Postado em 01/11/2000
Investimento privado superior a R$ 100 bilhões revoluciona mercado
Neste exato momento cerca de 52 milhões de pessoas podem estar se comunicando por meio de aparelhos telefônicos, fixos ou móveis, no Brasil. Para se ter uma idéia do salto que esse número representa, basta lembrar que há apenas seis anos, em 1994, só 14 milhões de brasileiros tinham acesso a ligações telefônicas de seus próprios aparelhos. Milagre? Quase. O nome do santo, na verdade, foi o programa de privatização do Sistema Brasileiro de Telecomunicações (Telebrás), que tirou do Estado, sem recursos, a tarefa de interconectar o país por meio da telefonia e deu ao capital privado, nacional e internacional, a possibilidade de explorar o aparentemente inesgotável mercado das comunicações.
A liberação das forças do livre mercado no Brasil, um país então refém de um serviço de telecomunicações caótico, mas dono de um dos maiores potenciais comerciais de telefonia do mundo, acabou sendo explosiva. Graças à superdemanda dos centros urbanos e à avidez por boas oportunidades de negócios, o capital globalizado atendeu rapidamente ao chamado do governo. Desde o histórico leilão das 12 empresas estatais de telefonia que compunham a Telebrás, em julho de 1998, até hoje, o Brasil conseguiu canalizar bilhões de dólares para as telecomunicações, recursos que, sem a privatização, não estariam disponíveis. Esse investimento maciço trouxe mudanças tão expressivas que, para os especialistas, o usuário brasileiro, domiciliar ou corporativo, está vivendo um momento revolucionário.
"Sem dúvida, apesar dos inúmeros problemas que ainda subsistem, a abertura do mercado de telefonia está provocando uma revolução no Brasil, especialmente no que diz respeito à possibilidade de grande parcela da população, antes excluída, ter acesso a esse tipo de serviço", declarou Pérsio Nogueira, técnico da empresa de consultoria Austin Asis, detentora do principal banco de dados econômico-financeiros da América Latina. Para ele, contudo, a maior mudança no país está sendo de mentalidade, tanto por parte dos consumidores como do governo. Entre os primeiros, de acordo com Nogueira, passou a vigorar a consciência de que se pode e se deve ser bem atendido, de forma rápida e eficiente, pelas operadoras. Por parte do segundo, começou a ocorrer uma abordagem inusitada para os padrões brasileiros: passou-se a privilegiar o usuário, em vez de atender primeiramente, como sempre foi mais comum, as exigências e conveniências de fabricantes e empresários.
"O governo está mostrando que está no caminho certo", acrescentou Boris Przechacki, diretor da área de telecomunicações da empresa de assessoria Arthur D. Little, responsável por boa parte do processo de consolidação do setor de teles em várias partes do mundo, inclusive no Brasil. "A sensação de que as coisas ainda não chegaram ao ponto em que deveriam estar é, em parte, resultado do imenso passivo anterior à privatização, ou seja, atender satisfatoriamente a demanda brasileira de telefonia acumulada durante tantas décadas, com todos os seus problemas, seria impossível neste período tão curto de atuação do capital privado no setor", disse Przechacki.
Especialistas como Przechacki e Nogueira concordam que o sinal verde dado pelo então ministro das Comunicações, Sérgio Motta, artífice da abertura do mercado de teles, desencadeou um processo tão amplo de transformações que seu alcance e conseqüências ainda estão para ser totalmente apreendidos. Após o desembarque da Portugal Telecom e da France Telecom, seguidas dos espanhóis da Telefônica e das multinacionais de telecomunicações da América do Norte, como a MCI WorldCom, BellSouth e Bell Canada, o Brasil mudou, ou melhor, a densidade telefônica (medida pelo número de aparelhos disponíveis em grupos de cem habitantes) cresceu rapidamente. Com as multinacionais das telecomunicações aliadas ao capital nacional privado de fundos de pensão, como Previ e Telus, e bancos de investimentos, como Opportunity e Safra, o acesso à rede de transmissão de voz deu um salto gigantesco: de 15%, antes de julho de 98, a densidade telefônica brasileira, de telefonia fixa e móvel, passou a 25,9% em 1999, e deverá chegar a 54,7% em 2003. Segundo as previsões oficiais do governo, se nesse cálculo forem computados também os aparelhos da planta instalada de telefones de uso público (TUPs), os "orelhões", a densidade cresce mais um pouco. Até dezembro, os orelhões serão cerca de 1 milhão de unidades em operação por todo o país.
Primeiro Mundo
Feliz da vida com o êxito e os desafios do gigantesco projeto de privatização das telecomunicações brasileiras, Renato Guerreiro, o presidente da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), que tem por função fiscalizar a atuação das empresas concessionárias no cumprimento das metas de universalização do sistema, estima que até 2005, quando deverão estar concluídas as diversas fases de abertura e o mercado estará completamente imerso na competição global, mais de 65% da população do país, então na marca dos 180 milhões de habitantes, deverão ter suas necessidades de comunicação atendidas por um contingente de 116 milhões de aparelhos telefônicos. Ou seja, em cinco anos haverá, em média, mais de um aparelho conectado para cada dois habitantes, índice hoje encontrado apenas em nações do chamado Primeiro Mundo. Dentro de meia década, também segundo previsões da Anatel, deverá estar ocorrendo um outro fenômeno de forte apelo comercial: o número de aparelhos celulares em uso no Brasil empatará com o de telefones fixos.
O novo e surpreendente cenário da telefonia brasileira também está trazendo a relevante contribuição de incluir o setor rural na era das telecomunicações, acabando com um atraso histórico e, a exemplo do que ocorreu em outros países, levando a uma integração sem precedentes das várias regiões econômicas, anteriormente afastadas pelas enormes distâncias geográficas.
"Os números dos últimos dois anos mostram claramente que há um grande avanço no sistema telefônico nacional e, com a entrada em operação das empresas espelho (criadas para suprir áreas não cobertas pelas operadoras que adquiriram as ex-estatais e também para acirrar a competição por preço e qualidade dos serviços), deverá ocorrer um expressivo crescimento do sistema fixo", afirmou Guerreiro. "A consolidação do processo de competição tende a acabar com a demanda reprimida e dar um novo cenário às telecomunicações brasileiras", acrescentou o presidente da Anatel.
Para provar que o Estado realmente não poderia dispor de recursos materiais para empreender a gigantesca tarefa de instalar uma planta com 58 milhões de acessos (linhas) e uma rede de alta complexidade para atender outros 58 milhões de celulares, a Anatel divulgou uma versão atualizada do estudo "Perspectivas para Ampliação e Modernização do Setor de Telecomunicações" ("Paste") no qual estão previstos, até 2005, investimentos totais no setor de R$ 112,2 bilhões (US$ 62,2 bilhões). Só para a telefonia fixa, que continua sendo a prioridade do governo e, por suas características técnicas, tem uma demanda maior de capital por usuário, estão orçados gastos de R$ 11,8 bilhões em 2000, de um total geral, para todos os serviços de telecomunicações previstos no ano, de R$ 19 bilhões. Na telefonia celular, os gastos para este ano, bem menores, estão sendo estimados em R$ 4,2 bilhões. Nos anos seguintes, contudo, o volume de recursos alocados para atender as metas do governo tomará caminhos opostos: cairá gradativamente no caso da telefonia fixa, e subirá, no mesmo ritmo, no setor celular. Em 2005, data limite das previsões do atual "Paste", a curva dos investimentos deverá mostrar um importante cruzamento, quando os gastos em telefonia fixa fecharem o ano em R$ 6,8 bilhões e os do sistema móvel, pela primeira vez, chegarem à posição de liderança, com aplicações da ordem de R$ 7,8 bilhões. "Antes da privatização, a Telebrás dispunha de verba anual de R$ 2 bilhões, ou seja, seriam necessários 50 anos para o governo investir o que foi aplicado em dois anos", lembrou Przechacki.
Esse volume extraordinário de recursos está sendo rateado entre as 80 concessionárias atualmente em operação no Brasil: 38 de telefonia fixa e 42 de ligações celulares das bandas A e B. Nos cálculos da Anatel ainda não foram computados os novos investimentos que já começam a ser realizados pelas chamadas "espelhinhos", empresas de telefonia fixa que operarão em municípios desassistidos por concorrentes das estatais privatizadas, e pelas operadoras que explorarão a banda C, de telefonia celular, a partir de 2001. No total, o país terá cerca de 500 dessas novas operadoras de telefonia, que deverão ocupar áreas cujo mercado as empresas das bandas A e B, por deficiências de infra-estrutura ou decisões estratégicas, não têm interesse em explorar.
Só a Telefônica, grupo de capital espanhol que detém a concessão para explorar a telefonia fixa do estado de São Paulo e a banda A nos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia e Sergipe por meio da Tele Sudeste Celular e da Tele Leste Celular, prevê investir R$ 34,2 bilhões no Brasil entre 1999 e 2001. Considerado atualmente como o conglomerado empresarial que mais aposta no país, esse grupo, desde que assumiu as operações da Telesp, em agosto de 1998, já colocou em funcionamento cerca de 4,5 milhões de novas linhas no estado de São Paulo, alcançando antecipadamente a meta de 10,8 milhões de linhas estipulada pela Anatel para o ano 2001. Segundo Fernando Xavier Ferreira, presidente da Telefônica no Brasil, a expectativa é de, até meados de 2001, acabar com a demanda de telefonia fixa ainda existente no estado paulista, calculada em cerca de 3 milhões de linhas, encerrando de vez com a desagradável fila de espera pelo telefone próprio.
"Para atingirmos esse objetivo estamos imprimindo um ritmo de trabalho recorde e uma nova linha é instalada no estado de São Paulo a cada 15 segundos, de domingo a domingo, inclusive nos feriados", afirmou Ferreira.
Atividade igualmente frenética vem sendo adotada pela holding Telemar, que opera em 16 estados brasileiros, nas regiões norte, nordeste e sudeste. Considerada a maior rede de telefonia fixa do país, a Telemar, também segundo dados atualizados da Anatel, opera 10,4 milhões de acessos fixos, seguida pela Telefônica, com 9,5 milhões, e a Brasil Telecom (ex-Tele Centro Sul), em terceiro, com 5,2 milhões. "As três grandes operadoras de telefonia fixa brasileiras, depois de um período inicial confuso e de uma avalanche de reclamações dos usuários nos Procons estaduais, estão acertando o passo e conseguindo superar metas projetadas pelo governo", admitem os técnicos da Anatel.
A Telemar, com investimentos de R$ 2 bilhões neste ano, pretende chegar a dezembro com uma rede de 12 milhões de acessos fixos, a Telefônica alcançará até o fim do ano 11 milhões de linhas instaladas, e a Brasil Telecom, controlada pela Telecom Italia Mobile (TIM) e pelo Banco Opportunity, exibe números que, incluindo a malha da gaúcha CRT, recentemente adquirida da Telefônica, devem atingir 7 milhões de acessos nos estados do centro-oeste e sul do país. Em todos esses casos, o resultado obtido superou as estimativas mais otimistas, o que, para os analistas da Anatel, aponta para um futuro cada vez mais promissor nas telecomunicações brasileiras.
Mesmo em segundo lugar em volume de acessos fixos, a Telefônica garantiu ao estado de São Paulo uma densidade telefone/usuário bem maior que a da Telemar. Disparado, o estado paulista lidera o ranking das regiões mais bem atendidas pela rede de telefonia fixa do país. De acordo com números divulgados pelo Ministério das Telecomunicações, São Paulo está atualmente com uma densidade de 27 linhas para cada grupo de cem pessoas. Esse alto índice, superior à média nacional, estimada em 20 linhas por grupo de cem habitantes, contribuiu para igualar o Brasil aos vizinhos do Mercosul, como Chile e Argentina, também na faixa de um telefone para um contingente médio de cinco pessoas.
Classes C e D
A expansão da rede de telefonia brasileira trouxe ainda uma importante contribuição. Apesar de estar concentrada em regiões mais ricas do país, o acesso ao telefone particular é hoje uma realidade também entre as camadas mais pobres da população. No estado de São Paulo, por exemplo, segundo dados divulgados pela Telefônica, a quantidade de aparelhos instalados para as classes C e D vem triplicando desde 1998. Em residências da classe D, o número de telefones instalados saltou, de uma faixa de 11,3% dos assinantes da empresa, quando assumiu o controle da Telesp há pouco mais de dois anos, para 30% atualmente. Nesse mesmo período, os assinantes da classe C, que representavam 35,5%, formam hoje um contingente de 57%. Essas novas faixas percentuais indicam maior aproximação do acesso à realidade econômico-social do país, embora permaneçam as distorções.
Entre as maiores distorções, sem contar o custo ainda proibitivo das tarifas, que conduziu uma grande parcela dos usuários à inadimplência, especialmente a clientela da telefonia celular, os analistas apontam a ainda incipiente concorrência entre operadoras de telefonia fixa. As empresas espelho, comparadas às ex-estatais, não possuem, ainda, poder de fogo para desencadear uma real guerra de preços por assinatura e tarifas. A única exceção, no caso, é a Intelig, espelho da Embratel na telefonia de longa distância, que, efetivamente, vem impondo um regime de concorrência direta com a rival, graças, principalmente, a uma vigorosa campanha publicitária a respeito da qual a empresa resguarda o direito de não divulgar o polpudo capital investido.
Para se ter uma noção da disparidade de tamanho entre ex-estatais e espelhos, basta verificar os números da Telefônica e da Vésper SP. Dados das próprias empresas mostram que, de janeiro a agosto de 2000, enquanto os clientes da Telefônica chegavam a 8 milhões, os da Vésper, em São Paulo, atingiam 50 mil. No caso da Telemar, para os 12 milhões de clientes cadastrados da holding de telefonia fixa nas regiões sudeste, norte e nordeste, a Vésper S.A. também exibia um volume não superior a 50 mil usuários. Nesse universo, a única espelho que efetivamente conseguiu exibir uma boa sombra sobre a ex-estatal foi a Intelig. Atualmente, a empresa informa ter 6 milhões de clientes cadastrados, exatamente a metade dos 12 milhões da Embratel.
O caso Intelig-Embratel é sempre citado pela Anatel como um modelo de concorrência a que se pretende chegar no Brasil. Ambas estão desencadeando uma guerra de tarifas para atrair os usuários, num processo que vem derrubando os preços das ligações de longa distância, num cenário, de acordo com os técnicos da Anatel, em que todos ganham: os clientes, que desembolsam cada vez menos por serviços crescentemente melhores, e as empresas, que, ao conseguirem reduzir os preços, obtêm ganhos de escala com volumes de chamadas também em constante expansão. O resultado disso pôde ser exibido pelos bons números da Embratel no primeiro trimestre de 2000. Apesar do avanço da concorrente, a ex-estatal controlada pela americana WorldCom apresentou crescimento de 20% na receita com operações de voz. Na transmissão de dados, uma das prioridades da empresa no segmento corporativo, o salto de receita chegou a 57%.
Com o argumento de que tamanho, por si só, não ganha cliente, a Vésper contra-ataca alegando que o mercado, hoje, pode também ser segmentado. "Acreditamos que o diferencial da qualidade do atendimento e dos produtos e serviços oferecidos é o nosso grande trunfo de mercado e, até o momento, estamos tendo sucesso em nossa iniciativa", argumentou Eduardo Octaviano, vice-presidente de Comunicação Corporativa da Vésper. "Estamos nos estruturando para ser a melhor empresa de telecomunicações do país, disponibilizando produtos e serviços de voz e dados com tecnologia de ponta, atendimento diferenciado e preços competitivos."
A Vésper, controlada pela Bell Canada e Qualcomm, é uma empresa de telefonia fixa e de comunicação de dados, com atuação em segmentos específicos e que centraliza esforços nos mercados residencial e corporativo, em sistemas de transmissão de voz e dados para companhias pequenas e médias. Até 2002, a empresa planeja gastar R$ 1,1 bilhão só no estado do Rio de Janeiro, e difundir pelo país sua tecnologia WLL (Wireless Local Loop), chamada de telefonia fixa sem fio, também em constante evolução para atender as exigências do mercado. Entre as novidades que estão sendo oferecidas pela Vésper está a de o cliente corporativo ter opção de uso de cabos de fibras ópticas a uma velocidade suficiente para transmissão de mensagens e transferência de arquivos.
Em trânsito
Paralelamente ao mercado de telefonia fixa, o Brasil, no curto período de dez anos, criou uma das mais surpreendentes redes de telefonia móvel da América Latina. Até há bem pouco tempo, exibir um celular no trânsito, num restaurante ou no ambiente de trabalho era sinônimo de status social. Somente profissionais bem-sucedidos ou pessoas de camadas mais abastadas da população podiam pagar os altos preços da habilitação e das chamadas. Em 1990, a habilitação de um celular chegou a custar US$ 20 mil e, em todo o país, o número de aparelhos em circulação era pouco mais de 500. Meia década depois, a rede já somava 1,4 milhão de aparelhos. Dados consolidados da Anatel relativos ao primeiro semestre mostram que a quantidade de celulares em circulação no Brasil supera a marca dos 16 milhões, dois terços deles da banda A. O salto mais importante, contudo, foi o da banda B, que saiu do zero em 1997 para chegar aos 4,7 milhões de usuários atualmente.
Ainda em fase de consolidação, a telefonia móvel muda quase que diariamente. No início, 100% da planta instalada era pós-paga. Com a chegada da banda B e do sistema pré-pago, a partir de 1999, todo o cenário se alterou. Hoje o acesso pré-pago soma 51% do total de ligações de telefonia celular no Brasil, e a banda B é responsável por 30% de todos os aparelhos móveis em circulação no país.
"Temos razões para acreditar que o celular, em menos tempo do que prevê a Anatel, se tornará o meio de comunicações número um do país", previu José Luís de Souza, vice-presidente comercial da Tess, operadora de telefonia móvel da banda B no interior do estado de São Paulo e litoral. Tido como um dos maiores experts brasileiros em telecomunicações, Souza atribui a febre do celular, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo, ao fascínio produzido por um aparelho que, por suas características básicas, consegue personalizar a comunicação. "As pessoas precisam de modernidade", disse ele, "e o telefone fixo, por mais aparelhos que um domicílio possa instalar, terá sempre a cara da família, do uso compartilhado", acrescentou.
Os dados da Anatel mostram que o sistema móvel celular está abrindo caminho não apenas na quantidade, mas também na variável da qualidade. Assim como procedeu com a telefonia fixa, a Anatel assinou protocolos com as operadoras de telefonia celular, que se comprometeram com o órgão regulador das telecomunicações brasileiras a melhorar o desempenho em nove índices que medem a qualidade do setor: taxa de reclamações, queixas de congestionamento, atendimentos dos call centers, taxa de resposta do usuário, atendimento ao público, número de contas com reclamação de erro por grupo de mil contas emitidas, taxa de chamadas originadas completadas, taxa de estabelecimentos de chamadas e taxa de queda nas ligações. Desses nove indicadores, a Anatel reconheceu que as operadoras de telefonia móvel já haviam alcançado, no primeiro semestre, as metas previstas para junho de 2001.
Junto com a necessidade de comunicação tradicional via telefônica, o celular também agregou hábitos e ampliou a capacidade de interlocução do brasileiro a níveis até então inéditos. Em várias camadas sociais, crianças de até 12 anos são atualmente usuárias de seu próprio aparelho. Houve casos de escolas de classe média alta que tiveram de pedir o desligamento dos celulares, por causa da interferência até então impensável de mães e pais dentro das salas de aula. Nos automóveis, o uso do telefone tornou-se a cena mais característica do usuário de celular. Mas pessoas caminhando em supermercados, shopping centers ou mesmo nas calçadas, enquanto falam em seus aparelhos, são hoje lugar-comum nas cidades.
Cada vez mais exigente, o consumidor, especialmente o corporativo, não pode mais prescindir da utilização do telefone para suas necessidades de fluxo de informações também via fax, transmissão de dados e acesso à Internet. Garantidos na telefonia fixa, que já alcança alto grau de digitalização da rede com os cabos de fibra óptica, os serviços de acesso à Internet e à possibilidade de comunicação por e-mails começam a ser realidade também para os usuários de telefonia celular. Na verdade, a aliança do celular com a Internet é a grande novidade no setor de telefonia móvel no mundo, e o Brasil, totalmente inserido na rede global de telecomunicações, já tem suas experiências piloto ganhando as primeiras fatias de mercado.
A fase do protocolo de aplicativos para Internet (que atende pela sigla em inglês WAP, correspondente a Wireless Access Protocol) nas empresas de telefonia celular, que optaram por aparelhos tanto de tecnologia CDMA quanto TDMA, já é realidade no país. A BCP, por exemplo, uma das três principais operadoras de telefonia móvel brasileira, está anunciando para outubro-novembro o acesso, para os seus 2,3 milhões de clientes (1,5 milhão só no estado de São Paulo), ao universo da Internet, que permitirá ao usuário enviar e receber e-mails e visualizar na tela do aparelho alguns sites especiais com noticiário e informações gerais.
A Tess, que já trabalha com aproximadamente 650 mil clientes no interior e no litoral paulistas, já está com tudo pronto para ingressar na nova era da telefonia sem fio que agrega recursos de multimídia. "Faltava-nos o aparelho WAP para a tecnologia TDMA", afirmou Souza, acrescentando que os fabricantes tinham prometido para outubro o lançamento do celular compatível para o mercado brasileiro – "pouco tempo depois de ele ter estreado no mercado europeu".
A febre das comunicações sem fio está atingindo tamanha dimensão que os grandes fabricantes de aparelhos de telecomunicação, como Ericsson, Nokia e Motorola, desencadearam outra corrida tecnológica para oferecer ao consumidor mundial o celular que transmite voz, imagens e dados, no que se convencionou chamar de "a terceira geração" da telefonia móvel. De acordo com os especialistas o aparelho poderá ser dominante no setor das telecomunicações globais em poucos anos. A emergência das redes baseadas em Internet Protocol (IP), para convergir os serviços de dados, texto, vídeo e voz, é um indicador de que o caminho por onda seguirá a revolução das telecomunicações. O impacto das novas tecnologias na maneira como as pessoas se comunicam (e as empresas faturam) será grande. Calcula-se que as tarifas das chamadas internacionais realizadas por meio da Web farão simplesmente desaparecer fronteiras. Ligar para o vizinho da rua ou uma pessoa do outro lado do mundo terá, rigorosamente, o mesmo preço. Já em 2002-2003, na avaliação dos especialistas, a diferença de uma ligação internacional para uma chamada doméstica, atualmente na casa dos 300%, não irá além de 20%.
Dentro desse novo cenário, o faturamento dos serviços de telecomunicações voltados para Internet, aluguel de linhas e transmissão de dados praticamente triplicará em todo o mundo. De uma indústria que ganhou em 1998 aproximadamente US$ 750 bilhões, a expectativa é chegar a US$ 1,1 trilhão em 2005. O mercado de equipamentos, sozinho, será responsável por um quarto, ou cerca de US$ 400 bilhões.
Espelho dessa realidade da indústria da informação é o recente processo de fusões e aquisições entre companhias, agora complementares no segmento multimídia de telefonia. No Brasil, os dois exemplos mais conhecidos são o da Telefônica com o portal Terra e o da Portugal Telecom, controladora da Telesp Celular, com o Zip.net. A expectativa é que nesse mercado de US$ 1 trilhão novas e sensacionais parcerias venham a ser anunciadas no amplo processo de consolidação das telecomunicações globais.
Motor da nova economia, a revolução nas telecomunicações, tanto no Brasil como no resto do mundo, aproximará cada vez mais as pessoas, eliminará fronteiras geográficas e, mais do que nunca, dará o sentimento de ubiqüidade aos seres humanos. No entanto, a tecnologia, por si só, não acabará com as desigualdades sociais e, a exemplo do que já ocorre em diversas partes do planeta, estão sendo distinguidos os cidadãos integrados à era da informação dos habitantes de segunda categoria, definidos por sua falta de acesso à Internet e à telefonia.
A escola pública conectada
Numa iniciativa para tentar reverter a ameaça de a sociedade tecnológica começar a produzir cidadãos de segunda classe, sem meios para usufruir da modernidade multimídia que toma conta do mundo afluente, o governo vem buscando incentivar empresas e patrocinadores privados a investir nas escolas públicas brasileiras para que os estudantes menos privilegiados também possam ter acesso aos computadores e à informação sem limites contida na Internet.
Em parceria com a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, o Grupo Telefônica é um dos pioneiros na implantação de um programa que levará Internet de alta velocidade, com agilidade de acesso às páginas dos provedores, a 2.170 escolas públicas paulistas. A estimativa da Telefônica e do governo paulista é de que 3,3 milhões de estudantes de baixa renda, em 500 municípios, além de cerca de 100 mil professores, tenham acesso gratuito ao serviço. O projeto piloto da Telefônica foi na escola Professor Ascendino Reis, no bairro do Tatuapé, na capital paulista.
Até o fim do ano, o acesso à rede mundial de alta velocidade chegará a mais de cem escolas. Segundo a Telefônica, trata-se de uma antecipação ao projeto anunciado pelo ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, que oferecerá, a partir de 2001, com recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), conexão com a Internet a todas as escolas brasileiras.
O acesso em alta velocidade possibilita, por exemplo, baixar arquivos em poucos segundos, transmitir imagem e som em alta definição, deixar a linha telefônica liberada para outras ligações e acesso à Web sem discagem. A expectativa do governo e dos patrocinadores é de que esses recursos permitam o desenvolvimento de estudos, pesquisas e projetos pedagógicos e a interatividade entre as escolas do país entre si e com pólos irradiadores de estudos. O tema ganha maior vulto quando, segundo pesquisas oficiais, apenas 2% dos domicílios brasileiros têm acesso à Internet e menos de 1% das escolas públicas dispõem do recurso.
Seguindo os planos da Telefônica, a Telemar também criou o Projeto Telemar de Educação, que irá beneficiar escolas públicas dos 16 estados da área de concessão da empresa. Com a iniciativa, que seria lançada em outubro, a operadora vai levar computadores a cerca de mil instituições do interior do Brasil, até 2004. Segundo a companhia, o projeto demandou investimentos da ordem de R$ 35 milhões e inclui a doação de cinco micros conectados à Internet para cada unidade escolar.
Com o objetivo de criar comunidades virtuais entre as escolas, a Telemar pretende estimular os grupos a produzir trabalhos pedagógicos, com temas relacionados à realidade de cada região. O projeto piloto para este ano estará beneficiando 16 escolas, uma em cada estado, informou a companhia. A Telemar tem planos de ajudar mais 150 estabelecimentos de ensino no ano que vem e outros 300 em 2002. Para desenvolver o projeto, a operadora conta com a experiência de orientadores da Escola do Futuro, da Universidade de São Paulo (USP), que já treinaram 80 professores. A área de concessão da empresa engloba os estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí, Maranhão, Pará, Amapá, Roraima e Amazonas.