Postado em 01/11/2014
Na sociedade contemporânea, a comunicação ganhou lugar de centralidade estratégica. Ou seja, praticamente tudo o que nos circunda, incluindo aspectos materiais, emocionais e simbólicos, mantém algum nível de relação com os meios de comunicação, as linguagens e os discursos neles gerados. Os processos educativos, vetor que nos interessa neste momento, passaram a ser desafiados pelos modos singulares como a informação e o conhecimento são elaborados, distribuídos e socialmente intercambiados.
Deste modo, promover educação deixou de ser, apenas, problema afeito às salas de aula, aos espaços formais escolares, passando a dizer respeito, também, ao ecossistema comunicativo. Daí as crescentes preocupações em tratar de temas como os da educação para os meios, da leitura crítica da comunicação, da alfabetização midiática e, mais recentemente, da Educomunicação.
Claro está que pensar a comunicação como elemento integrado à educação não é problema novo entre nós. Desde pioneiros como Roquette-Pinto e Anísio Teixeira, até Paulo Freire, o assunto vem sendo colocado em evidência, conquanto tratado segundo as suas circunstâncias históricas. Paulo Freire, por exemplo, entendia que
não era possível prover educação sem que a ela estivesse imediatamente associada a palavra comunicação. O olhar dele, contudo, não estava orientado de maneira direta aos mediadores técnicos, senão ao ato mesmo da comunicação, visto enquanto fomentador do diálogo, procedimento que permitiria subverter a concepção segundo a qual o docente, que sabe, ensina ao discente, que não sabe. Este “transmissivismo” unidirecional, traduzido na ideia de que o conhecimento pode, simplesmente, ser transferido do professor ao aluno, recebeu de Paulo Freire o epíteto de educação bancária.
Cabe, contudo, avançar um pouco mais nesta análise pensando as relações comunicação e educação também à luz dos dispositivos técnicos e suas linguagens: jornal, televisão, rádio, publicidade, cinema, internet, etc. Tais mediadores precisam ser percebidos pela educação como instâncias que transcendem dimensões técnicas ou funcionais, colocando-se no tempo presente como parte de um processo tecnocultural irreversível, logo a merecer especial atenção dos sistemas escolares. É por isso que esforços vêm sendo promovidos, seja em centros de pesquisa, seja em instituições da sociedade civil, seja em organismos governamentais, no intuito de aproximar e permitir um diálogo qualificado, com seus devidos matizes críticos, entre a comunicação e a educação.
Temos acionado o termo Educomunicação para designar essa área de reflexão, pesquisa e intervenção social, cujo objetivo é o de trabalhar na interface comunicação e educação. Encontra-se, inclusive, em funcionamento na Universidade de São Paulo, junto ao Departamento de Comunicações e Artes, um bacharelado em Educomunicação, prestes a formar sua primeira turma. Existem, contudo, outras instituições públicas e privadas, além de organismos da sociedade civil, voltadas a cumprir os propósitos enunciados naquela interface.
A despeito de a comunicação e a educação possuírem áreas próprias de trabalho, metodologias e objetos de pesquisa, fala-se, agora, na criação de outro espaço de intervenção social e de um novo agente de formação que pode atuar em lugares consagrados como a sala de aula ou em espaços que incluem o rádio, a televisão, a internet, as redes sociais, a produção de softwares educativos etc. Dessa forma, a Educomunicação, cujo âmbito de atuação não se restringe à didática ou
à restrita aplicação ao ensino das tecnologias da informação e da comunicação, se volta ao pensar e ao agir no interior de um quadro histórico marcado por novos modos de organizar, distribuir e receber o conhecimento e a informação.
Ao indicarmos a importância de aproximar a comunicação da educação, pensamos que este fundamental espaço de promoção da equidade, a escola, sobretudo a de natureza pública, tem o desafio presente de acertar o passo com um mundo atravessado por mudanças sociais, comportamentais, tecnológicas, cuja amplitude é demais conhecida. Em última instância, se trata de aprofundar o entendimento acerca do funcionamento e das possibilidades oferecidas pela comunicação.
Os processos educativos podem e devem participar desse esforço, pois a formação de sujeitos proficientes para ler e produzir criticamente a comunicação gerada em nosso tempo é fator decisivo quando se busca construir uma cidadania compromissada com o aprofundamento da democracia.
Adilson Citelli é graduado em Letras e professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, onde ministra cursos e orienta dissertações e teses nas áreas de Comunicação e Linguagem, com ênfase em Educomunicação.