Postado em 02/09/2010
Coincidências positivas
por Elisa Maria Americano Saintive
A 29ª Bienal de São Paulo decidiu que, ao contrário do “vazio” da edição passada, a deste ano (2010) será, de certo modo, o momento do intenso. Assim, ela não se limitará a um prédio – o prédio da Bienal. Ela vai ocupar também outros espaços diferentes e diferenciados da cidade de São Paulo, propiciando, com essa difusão, o acesso de um público mais diversificado. E o Sesc Pompeia, como um desses espaços, acolhe a exposição do grande artista alemão Joseph Beuys.
E aí podemos ver uma série de coincidências positivas. O prédio do Sesc Pompeia é uma obra resultante da visão criativa e provocativa da renomada arquiteta Lina Bo Bardi.
Foi ela que, a convite do Sesc, transformou a antiga fábrica de tambores, no bairro da Pompeia, em um marco na evolução da história da arquitetura contemporânea do Brasil, ao reedificar os diversos galpões da fábrica, transformando-os em espaços de lazer em seu sentido mais amplo.
E um aspecto bem original do Sesc Pompeia é a reprodução de uma verdadeira rua, símbolo da via pública, para seu interior. Assim, o público, ao passar pelo portão da entrada, encontra-se de novo em uma rua. E pode, então, escolher entre vários espaços: alguns com exposições, área de leitura, consultório odontológico, restaurante com mesas coletivas, quadras de esportes, piscina etc., com as mais diversas atividades, e não necessariamente artísticas.
Ora, um desses espaços apresenta uma exposição de valor excepcional: a de Joseph Beuys, artista de múltiplas facetas, o mais importante do século 20, autor de performances, vídeos, pôsteres, esculturas etc. Dada a pluralidade de sua obra, o público poderá, fugindo da passividade comum das exposições tradicionais, interagir com os “produtos artísticos” de Beuys, cuja vida dedicada à “arte ampliada” (conceito do próprio Beuys) é plena de momentos de beleza e de milagres, como a sua sobrevivência, graças a uma tribo nômade de tártaros, na Crimeia, após um acidente aéreo, do qual foi vítima.
De um modo bem pessoal, as experiências que eu tenho vivido à frente do Sesc Pompeia, unidade que passei a dirigir desde o início deste ano, constituem-se de um variado repertório trazido através da observação do dia a dia da vida deste centro, em que ora o espectador se confronta com uma Índia moderna, na visão dos artistas contemporâneos que aqui estiveram na exposição Urban Manners 2, abordando em grandes instalações artísticas, em meio à área de convivência, entre espaços de leitura, de jogos, de conversa e de brincadeira, temas como imigração, meio ambiente, consumismo e poluição, revelando as contradições da Índia globalizada, país ainda conhecido pela sua extrema pobreza e tradições religiosas. ?Ou mesmo questões ligadas a direitos humanos na exposição Shoá – Reflexões por um Mundo Mais Tolerante, visando despertar no público o combate à intolerância e à discriminação entre os povos, montagem esta feita no galpão de exposições. Ou, com o mesmo vigor, os alegres bailes da terceira idade com público assíduo, sempre às quartas-feiras, indicando-nos um caminho, fazendo-nos parte fundamental no processo de formação e organização social, onde o ser humano é livre para procurar as suas próprias respostas e justificar a sua existência. São essas as relações dinâmicas que cada um de nós, funcionários do Sesc, estamos vivenciando, seja através de nossas próprias impressões, seja através da observação do público frequentador das atividades que realizamos.
Em síntese: vivenciando a exposição de Beuys, o público estará justificando a sua frase: “Todo homem é um artista”.
Elisa Maria Americano Saintive, formada em Artes Plásticas, é gerente do Sesc Pompeia