Postado em 28/07/2009
Ária Popular
“Opera é um gênero autônomo. Ela não é música com teatro nem teatro que tem música. A ópera segue certos cânones que fazem dela uma arte dramática única” |
Ópera é ópera
É importante entender que a ópera é um gênero autônomo. Ela não é música com teatro nem teatro que tem música. A ópera segue certos cânones que fazem dela uma arte dramática única. Dentro disso, a dramaturgia da ópera, ou seja, como se conta a história da ópera, usando a música como uma linguagem – a música não é simplesmente um meio para se botar o texto. Por exemplo, se você pegar um libreto – o texto da ópera – e tentar montá-lo seco, como um teatro de prosa, o sentido se perde totalmente.
O texto está intimamente ligado à condução da música. A música da ópera não está se importando em ser bonita ou agradável, ela tem uma função dramática, ela conduz a ação dos personagens. Então ela, em si, junto com a palavra, a mistura das duas coisas, é o que a gente poderia definir como ópera – e digo poderia, porque a ópera é um gênero tão universal e atemporal que chega a se tornar indefinível, é preciso muito cuidado e respeito para fazê-la. Mas em síntese seria isso: a ópera é a música misturada com a palavra, mas uma sem a outra não faz sentido. Logo, uma é feita para a outra. O texto – o libreto, como se fala na ópera – é composto dentro das propostas musicais, do caminho, da ambiência musical. E só ali a palavra ganha a dimensão do que ela deve ser no espetáculo.
Erudito popular
É perigoso a gente tentar simplificar a palavra “popular”. Popular tem vários sentidos. A ópera é um gênero popular, só que dentro de uma linguagem erudita. A ópera nunca vai concorrer com a música, por exemplo, da Ivete Sangalo (risos). E ela nem pretende isso. A Ivete Sangalo é uma cantora ?popular na essência. Na linguagem, na forma da música, tudo diretamente popular. A ópera também é popular, porém, ela tem uma complexidade e usa uma linguagem que estão ligadas aos cânones universais, que são os da música clássica.
Um exemplo que consegue traduzir isso que eu estou dizendo é o Heitor Villa-Lobos. Algumas melodias dele soam populares, elas têm, na raiz da composição, o elemento popular, o povo reconhece a música do Villa-Lobos. Só que a música dele sugere e incita o ouvinte a ter algum tipo de reflexão menos óbvia. Não que o popular seja óbvio, mas a música do Villa-Lobos – que eu estou aqui usando como exemplo – abre outros tipos de reflexão.
A música clássica tende a levar o público ouvinte a refletir sobre muitas coisas: estética, ritmos, histórias. A linguagem dela, por conta de alguma complexidade maior do que tem a conhecida música popular, não pretende tornar-se algo de que todo mundo goste. Existem certas músicas e certos músicos populares que entram direto, fácil, no gosto do público. Têm uma linguagem mais direta, menos reflexiva e mais objetiva. A música clássica tem uma tendência de não necessariamente buscar essa grande massa, mas sim de levar as pessoas que estão ali ouvindo à reflexões que não são necessariamente sobre a música, mas sobre outras coisas da vida. Há artes que são menos complexas e mais diretas. Elas não estão tão preocupadas em carregar de sentidos quanto outras.
Quando você usa uma linguagem mais universal, você tenta se comunicar de uma outra forma, num espectro
mais atemporal. Quando você lida com coisas mais ligadas aos regionalismos, às formas mais populares, você está lidando com a coisa direta, com o público do seu tempo, com um público que está naquele momento, há certas coisas que reúnem parâmetros que as pessoas se reconhecem neles. A música que toca agora na rádio está refletindo mais diretamente a contemporaneidade. Enquanto a música clássica tende a se comunicar com um tempo menos do momento e com outras culturas, outras histórias. Mas veja bem, eu digo tende... Na verdade, para quem gosta de música, o que importa é que ela seja boa, seja ela de um gênero mais popular ou clássico.