Postado em 31/03/2016
Professor titular de ética e filosofia política na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), Renato Janine Ribeiro foi também professor visitante na Columbia University, em Nova York, diretor de avaliação da Capes e ministro da Educação entre abril e outubro de 2015. É autor de livros como A Sociedade contra o Social: O Alto Custo da Vida Pública no Brasil (Companhia das Letras, 2000), vencedor do Prêmio Jabuti em 2001, e A Universidade e a Vida Atual – Fellini Não Via Filmes (Edusp, 2003). A seguir, os melhores trechos do depoimento de Ribeiro, no qual ele fala sobre currículo, evasão escolar e outros temas relacionados ao sistema educacional brasileiro.
Renato Janine Ribeiro esteve presente na reunião do Conselho Editorial da Revista E no dia 12 de fevereiro de 2016.
Panorama
O Brasil teve muitos avanços na educação. Um deles foi passar o ensino fundamental para nove anos de duração, outro foi promover a inclusão na escola de praticamente todas as crianças na faixa de 6 a 14 anos, além da expansão das universidades. Tudo isso é notável. Porém, por várias razões, nós não conseguimos tudo o que precisaríamos conseguir. Por exemplo, a qualidade do ensino não teve o avanço necessário, apesar de não ter tido também nenhum recuo.
A questão, portanto, é muito difícil, e qualquer proposta miraculosa não vai resolvê-la. Não é uma situação fácil, mas é uma situação que envolve a todos. É preciso, primeiramente, construir bem o projeto. Ele precisa estar bem alavancado e argumentado. Você precisa também conquistar certa esfera de opinião pública. Necessitamos provar que gastamos bem o pouco dinheiro que temos, em relação às necessidades do país, e conseguir, mostrando isso, um apoio para a causa da educação.
Evasão escolar
O problema da evasão ocorre principalmente no ensino médio. Muita gente discute se o problema estaria num suposto excesso de disciplinas. Até o final do quinto ano do ensino fundamental, o aluno tem um único professor que dá o conjunto das matérias. A partir do sexto ano, há vários professores. Isso representa certo choque, já que o estudante sai de uma situação semimaterna.
Para evitar a evasão no ensino médio, em vez de reduzir matérias, deve-se articulá-las bem entre si. Por exemplo, articular o ensino de história com o de geografia, português, biologia e sociologia, ao trabalhar as bacias hidrográficas do Brasil. Assim, cria-se um diálogo. Esse é um ponto crucial e não é nada fácil.
A articulação entre as disciplinas não é algo totalmente novo. O ginásio vocacional Oswaldo Aranha criado pelo governo Carvalho Pinto no final dos anos 1950, no Brooklin, trabalhava desta maneira. No regime militar, ele foi fechado, mas funcionava articulando as disciplinas entre si.
Prioridades
A educação não é simples. O que devemos, então, priorizar? Eu diria que três coisas. A alfabetização, que deve ser prioridade zero no país. Como segundo ponto, viria o ensino técnico. O Brasil tem 10% da faixa de pessoas entre 15 e 17 anos no ensino técnico, enquanto Alemanha, Japão e Finlândia têm 50%. Sou favorável à modalidade concomitante, em que você faz o ensino técnico junto com o médio. Outros defendem o ensino técnico em que você retira certas disciplinas, como sociologia e filosofia. Não acho isso bom. Traz um grande problema, pois são disciplinas que podem capacitar a entender o mundo atual. Em um currículo que contemple o estudo da sociologia, economia, filosofia e antropologia, há condições de entender a sociedade atual, como funciona a economia e a política da atualidade. Hoje, essas formações não se dão, e as pessoas chegam à universidade sem ter a menor ideia de como se produz valor, porque não sabem nada de economia.
O terceiro ponto seria a educação nas creches, agregando um número novo de alunos nas creches e garantindo a eles uma pré-escola boa, um primeiro ano bom, e uma boa formação na universidade. Ou seja, tudo isso deve ser pensado a longo prazo. Hoje, temos 25% de crianças que entram em creche. Se aumentarmos este número em 5% por ano, que é um número alto, são 15 anos para incluir todas. Se a gente quiser fazer a educação brasileira melhorar, vamos conseguir que toda a escolaridade seja boa por volta de 2040 e 2050, mesmo começando a agir nesta década.