Postado em 28/10/2015
MoTIn – Movimento dos Teatros Independentes de São Paulo. Muitas sensações e sentimentos me ocorreram quando soube deste movimento que surgiu para discutir os sérios problemas que alguns espaços teatrais enfrentam hoje na capital. Um déjà vu foi inevitável – sensação de que já havia visto este filme, ou melhor, esta peça, antes. E havia visto mesmo... Foi em meados da década de 1990, quando iniciei minha graduação em Artes Cênicas.
Na mochila, levei pra recém-formada república algumas roupas e muitas expectativas, ambições e desejos. Levei também muita vontade de conhecer melhor Shakespeare, Brecht, Stanislavski, Tchekhov e, como todo jovem militante e engajado, muita vontade de conhecer melhor o pessoal do Arena: Boal, Vianninha e Guarnieri. Vontade de conhecer os doidões do Oficina, a irreverência dos Parlapatões e também um pessoal novo que dizia fazer teatro de grupo (“... e tem teatro sem grupo? Estranho...”). Toda essa vontade foi encontrando terreno fértil nas discussões do teatro político, na militância no movimento estudantil, nas conversas de corredores e até nas cenas improvisadas que armávamos da noite pro dia durante os períodos de greve tudo em prol do movimento e dos companheiros em luta.
Foi meio nessa época que ouvimos falar de uma turma de São Paulo que estava, como nós, discutindo os modos de produção e suas leis de incentivo com um olhar mais crítico, percebendo distorções e propondo alternativas, ainda que de maneira desorganizada – como nós.
Um movimento foi iniciado e um manifesto publicado. O nome era excelente e nos pegou em cheio: “Arte contra a barbárie”. – Meu! Genial! Vamos lá conversar com eles! Lembro de uma turma grande matando aula (com a conivência dos professores, acreditem!) pra acompanhar as reuniões em São Paulo, que cresceram muito em participação e colaboração, gerando dois outros manifestos e um monte de reuniões mais ou menos bem-sucedidas com a Secretaria de Cultura e com alguns vereadores sensíveis à causa – ou interessados nela.
Dois ou três anos depois, uma grande vitória pra esse movimento que vinha discutindo e batalhando por melhores condições de produção e circulação do teatro que se fazia na capital: em 2002 é criada a Lei de Fomento ao Teatro da Cidade de São Paulo, uma alternativa ao cruel jogo da renúncia fiscal (que é o mecanismo-chave de leis de incentivo cultural como a Rouanet), que delega a instituições privadas a responsabilidade de “decidir” que projetos devem ou não ser incentivados.
Aha! Uhu! O Fomento é nosso! Lembro bastante do gás que a boa-nova trouxe para as companhias da capital e de como essa onda contaminou todo mundo que fazia teatro naquela época. O Fomento foi uma grande conquista da classe e, apesar das sabidas deficiências, é ainda hoje o principal mecanismo de financiamento público das companhias teatrais paulistanas.
Mais de dez anos se passaram, muitas companhias se estabeleceram e, agora, são os espaços teatrais independentes de São Paulo (grande parte deles geridos por essas companhias) que encontram dificuldades e que instigam reflexão e ação.
Foi esse o déjà vu... Para além de um movimento, o MoTIn é mais uma iniciativa daquela turma que tempos atrás conquistou uma lei de incentivo que atendesse às suas necessidades e expectativas, que fosse justa e que tivesse critérios coerentes.
Déjà vu sim, mas com uma importante diferença: a turma cresceu em experiência, em número e em organização. Tanto que agora propõe se reconhecer, se re-identificar, fazer das diferenças seu diferencial para lutar coletivamente por seus espaços de criação e apresentação. Bons ventos ao MoTIn!
ARMANDO FERNANDES, formado em Artes Cênicas na Universidade Estadual de Campinas, é coordenador de programação do Sesc Jundiaí.