Postado em 01/03/2013
Desde a Grécia Clássica, a política e a comunicação são realidades inseparáveis. Os cidadãos reunidos em assembleia debatiam e deliberavam sobre os principais temas de interesse comum. No entanto, a democracia grega era uma democracia restrita aos socialmente dominantes: mulheres e escravos não eram cidadãos, os seus interesses não eram debatidos, não possuíam voz no espaço público.
No mundo contemporâneo, há o predomínio da democracia representativa: os cidadãos, a população considerada adulta, elegem os seus governantes. Mas, será que todos os cidadãos participam do espaço público, podendo comunicar os seus interesses?
Formalmente, devido à liberdade de expressão, essa participação estaria garantida. No entanto, na prática a situação é outra. Na imensa maioria das sociedades, os cidadãos compõem uma massa de milhões de pessoas. Seria possível que todos se comunicassem com todos? Se a sociedade é de massa, a comunicação também é. A participação no espaço público depende da possibilidade de se ter acesso aos meios de comunicação de massa.
Até o aparecimento da internet, os recursos tecnológicos que permitem a comunicação de massa, devido ao seu alto custo, estavam monopolizados pelo Estado ou por grandes empresas. No Brasil, os principais veículos de comunicação (Rádio e TV) são concessões públicas administradas por empresas privadas cujo principal objetivo é o lucro. Os interesses divulgados são aqueles das empresas, a venda de serviços e produtos. As ideias divulgadas não devem contrariar esses interesses: a massa será reconhecida e valorizada como consumidora, mas não como cidadã. As grandes empresas de comunicação, representantes dos interesses empresariais, substituem a população no exercício efetivo da cidadania, como a história do Brasil evidencia.
Mas, não existem antídotos para essa situação, nada contraria o poder das empresas de comunicação? Aparentemente sim, como os programas jornalísticos, os debates políticos e o horário eleitoral gratuito. O jornalismo deveria divulgar assuntos de interesse
público, desempenhando um papel essencial para a existência da democracia representativa, sendo a voz dos cidadãos, que bem informados escolheriam os políticos capazes de enfrentar os principais problemas sociais. No entanto, não é isso o que acontece. Problemas sociais, como a especulação imobiliária, cuja divulgação pode contrariar importantes anunciantes, não serão divulgados, ou serão divulgados de forma rápida, não merecendo nenhum destaque, nem despertando o interesse dos cidadãos. Fazendo parte de uma programação voltada para atingir o máximo de audiência possível, o jornalismo segue a lógica comercial, ou seja, a lógica da sociedade do espetáculo.
Na sociedade do espetáculo, a comunicação segue a linguagem publicitária, voltada para a sedução do público com mensagens atraentes. O jornalismo preocupa-se cada vez mais com a aparência: o cenário, a imagem dos jornalistas, o tom de voz dos apresentadores etc. As notícias se sucedem rapidamente, prendendo a atenção do público, numa comunicação superficial e marcada por um tom emocional e imediatista. Se a principal característica da democracia na Grécia Clássica era o debate racional
sobre os problemas dos cidadãos, que livremente expressavam os seus pontos de vista, de acordo com os seus interesses, isso não acontece no noticiário do Rádio e TV.
A mesma dependência da sociedade do espetáculo pode ser constatada no horário político eleitoral ou nos debates políticos. Partidos e candidatos procuram seduzir os eleitores e não conquistá-los racionalmente. A política está reduzida a um espetáculo marcado pela superficialidade da linguagem publicitária. Os políticos nos representam, do mesmo modo que os
produtos. Os que dominam a linguagem publicitária, os “marqueteiros”, são contratados a peso de ouro e dirigem as campanhas políticas, esvaziando a dimensão ideológica dos partidos políticos, que se transformam em organizações voltadas para os
interesses econômicos dos seus membros e não mais para representarem os interesses públicos.
Mas não existe mesmo nenhuma esperança para uma política e uma comunicação de fato democráticas?
A internet, devido ao seu caráter descentralizado, possibilitando uma comunicação de todos com todos, é uma esperança, desde que aconteça a disseminação de informações de interesse público e uma retomada de debates racionais voltados para a solução dos principais problemas sociais. Por enquanto, a realidade não é essa, mas a mudança só depende de nós, cidadãos.
Cláudio Novaes Pinto Coelho é doutor em Sociologia pela USP e professor de pós-graduação da Faculdade Cásper Líbero.