Postado em 14/09/2015
Quem olha para o disco Macaco Sem Pelo de Meno Del Picchia, lançado em 2013, pode se ater apenas aos versos divertidos que permeiam cada faixa. “Sou alérgico a pó. alérgico a jiló. e a poluição. Sou alérgico a jabá. a gato angorá. a pólvora e facão”. A faixa Alergia, por exemplo, uma parceria com André Abujamra, brinca com feridas sociais usando analogias bem humoradas. Por trás do refrão da canção que dá título ao álbum “Somos todos um bando de macacos sem pelos/ Só que a gente caga no banheiro”, outra comparação que recorre a natureza humana demonstra a habilidade de Meno em figurar com as palavras, como bom prosador. Um detalhe interessante é que o músico é bisneto do escritor, pintor e escultor modernista Menotti Del Picchia.
Mas a inspiração do músico bragantino não brotou somente da música ou da arte do bisavô, ela também é resultado da arte da observação, caracterísitca fundamental de sua formação como cientista social que o transformou numa espécie de “antropólogo musical”. Meno recentemente defendeu um mestrado na USP intitulado “Por que eles ainda gravam? Disco e artistas em ação”, onde levanta uma série de questões relacionadas a produção musical contemporânea como: a ascensão da produção de discos face a queda nas vendas de discos e o porquê dos artistas continuarem gravando e lançando num ritmo quase que similar ao boom da indústria fonográfica do século passado, mesmo com o declínio evidente da mesma.
“Acompanhei as gravações de Metal Metal com o Kiko Dinucci e também de discos do Tatá Aeroplano e Rodrigo Campos. Recebi um respaldo baseado no processo de observação de como esses músicos se comportavam no estúdio. Vendo a interação entre eles nos ensaios e realizando entrevistas. Agindo efetivamente como um observador participante.”, explicou o músico sobre a base de sua etnografia. “Lá identifiquei dinâmicas coletivas de arranjo e canções que caracterizam um processo criativo onde as atividades de todos os envolvidos são permeáveis entre si, e onde arte e técnica se interpenetram.”, completa. Meno recentemente acompanhou a pré-produção do disco de Bruno Batista e nos enviou um registro que mostra um pouco dessa dinâmica.
Para o músico é importante entender que o mesmo processo que desencadeou a pirataria musical na internet, provocou um curto-circuito entre arte e técnica no fazer musical, e um curto circuito entre artista e público. Meno também tomou como referência a análise do antropólogo social britânico Alfred Gell sobre a construção do artista mediado pelo lançamento de seus discos e do conceito de cibercultura de Pierre Levy. “Hoje em dia praticamente todo artista tem que ter um perfil no Facebook", completa.
O curso e o workshow
Músicos, jornalistas, pesquisadores, antropólogos, fãs e demais interessados terão a oportunidade de ter contato com a pesquisa de Meno em dois formatos diferentes: um show, realizado nesta quinta-feira, dia 17/9 às 20h, no Teatro Anchieta e um curso entitulado “Por que eles ainda gravam?” (com inscrições abertas) que se inicia no sábado, dia 19/9, no Centro de Música do Sesc Consolação.
No show, entre o repertório de “Macaco Sem Pelo”, Meno propõe um bate-papo com o público entre as canções. “Devemos tocar 3 ou 4 músicas e abrir a conversa com o público atravessando os principais eixos da pesquisa. Depois, mais canções e chamamos o Kiko Dinucci também para o bate-papo e finalização do show.”, explica.
Já o curso, que ocorre em 3 encontros, pretende traçar um panorama geral sobre o processo de produção musical, desde as noções básicas de áudio e de música, passando pela história do fonógrafo de Thomas Edison, a etnografia musical dentro dos estúdios e a relação entre internet, cultura e música. Neste último encontro, Meno tem como estudo de caso o Funk Ostentação, fenômeno proveniente da periferia potencializado fundamentalmente pela cultura digital. “Neste universo do funk, o videoclipe é tão ou mais importante do que o lançamento do próprio disco. Os artistas alavancam suas carreiras sem discos, mas utilizando o Youtube como trampolim. A lógica é diferente.”
"Por que eles ainda gravam" faz parte da série Sapiências iniciada em abril deste ano. A programação envolve diferentes áreas do saber como Artes Visuais, Alimentação, Cinema, Dança, Literatura, Música e Teatro, promovendo uma intersecção entre as linguagens e abrindo novas possibilidades de exploração de atividades formativas entre saberes de diversas origens. Além de atividades teóricas sobre variados temas, apresenta ações que compreendem exercícios e vivências que possibilitam a experimentação e a assimilação dos conteúdos abordados. Veja outros cursos aqui.
o que: | Meno Del Picchia - Workshow: Por que eles ainda gravam? |
quando: |
Dia 17/9. Quinta-feira, às 20h. |
onde: |
Sesc Consolação | Rua Doutor Vila Nova, 245 | 11 3234-3000 |
ingressos: |
Grátis |
o que: | Por que eles ainda gravam? |
quando: |
De 19/9 a 3/10. Sábados, das 14h às 18h. |
onde: |
Sesc Consolação | Rua Doutor Vila Nova, 245 | 11 3234-3000 |
valores: |
R$40 (Interessados em geral) / R$12 (Credencial Plena) |