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Música prá ver

Uma das maiores bobagens que ouvi nessa minha vida de jornalista que trabalha com música foi “instrumental não tem público”! Já perdi a conta de quanto tempo faz que apresento o Instrumental Sesc Brasil e muito raramente vi os shows com pouca gente. Com a transmissão pela TV já tive momentos engraçados nos lugares mais improváveis pelo Brasil afora ao ser reconhecida na rua justamente por apreciadores da música instrumental.

Cada vez mais sou adepta e fã do tal conceito da “cauda longa”, uma ideia organizada pelo físico, escritor e editor Chris Anderson. Ele fala da nova ordem do mercado mundial para bens culturais à margem da mídia de massa, mas que tem sucesso em nichos. E por muito tempo. Longevidade, persistência, conteúdo, estofo. Tudo isso nós temos na música instrumental feita no Brasil. E ouço cada vez menos artistas reclamando das tão faladas dificuldades -porque esses, mais antenados, já sabem que o mundo mudou, estão acompanhando o processo, fazendo parte da mudança e trabalhando bem.

É uma questão de buscar o alvo certo, entre tantas coisas, é claro. Mas esse ponto é fundamental. Tocar pra quem quer te ouvir. Eu adoro música, seja instrumental, jazz, erudito, canção. E sei exatamente onde buscar cada gênero. Não vou à Sala São Paulo pra ouvir rock europeu ou ao Cine Jóia pra assistir a um concerto. Como não acho que a música pop mais interessante feita no Brasil hoje não vai ganhar nada com uma aparição num programa popular de domingo numa TV aberta. Não falo da ideia de “biscoito fino para as massas”, falo de otimizar e pensar muito bem onde gastar seus cartuchos.

Hoje com a internet e as TVs por assinatura já temos mais ofertas de música pra ver e ouvir. Há novos canais para buscar. Ainda que sejam poucos programas realmente dedicados ao tema. Canais só de música são raríssimos. Tendem a buscar público jovem - que se acredita só gostar de pop, rock ou de gêneros populares como o pagode e o sertanejo. Canais de variedades apresentam eventuais coberturas de festivais. E na margem, estão os canais da rede pública com pouca audiência. Cross media é a saída. A música tem que estar no rádio, na TV e na internet. E as emissoras de rádio e TV também. Tem que se reinventar, usar as redes sociais como baliza e medição. Na internet qualquer um pode criar o seu canal, ser seu próprio veículo. Temos exemplos muito bem sucedidos do uso dessa ferramenta.

Mallu Magalhães começou assim, postando vídeos de voz e violão. E vejam onde foi parar a menina! Conteúdo compartilhado com uma poderosa rede de ouvintes, espectadores, artistas e quem mais chegar. Uma revolução democrática, um espaço livre para divulgação da nossa música. Novos programas, jornalistas e comunicadores também têm encontrado seu espaço na internet.

As iniciativas se multiplicam, mas ainda são poucas, se pensarmos na diversidade que se pode encontrar na produção artística nacional. Há poucos anos gostar de MPB era coisa careta. Com a atual quebra de fronteiras entre gêneros, estilos e até acentos regionais, fazer música pop no Brasil é muito bacana! Quem sabe possamos ver daqui a pouco uma retomada do que foi a década de 1960 para o instrumental no Brasil, quando eram muitos os trios de bossa nova, sambalanço e jazz? E que esses artistas criem seus espaços, procurem os veículos certos, valorizem o que tem e façam crescer muito seu alcance. Cauda longa para todos!