Postado em 08/01/2010
Memória do movimento
A curadora do acervo de dança da Biblioteca Pública de Nova York fala da importância da preservação da literatura e do material audiovisual na área
A Jerome Robbins Dance Division (divisão de dança Jerome Robbins, em tradução literal) é ligada à Biblioteca Pública de Nova York de Artes Performáticas e um dos mais importantes e abrangentes centros de referência do mundo na área de dança. Criada em 1965, com a doação de seis latas de filmes pelo coreógrafo Jerome Robbins, a divisão conta hoje com um acervo de 22 mil títulos, entre vídeos, filmes, documentos e fotografias. “Nós participamos e lideramos há muito tempo os esforços para documentar, preservar e tornar acessíveis materiais relacionados à dança”, explica a curadora da coleção, Jan Schmidt, que esteve no Brasil em novembro para participar da edição 2009 da Bienal Sesc de Dança. “A dança é uma forma de arte efêmera, passada do professor para o aluno, do coreógrafo para o bailarino, do mais velho para o mais novo, de corpo para corpo”, disse. “Com o desenvolvimento de recursos como filmes e vídeo, a dança passou, de repente, a ter meios de ser registrada em sua rica história.”
Jan participou do painel Conexões, realizado no dia 4 de novembro, na bienal do Sesc Santos, no qual falou da atuação da Jerome Robbins Dance Division e da preocupação constante em manter atualizado seu acervo. A seguir, trechos.
Registro
Eu gostaria de começar chamando a atenção para a necessidade de preservação e catalogação [de documentos e material audiovisual de dança], o que está no centro de nosso compromisso com a comunidade de dança. Como as apresentações de dança registradas em programas de televisão, filmes etc eram dispersas, surgiu a necessidade de formar um acervo de dança em vídeo, como arquivo. A dança é uma forma de arte efêmera, passada do professor para o aluno, do coreógrafo para o bailarino, do mais velho para o mais novo, de corpo para corpo. Ao longo dos séculos, várias formas de anotação se desenvolveram nas artes, mas a dança não tem usado com frequência a forma escrita tal como a música usa a nota, o drama usa as marcações etc. Com o desenvolvimento de recursos como filmes e o vídeo, a dança passou, de repente, a ter meios de ser registrada em sua rica história.
Início
A Jerome Robbins Dance Division, desenvolvida a partir do Lincoln Research Center, em 1965, teve início com a doação de seis latas de filmes pelo coreógrafo Jerome Robbins, além de uma porcentagem de seus royalties como autor, e hoje conta com 22 mil títulos de filmes e vídeos. Ao longo desses 44 anos, temos recebido coleções de arte de muitas fontes e estabelecido relações com doadores, o que nos permitiu crescer de modo significativo. A maior parte dos grandes doadores de coleções percebe a necessidade de preservar e disponibilizar os materiais para o grande público, não só para os pesquisadores. E também as grandes empresas e companhias percebem que seus originais precisam ser restaurados. Fazemos cópias depois de obter licenças e recursos para arcar com os custos. Esse é um exemplo de como doadores podem se tornar usuários de nossos serviços.
Acervo
Participamos e lideramos há muito tempo os esforços para documentar, preservar, e tornar acessíveis materiais relacionados à dança. O Performance Arts Library do Lincoln Center é uma das quatro divisões da New York Public Library, que também inclui outras 87 bibliotecas. O material do centro de pesquisa está disponível para consulta somente no local da biblioteca. O centro é aberto a qualquer pessoa e disponibiliza gratuitamente material impresso como folhetos, livros, fotografias, programas, além de gravações em videoteipe de apresentações de dança. O centro também tem um programa para criar registros de apresentações de dança em vários estilos: balé, dança moderna, jazz, dança folclórica e danças étnicas de todo o mundo, assim como assuntos relacionados, como artes de movimento, ginástica etc. Também inclui entrevistas, apresentações, palestras, documentários, registros de danças, como a tradicional russa ou as brasileiras, ampliando as fronteiras da dança, incluindo de recriações de danças barrocas francesas do século 17 a danças originais do Tenessee e terapia de dança.
A coleção de documentos da Jerome Robbins Dance Division reflete mais de um século de desenvolvimento da dança, reunindo materiais únicos como de Isadora Duncan [1877-1927, dançarina norte-americana], balé de Montecarlo e American Ballet Theater, incluindo os nomes fundamentais da história da dança e registros em cartas, manuscritos etc, além de programas de apresentações históricas de balé de grandes nomes da dança mundial.
Frequentemente, indivíduos e companhias de dança nos doam pequenas coleções. Textos e materiais de coleções grandes foram digitalizados ao longo da criação do banco de dados. Também podem ser encontradas na internet referências sobre esse material, como resumos, críticas, anotações, correspondência individual etc. Temos profissionais que trabalham na preservação de todo esse material. Como a coleção é muito grande, ao acessar o site http://www.nypl.org/research/lpa/dan/dan.html é preciso escolher um dos links para restringir a pesquisa e localizar o número pelo qual o material pode ser visualizado. Isso demonstra como é variada a gama de materiais que o Jerome Robbins Dance Division abrange, sendo possível fazer a pesquisa por tema, item, volume; os materiais em papel podem ser retirados para consulta, mas os materiais filmados só podem ser vistos remotamente.
Seleção
O papel da comunidade de dança na atualização dos arquivos tem mudado nos últimos tempos. Nos últimos 45 anos, temos nos voltado ativamente às companhias de dança e aos coreógrafos, pedindo material. E, quanto mais pedimos, mais pessoas têm nos fornecido, formando uma consciência de que há um universo enorme de dança, no mundo todo, muito além dos arquivos da New York Public Library ou de qualquer outra instituição. Qualquer instituição de dança, 30 anos atrás, poderia ter apenas alguns poucos filmes, agora cada companhia, por menor que seja, possui centenas de vídeos, e grandes companhias possuem milhares. Atualmente, não se pode mais obter tudo o que todo mundo possui, por isso estamos no processo de tentar identificar o caminho para continuarmos a ser abrangentes, não discriminatórios e, ao mesmo tempo, ainda responder à multiplicidade do mundo, sem sermos esmagados pela enorme quantidade de informações disponíveis. Então, cinco anos atrás, eu diria que incluíamos tudo, hoje confesso que temos de pensar sobre isso. Mas se uma companhia tem dois vídeos, eu digo: “Ok”. Se ela possui 2 mil, eu digo: “Temos de selecionar.”
“A coleção de documentos da Jerome Robbins Dance Division reflete mais de um século de desenvolvimento da dança, reunindo materiais únicos como de Isadora Duncan [1877-1927, dançarina norte-americana], balé de Montecarlo e American Ballet Theater (...)”