde. Os caminhos são complexos, demorados e nem sempre dependem só de você, mas há muita coisa que você pode fazer nesse sentido.
Aqui, vamos abrir aspas e pedir que, novamente, dê asas à sua imaginação: “De um lado existe o bairro chique da cidade, com casas boas, arejadas, que têm água encanada e esgoto; ruas asfaltadas, bem sinalizadas; transporte público e escolas de boa qualidade; feiras e supermercados que vendem alimentos frescos; shopping centers com lojas, restaurantes, cinemas, teatros; parques para lazer; bons ambientes de trabalho, enfim, um bairro onde as pessoas vão e vêm e se relacionam com a maior segurança e conforto possível.”
“Do outro lado, está o morro com seus precários barracos de madeira, sem janelas e com ruelas improvisadas; o ponto de ônibus fica em local perigoso e sem garantia de transporte na hora esperada; o caminho da escola passa por um terreno baldio, ao lado do lixão onde desemboca o esgoto a céu aberto; a comida é escassa e não há opção de lazer. Em resumo, um lugar no qual a luta pela sobrevivência é quase primitiva e violenta.”
Infelizmente, neste caso, qualquer semelhança com a realidade de uma grande cidade não é mera coincidência nem fantasia da nossa cabeça. Então perguntamos: em qual desses dois bairros as pessoas têm mais chances de levar vidas saudáveis?
Você tem alguma dúvida?
Não à toa, para celebrar o Dia Mundial da Saúde, em 2010, escolheu-se o tema “Urbanização e Saúde”. Uma escolha oportuna para marcar a importância vital do ambiente urbano na saúde das pessoas. Conservar a nossa rua, a vizinhança, o local de lazer e de trabalho, o ar que respiramos, a água que bebemos, enfim, todo o nosso entorno mais próximo, também é saúde.
Agora, voltando ao que se pode fazer para ser mais saudável, a ABPS (Associação Brasileira de Promoção da Saúde) dá a dica: a princípio, deve-se chamar para si o controle da própria saúde e esforçar-se para melhorá-la, sempre. E complementa: quando a melhoria não depender só de você, trabalhe junto, participe, discuta, negocie ou incentive (inclusive com o seu voto, que e uma forma importante de partici- pação social) ações que garantam a preservação do meio ambiente; boa moradia; educação de qualidade; trabalho e remuneração dignos; transporte eficaz e seguro; locais adequados de lazer; alimentação equilibrada; bons serviços de saúde; políticas e práticas antiviolência e combate à criminalidade.
E, naquilo que depender mais de você, informe-se, motive-se e tente adquirir as habilidades necessárias para poder fazer escolhas mais seguras e saudáveis, principalmente em relação aos seus hábitos de estilo de vida, como: atividade física; alimentação; sono; consumo de tabaco, bebida alcoólica, drogas e medicamentos; lazer e controle do estresse; higiene geral e da boca; exposição à radiação solar; risco de acidentes no trânsito, em casa, no lazer e no trabalho; hábito sexual e comportamento violento.
Tudo isso é saúde!
Informação e iniciativas efetivas existem na comunidade, serviços de saúde, escolas, associações de moradores, trabalhadores ou profissionais de saúde, entidades filantrópicas e sem fins lucrativos, centros culturais, esportivos e religiosos. O SESC também desenvolve um trabalho intenso neste sentido: consulte a programação na sua cidade. Há, de fato, uma “Grande Promoção de Saúde” acontecendo. Aproveite!
*Mario Ferreira Junior, Médico, Professor Colaborador Doutor do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da USP. Coordenador do Centro de Ensino e Pesquisa em Promoção da Saúde do Hospital das Clínicas da USP. Diretor Científico da ABPS- Associação Brasileira de Promoção da Saúde, triênio 2010-2012