A violência que há em todos nós

“Martin Crimp questiona se a violência externa, que vemos no noticiário, não está conectada à violência que existe dentro de nós mesmos”, diz o elenco de Menos Emergências, espetáculo do dramaturgo britânico que encerra temporada dias 2 e 3/agosto no Sesc Pinheiros

– Sabem sorrir, mas sabem igualmente que o tipo de sorriso que dão se assemelha muito ao tipo de sorriso que se dá quando se sorri apesar de tudo.

– Repita!

– Não posso repetir.

Dizer que o britânico Martin Crimp “desafia rótulos” é pouco. Um dos mais aclamados dramaturgos da contemporaneidade, Crimp tem em plena produção uma obra que, em conjunto, faz do palco um espaço de experimentação da palavra e de atrito entre dramas psicológicos e sociais. O trecho acima, extraído de Menos Emergências – espetáculo que encerra temporada neste final de semana no Sesc Pinheiros – é um exemplo marcante deste traço do autor britânico.

Nele, a intencionalidade do discurso de Crimp se revela a partir do jogo de sentidos ao qual o “sorriso” é submetido: o autor sugere que nos dias atuais o ato de sorrir seja mais a moldura de um retrato socialmente conveniente que a expressão genuína de momentos de alegria. “Nessa peça as situações narrativas não existem. Há apenas um plano em que as falas e os contextos são ditos, e a partir deles você pode extrair milhões de entendimentos”, explica a atriz Suzan Damasceno.

Ao adentrarmos no universo do autor, torna-se patente a sua admiração por Eugène Ionesco (1909-1994). Ecoam em suas obras a solidão e a insignificância do ser humano, temáticas caras ao dramaturgo franco-romeno: “Crimp questiona se a violência externa, que vemos no noticiário, não está conectada à violência que há dentro de nós mesmos. Sim, elas estão ligadas, porque as pequenas violências que as pessoas sofrem e cometem a cada dia contêm todo o espectro da violência que vivemos hoje. Ninguém sai ileso, mas também não se sabe exatamente a quem responsabilizar”, analisa o elenco de Menos Emergências.

Assista a cenas do espetáculo e ao depoimento completo de Donizeti Mazonas, Lianna Matheus e Suzan Damasceno no vídeo a seguir:

Mais

Sobre o dramaturgo britânico Martin Crimp

Sobre o dramaturgo franco-romeno Eugène Ionesco