Postado em 03/03/2011
Poema claro
	Metido num sleeping bag
	sobre a grade do respiro do metrô
	manhã de sol, motores, passos
	o alarme do carro dispara
	
	antenas no topo dos prédios
	o semáforo fecha, abre
	copos furados de plástico
	o cheiro da canela, suave,
	
	destroçada pela chuva de verão
	deitado, em si,
	sem qualquer assédio
	um edifício verde de vidros opacos
	se ergue
	inerte, sem elo,
	uma flor tardia do cedro cai na grade
	sol alto, puro ego.
	
	Sem título
	
	Enforcaram um gravatá
	
	Injetaram inseticida numa sanã-cinza
	
	Trucidaram onças-pintadas
	
	Principalmente suas fábulas
	
	Queimaram verbascos
	
	Pelo temor da proliferação de suas palavras
	
	Extirparam as cordas vocais de um tatac
	
	Sugaram todos os sangues-de-dragão
	
	Verniz para as mesas de business
	
	Mataram ingás por vingança
	
	Explodiram uma borboleta em pleno voo
	
	Vararam de balas
	
	Fuzis disfarçados de átropas
	
	Um pseudoescorpião, um rabo-de-palha
	
	E um chupa-dente-de-máscara
	
	Roubaram o copirraite
	
	De uma formiga
	
	Patentearam seu spixii
	
	Para games do second life
	
	Metralhe agora
	
	O conteúdo off-line
	 
	
	Este poema
	
	Este poema
	não chama a atenção
	é igual a milhares –
	sequer por um momento
	 
	ilustra, apático, o passado
	caça moscas
	paga juros
	não tem saco aéreo
	
	víboras, ratos,
	ladrões desprezam seu túmulo
	uivam lobos de pelúcia
	não tem futuro
	
	é abelha cega com sua parelha de óculos
	sua língua não é uma esponja
	suas antenas farejam Drummond
	não enxerga no escuro
	
	não cria inimigos
	não morre depois do ataque
	não tem farpas
	tolera o mundo
	
	Sem título (2)
	
	O urso polar não é personagem de cartum
	
	para fugir do frio de Nova York, o maçarico migra para as represas Guarapiranga e Billings
	
	o falcão peregrino se abriga no topo dos edifícios
	
	pilharam a múmia da juviara
	
	a juraviara passa a viver no Burle Marx
	 
	a águia pescadora vai para as represas
	 
	o verde
	batuiruçu despenca de Toronto, de Detroit, para o Tietê até março
	
	gaivotas degustam lixo na Avenida Paulista
	
	Advanced Installations Inc.
	
	Músculos à vista
	touro de bronze
	os irmãos negros passam
	turistas
	 
	tiram fotos, os chifres
	o mais velho segura a mão
	do mais novo, autista
	um cartão-postal do World Trade Center
	na gôndola de uma livraria
	guindaste, o órgão
	Trinity Church
	o adorno bifronte
	
	cânticos, flashes
	faça cheques para “Disaster releif”
	jardins compactos, lírios-verdes
	natureza portátil
	 
	o memorial
	de uma das batalhas do Atlântico
	gramado opaco
	deitado no banco
	
	rosto encoberto pelo gorro
	zíper fechado
	cabeça numa pilha
	de jornais – contraído
	
	o vento gelado do rio
	folhas de plátano batem na cara
	a estátua, a ilha
	o motor do barco
	
	vozes, avião, passos
	Ostrak, Ostra, Ostrak, Ostra
	as letras se movem no casaco
	enquanto respira