Postado em 03/06/2014
Por Ricardo Lísias
Comentava-se no interior da família, claro que com muita discrição, que no caso dos meus avós, quando um morresse, o outro não demoraria muito a procurar o reencontro. Eles sempre foram muito ligados. Minha avó fazia parte de um grupo de moças da igreja presbiteriana do interior de São Paulo. Em uma tarde, receberam a visita alguns seminaristas que se preparavam para assumir o cargo de pastor em diversas regiões do Brasil.
Os dois logo se encontraram e começaram a namorar. Acho que estamos no ano de 1943. Meu avô se casou no mesmo ano em que se formou pastor protestante e teólogo. Em seguida, recebeu a responsabilidade de cuidar de um conjunto de igrejas no interior da Bahia. Com isso, desligou-se dos negócios do meu bisavô e viajou, rodando o interior do nordeste por mais ou menos dez anos.
Depois, como se tivessem cumprido uma missão, os dois voltaram para São Paulo e meu avô assumiu o comando de uma das igrejas presbiterianas mais importantes do Brasil. Minha avó sempre esteve com ele: dirigia grupos de estudo da Bíblia de Lutero, presidia visitações a pessoas doentes e não perdia um sermão.
Do mesmo jeito, quando meu bisavô deixou o casarão do Ipiranga para meus avós (o que, já contei, coincide com a minha infância), eles logo dividiram a casa em espaços comuns (o quarto, a sala, o quintal da frente e algumas outras dependências) e também demarcaram lugares próprios. Ou seja, outra vez se harmonizaram com uma facilidade que nunca encontrei em outro casal. Às vezes, quem cuidava de mim era minha avó. Então, eu teria chá e alguma história construtiva. Meu avô sempre aparecia com uma bússola e uma narrativa épica. Cada sabor de infusão e todos os acontecimentos históricos heróicos que meu avô adorava pertencem a um canto dessa casa.