Postado em 15/05/2014
O samba no pé, o breque, a bossa, a batida na latinha de graxa, as piadas e a picardia são as marcas registradas de Germano Mathias. É com esse mestre do samba sincopado que os frequentadores do SESC Osasco tem encontro marcado, neste sábado, 17 de maio, para gingar ao som do Catedrático do Samba
Paulistano do Pari, ele nasceu em 1934 e cresceu numa São Paulo que ouvia o samba que reinava no rádio, a grande mídia da época. Como ele mesmo diz, “especialmente aqui e no Rio, esse tipo de samba que eu canto, que é um samba-gafieira, o samba sincopado, que agora chamam de samba-raiz, ou samba-tradição, esse samba imperava.”
O garoto logo se encantou com aquela música. “Ninguém aprende a ser cantor” – diz ele – “a pessoa nasce cantor, e isso é inato em mim... e desde criança eu tive essa predileção pela música brasileira, principalmente pelo samba raiz, o samba sincopado.” Na verdade o fascínio de Germano começou na Praça da Sé, no ritmo das batucadas dos engraxates nas caixas de madeira e latas de graxa ou jogando tiririca, jogo onde a meta é derrubar o adversário numa roda enquanto o samba é cantado por todos. Lá ele se iniciou na ginga, no canto e na percussão, da qual seria mestre: “eu tocava surdo, pandeiro, tamborim, agogô, reco-reco, tocava todos os instrumentos de percussão que se usam no samba”, lembra.
Jovem, boa pinta, destemido, talentoso, ainda adolescente, encontrou lugar nas rodas de bambas da cidade. “Eu freqüentava as gafieiras. Tinha o Amarelinho, na Praça João Mendes, na parte de cima da Padaria Santa Teresinha. Um dia lá teve uma briga e me deram uma cadeirada... porque eu era metido a valente, sabe? E acordei no hospital.,. – e ele alude, brincando e ritmando, ao real motivo da briga: “pra olhar não se paga nada. / com os olhos se ganha remela, / e com as costas borrachada”.
Risadas à parte, a gafieira era coisa séria nas décadas de 1940 e 50: “tinha também o Caçamba, na (rua) Quintino Bocaiúva, e uma outra em Osasco, chamada Baile do Risca-Faca. Era um ambiente de samba...”. Naquele ambiente Germano ouviu as vozes de Ciro Monteiro, Aracy de Almeida, Moreira da Silva, as irmãs Linda e Dircinha Batista e outras, que não esqueceu: “da velha guarda os bons eram Jorge Veiga, o Caricaturista do Samba, Risadinha, Blackout, o Ari Cordovil... Quem eu considerei o meu mestre foi o sambista Caco Velho, um gaúcho, que era chamado o Sambista Infernal. Eu entrei nas águas dele, eu entrei no gênero que ele cantava".
Em cena, Caco Velho, esbanjava a bossa, o improviso e o ritmo que Germano herdaria, mas não sem antes passar pelo batismo de todo sambista digno do nome – o desfile de Carnaval: “a primeira escola de samba que eu saí foi a Rosas Negras [na ala das frigideiras], ali na rua Castro Alves. depois saí na Lavapés, na rua do mesmo nome, e fui assim até entrar pra o rádio e me tornar profissional”.
Na verdade, antes dos 18 anos Germano já tinha ganhado tantos prêmios nos programas de calouros da Rádio Nacional que a contratação só não saiu porque foi convocado para o Exército. Mas no Quartel de Quitaúna ele virou o Moleque Madureira só pelo jeito como cantava Chorou Madureira, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira. E assim que largou a farda, reinou no microfone. Venceu em 1955 o concurso À Procura de um Astro, da Rádio Tupi, que estava em busca de um substituto do ídolo Caco Velho, então mudado para Paris, onde chacoalhava a boite La Macumba.
Contratado das Emissoras Associadas Germano entrou nos estúdios da Polydor para gravar seu primeiro disco em 78 rotações, o degrau que faltava para o estrelato. “O sucesso veio por causa da minha maneira de me apresentar, eu faço um malandro da velha guarda, aquele que não tem problema, igual rico: ri à toa” – diz rindo.
Seu primeiro LP, Germano Mathias, o sambista diferente, impactou muitos, pela criatividade rítmica, inclusive o jovem Gilberto Gil. Ainda em 1958, outro sucesso ritmado: Guarde a sandália dela (em parceria com Sereno, depois gravado por Elis e Jair Rodrigues). Na seqüência, o LP Em Continência ao Samba, com os hits Lata de graxa (de Mário Vieira e Geraldo Blota) e Tem que ter Mulata, do então jovem gaúcho Túlio Piva, pois Germano sempre foi artista que reconhecia outros talentos. E é assim até hoje, quando diz (do seu jeito desbocado): “na minha turma tem um sambista muito discriminado, mas é grande, o Luís Américo. Ele é muito bom, quando encontro com ele sempre pergunto: você não quer me vender um pouco da tua voz? Porque a minha voz tem cinco Fs: ela é fina, feia, fraca, fedegosa e fuleira.”.
De fato, embora autor de inúmeras gravações históricas, com quase seis décadas de carreira e mais de 20 álbuns, Germano Mathias segue, acima de tudo, como um genial performer de palco e improviso. O samba no pé, o breque, a bossa, a batida na latinha de graxa, as piadas e a picardia são suas marcas registradas. É com esse mestre do samba sincopado que os frequentadores do Sesc Osasco tem encontro marcado, neste sábado, 17 de maio, para gingar ao som do Catedrático do Samba. E para rir com seus casos e rimas, como essa: “A mulher é a flor mais bela que Deus no mundo botou, / mas foi por causa dela que o Paraíso se acabou. / A história da maçã é pura fantasia. / Maçã igual aquela o velho aqui também comia.” Bom Samba! E boas risadas a todos!