Postado em 06/08/2013
Na última semana da exposição HQBR21 - O Quadrinho Brasileiro do Novo Século, que fica no Sesc Belenzinho até 11/agosto, a EOnline conversou com Alcimar Frazão, um dos curadores da mostra, sobre o processo de concepção, a escolha dos artistas, a internet e outros temas
“Começamos, Juliana Santos, do Núcleo Sócio Educativo do Sesc Belenzinho, e eu, a levantar o material e pensar em parcerias, olhando para a produção nacional. Em conversas com o Paulo Ramos, o terceiro membro da curadoria da exposição, concluímos que o ideal seria olhar pra produção dos últimos dez anos. Esse período marca uma virada importantíssima na produção nacional”, conta Alcimar do Núcleo da Imagem e da Palavra (NIP) do Sesc Belenzinho. Os principais trechos você pode conferir abaixo:
EOnline: Como foi o processo de concepção da exposição?
Alcimar Frazão: A exposição foi pensada a partir de uma perspectiva que temos na área de artes visuais do Núcleo da Imagem e da Palavra (NIP) do Sesc Belenzinho: fomentar o debate a respeito da amplitude dos caminhos da visualidade recente.
A proposta é que a variedade intencional dos temas tratados nas exposições, entre arte contemporânea, quadrinhos, fotografia, ilustração etc., sempre com o mesmo rigor, permita ao público tecer relações e diálogos entre estas linguagens e construir uma visão mais ampla da produção visual. Assim, era uma vontade do NIP se aprofundar mais na linguagem dos quadrinhos, por entender que ela é um componente cultural importante de nosso momento. Para mim, tinha também um quê de projeto pessoal, pois sou quadrinista e pesquiso a linguagem faz tempo (me alfabetizei lendo quadrinhos).
Começamos, Juliana Santos, do Núcleo Sócio Educativo do Sesc Belenzinho, e eu, a levantar o material e pensar em parcerias, olhando para a produção nacional. Em conversas com o Paulo Ramos, o terceiro membro da curadoria da exposição, concluímos que o ideal seria olhar pra produção dos últimos dez anos. Esse período marca uma virada importantíssima na produção nacional. Se a linguagem das HQs já estava presente no país desde seu nascimento, no final do século XIX, com Angelo Agostini, são nos últimos 10 anos que houve um fortalecimento expressivo do quadrinho autoral. É nessa fase encontramos autores brasileiros contando suas próprias histórias nos formatos e gêneros mais distintos. Cresce a produção de novelas gráficas, com narrativas mais longas e surgem coletivos independentes no país inteiro. Com o avanço da internet, as tiras, antes restritas aos cadernos de cultura dos jornais e a algumas revistas, passaram a pipocar em sites e blogs. Essa configuração especial se reproduz na exposição.
EOnline: Por isso ela é dividida em três eixos?
A. F.: Os eixos foram pensados a partir das formas de criação que se tornaram mais expressivas no período. Narrativas, contempla as novelas gráficas; Independentes, mostra os artistas e coletivos da produção que circula de forma alternativa; Webtiras destaca artistas cuja produção circulou pela internet.
EOnline: Como foram definidos os artistas, cujos trabalhos estão expostos em cada eixo?
A. F.: Uma vez definidos os eixos, havia diversos artistas representantes de cada um deles e cabia à curadoria destacar aqueles cuja produção melhor representava o período. Os recortes se basearam, fundamentalmente, no critério de importância estética e histórica da obra; como essa obra enfrenta e, de alguma forma, expande a linguagem, e como repercute em seu momento. Desse modo, chegamos aos representantes de cada eixo. É claro que há lacunas importantes e grandes criadores acabaram ficando de fora, mas os artistas que estão na exposição, de alguma forma, representam os artistas que não entraram.
EOnline: No texto do encarte da exposição, a internet é tratada como plataforma criativa, você poderia falar mais sobre isso?
A. F.: O uso da internet para a criação de quadrinhos é uma incógnita ainda. Se por um lado a rede ampliou expressivamente a divulgação do trabalho de artistas e grupos, dando visibilidade a coisas antes desconhecidas, por outro ela não tem sido pensada, a meu ver, como ferramenta para a linguagem. Tudo que vi até agora em quadrinhos na internet funcionaria muito melhor se tivesse sido impresso.
Os ebooks são um exemplo de como as coisas ainda estão sendo pensadas a partir do formato do códice. Acho que falta uma pesquisa mais profunda dos recursos que a internet possui para usá-los a fim de construir o tempo na relação entre as imagens e sequências narrativas.
Uma exceção a esse cenário é a tira. A internet motivou uma verdadeira revolução na forma de se pensar a criação de tiras, que agora não têm mais nem seu formato restringido pelos tamanhos reservados a elas nos jornais impressos, nem no seu campo de ação. A rede, e as redes sociais mais que tudo, ampliaram a circulação das tiras de tal forma, que hoje é comum encontrarmos criadores que se dedicam apenas à produção na internet e com grande sucesso. Mas, ainda estamos falando de circulação e divulgação, não estamos falando de formas de produzir.
EOnline: No dia 23 de julho, o jornalista Eduardo Nasi publicou um texto no portal Universo HQ (link) que trata, como coloca seu título "Uma nova forma de expor quadrinhos: HQBR21 e por que o modelo atual não serve", de refletir, a partir das percepções de Nasi durante uma visita à HQBR21, sobre o que se entende por uma exposição de quadrinhos. O que você acha do que ele coloca?
A. F.: Eu não discordo do sentido geral da crítica do Eduardo Nasi - jornalista que respeito profundamente - sobre a exposição, embora discorde de algumas premissas. A primeira coisa é uma oposição conceitual importante. Ele entende a exposição numa chave em que ela não opera. Sua crítica se baseia em "devemos repensar a forma de expor quadrinhos", conclusão com a qual concordo e na qual a exposição se baseia.
No caso da HQBR21 não se trata de uma exposição de HQs como produto (o que me parece ser o anseio dele), ou seja, exposição de revistas e livros, mas de uma exposição da linguagem, ou seja, de processos e práticas referentes à linguagem. A exposição tem a intenção de ser uma imersão no bastidor da criação de quadrinhos. A revista é uma parte importante disso, mas não a única. A página que ilustra o processo é uma parte importante disso, mas não a única. Em termos radicais, não existe necessidade de expor uma HQ. Essa linguagem não é destinada aos salões, assim como o cinema não é, a música e o futebol. E, no entanto, faz-se exposição de todo tipo com essas linguagens.
A única necessidade, na minha opinião, de fazermos exposições de coisas não "expositivas" é a de desvelar um tipo de conteúdo ao qual o público não tem acesso, e com isso, abrindo a caixa de pandora, fortalecer o diálogo sobre a criação artística.
A HQBR21 não tem a pretensão de ser uma exposição definitiva sobre HQs, mas também, com certeza, não se baseia no que o Nasi chama de padrões estabelecidos de exposições. Nesse sentido ela é bem arriscada até, ao apresentar parte do processo, ao lado das narrativas completas, e expor cada segmento de uma determinada forma, para se adequar melhor ao que quer mostrar.
Você pode ver o encarte da exposição:
Você pode assistir a uma entrevista que Alcimar Mendes cincedeu ao Programa HQ&CIA - 20/07, no canal da alltv no Youtube:
o que: | HQBR21 – O Quadrinho Brasileiro do Novo Século |
quando: | Até 11/agosto |
onde: |
Sesc Belenzinho | rua Padre Adelino, 1.000 | 11 2076-9700 |
ingressos: |
Gratuito |