Postado em 13/04/2016
José Miguel Wisnik, professor de literatura, escritor, compositor, cantor e pianista. Marina Wisnik, professora, compositora, cantora, atriz e poeta. Guilherme Wisnik, professor de história da arte, crítico de arquitetura e compositor, lançando-se agora como intérprete. Laura Vinci, artista plástica, cenógrafa e diretora de arte.
A partir de 15 de abril no Sesc Pompeia, essa talentosa família comanda uma temporada de atividades inspiradas pelo tema O OVO E O VOO, um palíndromo de Marina. Exposição, shows, oficina de poesia e encontros sobre arte, arquitetura, música e literatura fazem parte do projeto. Em entrevista a EOnline, José Miguel explica da onde surgiu as ideias para as atividades, as inspirações dos artistas e ainda conta quais foram as músicas escolhidas para o repertório do show. Confira:
EOnline: O que é o ovo e o voo? De onde surgiu esse conceito?
José Miguel Wisnik: Antes de ter se tornado um conceito, o ovo e o voo é um jogo com as palavras, os sons e as letras. Mais exatamente, um palíndromo, isto é, uma sequência que pode ser lida de trás pra frente, como num espelho. Esse palíndromo foi criado pela Marina Wisnik, que já fez uma caixa-livro, chamada sós, cheia de outros deles, como lá vou eu em meu oval, ou só dote dádiva é a vida de todos. Mas o ovo e o voo sintetiza o que queremos com essa ocupação familiar no Sesc Pompeia: tratar das relações entre o espaço familiar, íntimo, privado, e os voos que se abrem para a dimensão pública, externa. Toda criação, artística ou não, depende dessas duas dimensões opostas e complementares, voltadas para dentro e para fora, como o verso e o reverso. Além disso, queremos compartilhar com o público a experiência de trabalhar com várias linguagens diferentes, mas que se cruzam.
EOnline: Como foi o processo da construção da parceria em família? É a primeira vez que se apresentam juntos?
José Miguel Wisnik: De certo modo, a construção dessas parcerias foi se fazendo pela vida. Guilherme especializou-se em arquitetura e crítica de arte, mas tem uma relação forte com a canção, como compositor e letrista. Marina tem formação em teatro e em letras, mas também faz canções e tem dois discos gravados. Iara passou também pelo teatro, mas formou-se em moda, é estilista com trabalho autoral próprio, e é nossa figurinista. Laura, que se casou comigo e que se tornou mãe dessa turma (eu tinha ficado viúvo), é artista plástica, mas levou suas inquietações também para o teatro, como cenógrafa e diretora de arte. Eu atuo há muito tempo nos campos da música, da literatura e do ensaio cultural. O nosso ponto de encontro foram as canções. Eu e Guilherme participamos inicialmente de um show da Marina na Casa de Francisca, daí começamos a querer fazer um show inteiro juntos, saltando do ovo ao voo, mas esse desejo acabou arrastando consigo as nossas outras atividades.
EOnline: Para a construção deste projeto, desta ocupação, foi levada em conta a habilidade ou a área de atuação de cada um? Como elas conversam entre si?
José Miguel Wisnik: De certo modo, a área de atuação de cada um já é uma conversa entre áreas. E a ocupação se desenvolve através da potencialização desses encontros e diálogos. Guilherme fala, num primeiro encontro, no dia 19/04, sobre arquitetura, arte e cidade. Eu, num segundo encontro, no dia 20, sobre literatura e canção, mas como uma continuação dos temas trazidos por ele, envolvendo as dimensões do público e do privado na arte e na sociedade brasileiras. Marina faz uma oficina sobre palavra e corpo nos dois dias, 19 e 20. Todos estamos presentes nas várias atividades. Laura faz uma exposição sobre a interpenetração de arte e cenografia no trabalho dela. Tudo isso converge para os shows, guiados também pelo mote de o ovo e o voo, com um repertório feito de nossas canções e parcerias, cenário de Laura e figurino de Iara.
EOnline: Vimos que vocês fazem menção a artistas como Helio Oiticica, Lygia Clark, entre outros, como eles influenciaram suas obras e vocês individualmente? Existem outras influências que por acaso não foram citadas?
José Miguel Wisnik: Helio e Lygia são figuras super importantes para os contrapontos que Guilherme faz entre arquitetura e arte, espaço público e espaço íntimo. Mas também criaram uma poética da linguagem e do corpo que interessa diretamente às oficinas poéticas de Marina. Entre as influências ainda não citadas, é importante dizer que trabalhei fazendo música para o Teatro Oficina, com o Zé Celso Martinez Correa. Guilherme, Marina e Iara são unânimes em dizer que o Ham-let do Oficina foi o acontecimento artístico mais impactante e formador na vida deles. Guilherme atuou depois na cenografia de Bacantes, Marina e Iara atuaram diretamente no coro das bacantes, na mesma peça, e Laura, que trabalhou na cenografia de Cacilda!, tornou-se uma mulher de teatro por causa disso. Ao mesmo tempo, a canção sempre foi a água do nosso moinho, e nenhum de nós conceberia um mundo sem Caetano, Chico, Gil, Itamar, Arnaldo Antunes. Falando ainda em ovos e voos, a família Vinci Wisnik é, pode-se dizer, irmã da família Tatit (que gerou o Grupo Rumo), pelos laços afetivos, formativos e criativos que nos unem.
EOnline: De que forma a ocupação dialoga com o Sesc Pompeia?
José Miguel Wisnik: Só o fato de que o espaço do Sesc Pompeia tenha sido concebido por Lina Bo Bardi, e que traga a marca indelével dela, que fez também o Masp e o Teatro Oficina, já estimula a pensar arquitetura, arte, teatro e cidade como inseparáveis. Ao assumir essa ocupação pouco convencional, com uma exposição no hall que se entrelaça com palestras e oficinas feitas com o público no palco, e que se enlaçam com os shows, acreditamos que o Sesc Pompeia está fazendo justiça à proposta criativa de Lina Bo Bardi, o que nos deixa muito gratos e honrados.
EOnline: É a primeira vez do Guilherme Wisnik no palco, né? Quais são as expectativas para a estreia dele? Ele já tem outros projetos em música? Parcerias?
José Miguel Wisnik: Guilherme estudou piano, compõe música e letra, e tem parcerias com Chico Pinheiro, Cacá Machado (no disco Eslavosamba), Mário Sève, Paulo Neves, André Stolarski. Compusemos juntos “Primeiro fundamento”, que gravei no disco São Paulo Rio. “Primeiro fundamento” estará no show, assim como “Mãe”, letra dele para uma música do compositor mineiro Flávio Henrique. É a primeira vez que Guilherme aparece publicamente como intérprete, na linha do que se convencionou chamar de cantautor, mas atuando também em vocais de músicas minhas e da Marina. Imagino que ele esteja sentindo isso como um verdadeiro voo.
EOnline: Podem dar uma palhinha sobre o repertório? O público pode esperar grandes sucessos?
José Miguel Wisnik: Faremos parcerias já existentes, como a já citada “Primeiro fundamento”, e “Miragem”, essa minha e da Marina, gravada por ela e também no disco Ná e Zé. Mas fizemos músicas novas, inéditas, como “Roma” e “Rebarbas”, parcerias minhas com Marina. Há também uma parceria nova com Carlos Rennó, “O jequitibá”. Esperamos que o público tenha uma experiência boa com os shows. Não trabalhamos propriamente com “grandes sucessos”. Mas vamos enfrentar o fato de que Maria Bethânia canta “Mortal loucura” na novela Velho Chico, e vamos fazê-la.
EOnline: O que vocês esperam desta ocupação? O que querem despertar no público e qual mensagem desejam passar?
José Miguel Wisnik: Acho que há em tudo isso um ato de amor e liberdade, de estímulo e respeito. A família é uma mônada aberta ao mundo. A família que nos interessa não é a célula fechada em si, mas a família humana aberta às parcerias que construímos para dentro e para fora, do voo ao ovo e do ovo aos voos.
o que: | O OVO E O VOO |
quando: |
até 8 de maio |
onde: |
Sesc Pompeia | Rua Clélia, 93 | 11 3871-7700 |
ingressos: |