Postado em 27/11/2013
Sons, vozes e cheiros vindos de diferentes locais iniciam a experiência pela qual passam os espectadores de O Grande Viúvo, peça de teatro baseada no conto homônimo do escritor e jornalista Nelson Rodrigues e parte do livro A Vida como ela é. O espetáculo que propõe ao público uma experiência estética baseada em todos os sentidos, com exceção da visão, é uma adaptação feita pelo projeto Teatro Cego e se apresenta no Sesc Pompeia nos dias 30 de novembro e 1 de dezembro, integrando a programação da 4ª Virada Inclusiva. No dia 5 de dezembro o Sesc Campinas e nos dias 6, 7 e 8 de dezembro o Sesc Belenzinho recebem a montagem.
Se o estímulo visual é considerado um dos elementos mais importantes do teatro, a montagem do diretor Paulo Palado inverte essa referência. Em um espaço totalmente escuro, atores cegos e não cegos encenam o texto de Nelson Rodrigues. "Escolhemos um conto desse autor porque seu universo já é mais conhecido do público, o que nos ajudar a antecipar o início do espetáculo, algo fundamental, se tratando de teatro cego. E não deixa de ser uma forma de não dispersar a plateia, que não tem a visão para se situar", conta o diretor em entrevista ao Sesc Pompeia. O público acompanha a narrativa sem enxergar nada, apenas amparada pela audição, olfato e tato.
No enredo, um homem, após o falecimento de sua esposa, avisa aos filhos: também deseja morrer e ser enterrado ao lado de sua companheira. Enquanto o viúvo busca meios de construir o mausoléu que o abrigará junto a sua falecida mulher, a família adentra a árdua tarefa de convencê-lo a desistir do suicídio. Palado comenta que a opção pelo texto de O Grande Viúvo também está ligada ao fato de haver personalidades bem específicas e distintas entre si, uma marca de Nelson Rodrigues e um fator também importante para que o público não tenha dúvidas sobre quem é cada personagem em meio à escuridão.
Além das diferenças vocais de cada um dos atores, um detalhe que o diretor aponta como importante são os sapatos utilizados, os quais também dizem algo sobre as características dos personagens em cena. "O viúvo Jair usa um sapato social, ou seja, é o homem que trabalha e busca o dinheiro para a família, diferente de outros personagens que usam chinelo ou salto alto, por exemplo", observa. Outra maneira de estimular a plateia são as flores naturais e velas que proporcionam o cheiro característico de um velório, enquanto vozes sussurram rezas e cantos. No decorrer do espetáculo, durante vários momentos, cheiro de café, perfumes, sons de portas, de escadas e respingo de água são alguns dos efeitos utilizados pelo grupo teatral para que o espectador sinta-se cada vez mais inserido no universo das sensações, que é o caminho para a compreensão desta, talvez, não tão sombria trama.
Como entender aquilo que não se vê? Apesar do grupo não ter nenhuma ligação com o Teatro Cego argentino – formato que nasceu em 1991 e ganhou endereço fixo em 2008, com o Centro Argentino de Teatro Cego, em Buenos Aires -, foi a partir dele que nasceu a inspiração para explorar esse estilo. Palado afirma que, no entanto, a maneira de deslocar os personagens, os sons, cheiros e estímulo a outros sentidos são criações próprias de seu projeto brasileiro. O Grande Viúvo estreou em 2012 e, desde então, tem se apresentado por diversos espaços. Ele acrescenta que "a ideia nunca foi convencer as pessoas a abrirem mão da visão, mas convidá-las a utilizar a aproveitar os outros sentidos, até mesmo a intuição, já que temos o costume de só acreditar naquilo que vemos".
O diretor adianta também que o Teatro Cego tem novos projetos para o ano que vem. "Queremos manter o teatro cego como um formato teatral. Planejamos fazer um musical também. A ideia é explorar textos que sejam favoráveis quando montados nesse clima de escuridão. Queremos utilizá-los também do ponto de vista simbólico, com temas como a época da ditatura, em que a escuridão também simboliza aquele período de repressão", explica Palado.
o que: | O Grande Viúvo |
quando: |
|
quando: | 5/dezembro no Sesc Campinas |
quando: | 6, 7 e 8/dezembro no Sesc Belenzinho |