Postado em 10/05/2014
Zelito Viana é cineasta, produtor e diretor de TV. Dentre seus trabalhos estão a direção dos programas Chico Total e Chico Anysio Show, na TV Globo, apresentados pelo humorista e seu irmão, Chico Anysio. No cinema, foi produtor de Cabra Marcado para Morrer, de Eduardo Coutinho, e O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, de Glauber Rocha. Dirigiu Villa Lobos – Uma Vida de Paixão e Augusto Boal e o Teatro do Oprimido, que o SescTV exibe neste mês.
Como o cinema e a TV entraram na sua vida?
Meus primeiros contatos profissionais com o audiovisual ocorreram a convite de Leon Hirszmann, que era meu colega de turma na Escola Nacional de Engenharia do Largo São Francisco, no Rio de Janeiro. Comecei tentando terminar o Cabra Marcado pra Morrer, dirigido por Eduardo Coutinho [no qual participou como produtor], o que viria a fazer 20 anos depois.
No documentário Augusto Boal e o Teatro do Oprimido você conta que a motivação para realizar o filme foi a história relatada por ele a respeito do trabalho com as empregadas domésticas. Em que aspectos esse fato mexeu contigo?
Augusto Boal era para mim um ídolo. O trabalho dele no Teatro de Arena, em São Paulo, e no Teatro Opinião, no Rio de Janeiro, eram objetos da minha admiração. Tive o privilegio de conviver com ele mais proximamente e de ser seu amigo. Quando fiz a primeira entrevista para um futuro documentário, descobri em Boal outra grande vocação sua, que era a de contador de histórias. Particularmente, a história das Marias [sobre o trabalho de oficinas teatrais feito com um grupo de empregadas domésticas] me tocou pela sua sensibilidade.
O filme é rico em imagens de inúmeras passagens do trabalho de Boal, no Brasil e no exterior. Como foi o trabalho de pesquisa para reunir e organizar esse material?
Para realizar este documentário contei muito com a colaboração da Cecília Boal [viúva de Augusto Boal], que me abriu os arquivos fotográficos da família. Já para ter acesso aos filmes usados como referência de imagem neste documentário, conseguimos com os diversos grupos do Teatro do Oprimido pelo mundo afora, que foram extremamente generosos.
Quais foram os desafios para produzir o filme? Havia um roteiro pré-determinado ou a entrevista com Boal foi a orientadora do processo?
O grande desafio para produzir o filme foi a morte imprevista de Augusto Boal [em maio de 2009]. A partir do falecimento dele, tudo mudou e fomos obrigados a editar o material que tínhamos e abdicar do que estava previsto. A experiência de entrevistar o Boal tinha sido fantástica. Boal, como mencionei, era um excepcional contador de histórias. As entrevistas terminavam sempre com muito pesar de toda a equipe.
Augusto Boal defendia uma postura transformadora sobre a vida e seu modo de viver inspirou outros trabalhos, muito além do teatro e das artes, em diversas partes do mundo, como mostra o documentário. Seu discurso encontra ecos na sociedade atual?
Eu acredito que a proposta de Augusto Boal e do Teatro do Oprimido é cada vez mais atual, mas, infelizmente, o resultado vai se tornando cada vez mais remoto. Tomara que seu discurso continue encontrando espaço nos dias de hoje, pois os valores defendidos por Boal são (ou deveriam ser) conquistas do ser humano. A humanidade está carente dos valores e sentimentos defendidos pelo Teatro do Oprimido.
Como você avalia a atual produção de documentários no Brasil? E de que forma a televisão pode contribuir para o debate a respeito da contribuição de outras linguagens artísticas – como o teatro – para a vida em sociedade?
Minha avaliação pessoal é de que o documentário brasileiro vive um momento extremamente fértil, sobretudo com a vigência de lei da televisão por assinatura. E acredito, sim, que a televisão é, sem sombra de dúvidas, o grande meio de divulgação e discussão de ideias. É assim em todo o mudo, mas particularmente no Brasil, dada a sua extensão geográfica e o baixo grau de escolaridade.