Postado em 26/11/2015
Não é fácil escrever sobre Godard. Aliás, escrever sobre ele é fácil; difícil é saber por onde começar.
Nascido em 1930, de família protestante e de recursos, Jean-Luc Godard não teve muito contato com o cinema até se instalar em Paris para fazer faculdade, em 1949. Sua paixão pelos cineclubes do Quartier Latin e sua assiduidade neles o fizeram praticamente não assistir às aulas de seu curso de Antropologia. Foi nesses filmes que Godard conheceu alguns de seus colegas de fazer cinematográfico: Maurice Schérer (mais conhecido depois como Éric Rohmer), Jacques Rivette, Claude Chabrol e François Truffaut.
Mas o cinema para Godard e seus amigos não começou no fazer, mas no pensar: os cineclubes fervilhavam de discussões e análises. O cinema era mais um esforço intelectual que qualquer outra coisa, o que levou muitos desses jovens a contribuírem para a lendária revista francesa de crítica cinematográfica Cahiers du Cinéma, fundada por André Bazin.
A primeira crítica publicada foi, justamente, do jovem Godard, que iria, durante os anos seguintes, questionar as convenções e os clichês dos filmes comerciais (tanto franceses quanto hollywoodianos) além de se engajar em disputas ideológicas e conceituais com quase todos os envolvidos na revista.
Com uma década de críticas e alguns curta-metragens um tanto experimentais, Godard consegue realizar seu primeiro longa-metragem, Acossado em 1960. A grande qualidade, atemporal inclusive, do filme é justamente a desconstrução de quase todas as convenções e formalidades do gênero policial. Aliás, convenções e formalidades de todo o cinema até então.
Com esses críticos tornados diretores, Godard fez parte do movimento hoje conhecido como Nouvelle Vague, que buscava contestar a forma de se fazer cinema até então e, mais ainda, retomar o conceito de autor em produções cinematográficas, em que o diretor imprimia também bastante de suas inquietações e visão de mundo na obra. O Cinema de Autor, como chamavam, deveria ser pessoal e, se possível, até mesmo subjetivo.
E foi isso que Godard fez durante seus mais de 60 anos envolvido com Cinema. Seus filmes possuem uma característica única de unicidade que pode ser resumida pelo complemento “do Godard” a seus títulos. O cinema caminha em paralelo com a vida e o desenvolvimento político e filosófico do autor. Isso fica claro ao se dividir a obra do cineasta em “fases” (claro que, de modo simples e sem pretensões de orientar qualquer estudo ou contato com a obra!). Godard rebelde contra o sistema cinematográfico, Godard militante, Godard televisivo (com toda a riqueza que essa palavra contém), Godard experimental, Godard Professor...
Me dê um tipo de cinema e lhe indico um Godard.
Godard é muitos e é um. Godard é saber duas ou três coisas sobre ela. Godard é cinema de autor. Godard é cinema vivo.
Vivo, aliás, e plenamente ativo. Um panorama extenso de sua obra, bem como seu mais recente filme, Adeus à Linguagem (2015), podem ser vistos na Retrospectiva Jean-Luc “Cinema” Godard que chega agora dia 26 de novembro ao CineSesc.
Divirta-se e traga seus amigos para conversar sobre cada um dos filmes. Quem pode saber onde o próximo grande movimento de contestação cinematográfica começará?