Postado em 30/05/2014
Por Ricardo Lísias
Uma das fixações do meu avô conseguia unir os três netos: o Monstro da Lagoa. A fauna aquática que acabava protegendo o Monstro dos exploradores deixava minha irmã muito interessada. Para ela, o único problema era ele não morar no oceano. Se fosse para lá, ela disse um dia, poderia viver muito mais tranquilo. No fundo do mar existem muitas criaturas assim, que a gente não conhece.
Meu irmão gostava de ouvir as diferentes versões para a anatomia do Monstro da Lagoa. Ele chegou a fazer um pequeno caderno com esboços, desenhos e, inclusive, algumas imagens bastante borradas do que seria o bicho. Por algum motivo, provavelmente já um sinal de seu interesse pelos jacarés, ele tinha especial queda pela pele escamosa do Monstro.
Eu gostava das narrativas que circundavam cada uma das aparições. O que o monstro fazia deitado na estrada, em 1981? Por que às vezes ele se distancia tanto do lago? Fantasiei muito para responder essas perguntas e na faculdade de História cheguei a ensaiar uma monografia sobre a relação entre mitologias populares e a construção de certos relatos antropológicos. Mas como eu queria ser um pesquisador adulto, deixei o trabalho de lado depois de quase telefonar para o meu avô para perguntar algumas coisas. E se ele achasse que eu queria brincar de novo de Monstro da Lagoa na sala do casarão?
Meu avô colocava uma máscara de gás no rosto e se escondia embaixo de uma mesa. Depois, minha avó trazia um lençol e apagava a luz e a criatura aparecia. Vai, monstro, corre atrás dos seus netos e pegue um deles pela perna. Quando ele gritar, erga-o e o abrace. Mostre o quanto você é meigo e cuidadoso. Coloque a cabeça na barriga dele, Monstro, e assopre até ele morrer de rir. Abrace todos os seus netos dentro do lençol, dessa imensa lagoa, e os leve para dormir nessa noite que eles nunca mais vão esquecer.